UM PAÍS HÍBRIDO E SURREAL
Por Cunha e Silva Filho Em: 04/07/2022, às 14H28
UM PAÍS HÍBRIDO E SURREAL
CUNHA E SILVA FILHO
No Brasil tudo coexiste nos vários ângulos da vida. Contudo, o que confirma a minha tese é que se, em nosso país, como em outros na América Latina e nas outras Américas, inclusive nos EUA há riquezas, milionários, multimilionários, hedonismo nos gastos pessoais e sociais, glamurosos, festas e celebrações, em outras partes de um mesmo país há extrema miséria, fome mesmo, caos social e. portanto , injustiça social. No entanto, os membros dos governos respectivos continuam na boa vida de sempre, com as suas regalias e privilégios.
É dessa dualidade de vida que subsiste o caos e ao mesmo tempo a suposta normalidade, como vemos no nosso país, um misto de desordem de um caos silencioso e ao mesmo tempo subterrâneo, o que me faz deduzir que a calmaria aparente é apenas a ponta de um iceberg.
A estrutura do Estado Brasileiro funciona e a um só tempo comete as mais escabrosas formas de perversidade e isso tanto vale para a rex publica quanto para o setor privado, também cada vez mais confuso e deficiente. Vive-se aqui a dualidade céu e inferno, segundo já afirmei alhures. Ou seja, o país tem um vocação barroca no pior sentido do termo, a de permanecer entre a pureza e a vilania, esta vinda sobretudo do próprio Leviatã.
Os poderes, em número de três, por vezes me dão a impressão de um faz de conta, pois comete erros e ao mesmo tempo acertos, protege e fere mortalmente, é justo e injusto, vira um dicotomia esquizofrênica nos três poderes.
Por outro lado, o Legislativo federal, estadual ou municipal, com uma estrutura similar, também é, sem sombra de dúvida, um vilão que se submete às piores situações de poder, nem mesmo faltando uma espécie de conluio com o que é de mais abjeto de representação popular, atrelando-se às torpezas de membros que mais parecem chefes de máfias a serviço do crime. Grassa, no geral, um abastardamento de mau-caratismo de servir, não à causa pública, mas aos interesses pessoais de parlamentes em tempos de preparação de campanha presidencial.
O pior exemplo mais recente foi o pacotão aprovado pelo Senado e chancelado por todos os partidos (para que tantos partidos inúteis nesse país de gastanças pantagruélicas). Só um senador, o ilustre político José Serra, teve a dignidade ímpar de não concordar com essa camarilha de politiqueiros de fancaria, de índole meramente eleitoreira vindo do próprio governo federal que abriu as comportas do Erário Público a fim de bancar despesas bilionárias supostamente de cunho popular quando o que está em jogo sujo é a decisão e os objetivos escusos ou declarados dos que detêm o poder central. Nunca senti tanto engulho de políticos quando sinto atualmente.
O curioso é que, em âmbito nacional, tudo hoje se culpa de errado e malfeitos à pandemia e à guerra covarde praticada pelos russos contra a Ucrânia. Mentira grossa para se aproveitarem os comerciantes e capitalistas brasileiros e estrangeiros com o aval do Mister Guedes e sua preferência insana de conhecido profeteer, já que é pessoa ligada a bancos e a investimentos, onde o dólar é moeda forte e, por isso, qualquer valorização dessa moeda reverte ao seu benefício pessoal e os seus assets no exterior enquanto o povo brasileiro morre de fome, de raiva de políticos e de um país à deriva.
Somos o país da antítese, dos contrastes e das injustiças e ao mesmo tempo somos um país de uma minoria multimilionárias que não está nem aí para a pobreza gigantesca e as grandes mazelas nacionais. O individualismo campeia solto e fagueiro, enquanto o amor ao próximo se definha a olhos vistos. Pobvre país!
Estou numa fase de pessimismo igual ao que acometera um grande escritor e erudito historiador, Alexandre Herculano (1810-1877) que, por se sentir desiludido com os homens e a coisa pública, se afastou definitivamente da vida social, cultural e das instituições governamentais, recolhendo-se a uma vida solitária e distanciada da metrópole lusa indo morar até seus últimos dias, na sua quinta de Vale de Lobos, longe das misérias e vilanias de seu tempo e Portugal. Deu um ponto final às suas talentosas e fecundas atividades literárias.