UMA EXPERIÊNCIA E TANTO
Por Antônio Francisco Sousa Em: 01/06/2015, às 21H52
Era o que ele dizia a amigos em um ambiente, no qual, por acaso, me encontrava também: que havia sido assaltado, dentro de seu estabelecimento comercial, juntamente com a esposa e o netinho de seis anos, que estava com eles.
A mulher, ou melhor, a “vagabunda” - segundo o bandido, de mais ou menos vinte anos, e que chegara sozinho ao local - fora escolhida para ficar sob a mira de seu revólver, enquanto a ele, o marido, competiria ir pegar as outras coisas de valor – cheques, celular, alguma joia, escambau –, pois a féria, até então, apurada, o larápio já a punha na mochila.
Permitiu-lhe sair do seu campo de visão, tinha certeza, porque sabia que, como não era bandido, mas um honesto trabalhador, não dispunha de arma, e, obviamente, não teria coragem de pôr a vida dos seus em perigo.
De tanto chamar a avó de vagabunda, o garoto não resistiu e disse ao bandido para não falar daquele jeito com ela. Virando-se para o menino, apontou-lhe a arma e lhe perguntou se queria morrer. Bateu, sem muita força, na cabeça da criança com o revólver, obrigando o avô a pedir ao neto que ficasse quieto.
O assaltante estava sem disfarce. Depois de fazer o rapa, de dar um tapa no rosto do menino, que chegou a choramingar, e de voltar a chamar o comerciante e a esposa de vagabundos, otários, montou na motocicleta e se mandou, não sem antes lhes dizer para ficarem calados até que ele desaparecesse; puxou a porta, por fora, para fechá-la e sumiu.
Contava que, a princípio, ficara sem ação, abobalhado. Além de roubados, serem chamados de nomes tão humilhantes, ninguém merece. Mais calmo, por meio do telefone fixo, chamaria o filho, que estava trabalhando, e lhe adiantando um resumo do ocorrido, pedir-lhe-ia para vir pegá-los, a fim de registrarem um boletim de ocorrência.
Relatou a história ao filho que, mais possesso ficou, ao saber que seu garoto, além de presenciar a humilhação feita aos avós, ainda havia levado uns petelecos do marginal. O rapaz tinha um plano, do qual lhe falaria a caminho da delegacia: pediria ao delegado que, tão logo apanhasse o bandido, avisasse-o, pois ele queria ter uma conversa com a figura.
O delegado aceitara sua sugestão, até porque desconfiava de quem seria o meliante. Poucos dias do acontecido, seu filho receberia um telefonema dele dizendo-lhe que o bandido estava em uma das celas de sua delegacia; se ainda quisesse ter aquela conversa, que fosse lá. Como queria, minutos depois estava na antessala do recinto policial.
Ao chegar, pediria ao policial para ficar a sós com o bandido, com o que a autoridade não concordaria: acompanharia a entrevista bem de perto, a fim de evitar qualquer tipo de violência ou agressão física. Sem problema.
A conversa, segundo lhe contara o filho, teria rolado nestes termos: perguntado ao molecote magro e baixinho se sabia quem era ele, o bandido falou que não e nem estava interessado em saber. Pegando-o por um dos braços, com bastante força, a ponto de fazê-lo sentir dor, levantara-o do chão e lhe dissera que era filho daquele cidadão a quem, dias antes, juntamente com a esposa, sua mãe e um garotinho, seu filho, ele havia, não somente assaltado, mas humilhado com palavrões, e ainda batido na criança. E daí? Retrucaria o bandidinho. Nesse instante, comentava o homem, o filho teria falado ao bandido que não lhe cobria de socos e pontapés porque prometera ao delegado agir com calma. E continuaria: covardes como vocês, só têm coragem quando estão com uma arma na mão e a vítima desarmada. Segurando-o pelos dois braços e o sacudindo, fortemente, fê-lo encará-lo: estou errado? Ele diria, então, que não fizera aquilo por querer, mas porque era viciado, dependente, doente; não sabia de nada. Mentira, moleque, na hora do assalto você parecia bem, muito corajoso e valente. E acrescentaria, de acordo, ainda, com o narrador: para terminar o papo, apenas gostaria de lhe dar um conselho: vou mostrar sua fotografia de corpo inteiro a todos do bairro onde mora meu pai; se tornar a aparecer por lá, a doença vai se transformar em terminal. Sabe o que é isso, não é? Quem tem uma delas não escapa. Está avisado, sujeito: mexa, de novo, com minha gente e vou cobrar pela humilhação que você fez meus velhos e meu filho passarem. Não duvide disso, viu? Despedira-se dos policiais, agradecendo-lhes e saíra, bufando de raiva.
Se foi fato toda a peroração daquele cidadão, ele e sua família teriam vivido uma experiência e tanto.
Antônio Francisco Sousa – Auditor-Fiscal (afcsousa01@hotmailcom