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Um coral de liras


Rogel Samuel


Começa pela música de Mahler, a quinta sinfonia, que nos faz sonhar, que nos mergulha nas profundezas de uma sonoridade não sei por que azul, para mim azul, e Mahler nos conduz aos melhores poemas de V. Solteiro, aos seus encantos sonoros e imagísticos, como nessa "Escrevedeira...", onde um pássaro toca o seu "lírico canto, sulca a sua rejubilante melopéia", doce como o néctar das maduras amoras, toca com seu bico afinado e agudo, pontiagudo como um flautim "revolteando o vazio" do ar, as vibrações do ar, cordas da sua fuga, da suas partituras, o poema de V. Solteiro ensombra as grades que aprisionam os homens e os faz livres, como livre é o seu pássaro, como livre são os acordes daquela sinfonia de Mahler... sinfonia que lembra Solti, que lembra "Morte em Veneza"... onde morremos de felicidade...





Tecelã das velas do lírico
canto
a escrevedeira
sulca
na sua rejubilante melopeia
um coral de liras


O seu fino e pontiagudo bico
flautim revolteando o vazio
vibra no ar
as cordas da fuga


Doce como o néctar
das maduras amoras
a frutuosa harpa que tanje
esculpe no xisto
um umbral
de deslumbramento


Prelúdio de novas partituras
o brilho do seu trinado
ensombra as grades
que agrilhoam
o peito dos homens


Poema de V. Solteiro

Foto de M. Furtado

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