Títeres imaginários da vigília laboriosa de um cultor do idioma de Camões
Por Flávio Bittencourt Em: 06/11/2013, às 14H28
[Flávio Bittencourt]
Títeres imaginários da vigília laboriosa de um cultor do idioma de Camões
Rogel Samuel, autor brasileiro do pós-modernismo mundial, reconta estórias do cotidiano.
BONIFRATES FOCALIZADOS, HOMEM E PINÓQUIOS FORA DE FÓCO (em planos "secundários", na fotografia genial):
Marioneta, "fantoche" (não é manipulado 'do alto', mas 'de baixo', títere (marionete é [NÃO PEDANTE], galicismo, bonifrate (CALDAS AULETE, ED. ONLINE)
primeiramao.pt
Formação de construção e manipulação de bonifrates no Museu da Maia
600 × 399 - 91k
bonifrate SE ENCONTRA, TAMBÉM, EM
http://aguaderramada1.blogspot.com.br/2011/06/fantoches.html
marioneta [MAIS USADO EM PORTUGAL, PAÍSES LUSÓFONOS DA ÁFRICA etc.] (já no link da web):
http://marionetasportugal.blogspot.com.br/2011_10_01_archive.html etc.)
JUNHO DE 2010:
6 set. 2013 ... Leônidas da Silva, que se consagrou a jogada de bicicleta no futebol brasileiro,
é o homenageado pelo Doodle do Google desta sexta-feira ...
"ESCREVER
ESCREVER
Rogel Samuel
Para espancar canseira de viagem, tenho lido, com vagar, com sonhar, um dicionário de sinônimos. Não obra de alta filologia, orgulho do saber, Leite de Vasconcelos, Said Ali, Serafim da Silva Neto, Nunes. Mas obra popular, modesta e barata, o "Grande dicionário" (que é pequeno) de Osmar Barbosa, da Ediouro.
Não, cara leitora, não foi de lá que tirei aquele «espancar», no sentido de «afastar». Não. Ele nem possui a palavra «espancar», talvez porque o prof. Osmar Barbosa era homem bom e calmo, educado, cordial e manso, quando naquela época o conheci.
Tirei aquele "espancar" das marionetes, dos penduricalhos das minhas fantasias filológicas, como gosto, e com gosto, porque escrever é gostar das palavras, do palavrear, do frasear, do fazer frases, ler os dicionários, coisa vã de quem não tem mais o que fazer.
Mas era o prof. Osmar Barbosa homem de bom papo, já com certa idade, quando o conheci, na década de 60.
Trabalhamos juntos, naquele "Curso Daltro", de boa memória, que ficava nos altos de um edifício na Av. Presidente Vargas, lá quase esquina de Rio Branco, à esquerda de quem sobe em direção à Central.
Eram várias salas, aquele "Daltro", nome do dono, rapaz magro e cavalheiro, que estaria milionário se hoje prosperasse o "curso", como cresceram o Hélio (que era da mesma época), a Gama (muito anterior), e outros que viraram enormes Universidades.
O "Daltro" mantinha curso "por correspondência". Mas seu forte era a preparação para a carreira militar, para o curso de sargento especialista.
Lá lecionava o Navega.
Gordo, voz grave, sorriso amplo. Gostava de brincadeiras. Notáveis. Perigosas.
Um dia, e em plena ditadura, como não conseguia estacionar, aproxima-se dos soldados do Ministério da Guerra e grita, grave e autoritário: "Ó praça!", grita. O rapaz perfilou-se, bateu continência: "Qual é a minha vaga?" Os soldadinhos, pressurosos, nervosos, imediatamente descobriram a vaga daquele que deveria ser uma autoridade da mais alta patente.
O Navega ria-se, aquela gargalhada.
Outra vez, na porta do restaurante, uma fila: "Você não vai deixar o Senador Sousa esperando na porta, não é?", perguntou para o gerente. "Absolutamente", respondeu o homem.
Navega era grande contador de estórias. O filho lhe pedia o carro emprestado para ir ao Fundão: Ele descobriu, depois, que naqueles dias não havia aula. O garoto ia e voltava, no mesmo dia, com a namorada, para sua casa de Cabo Frio.
Não sei onde andam aqueles amigos.
Osmar Barbosa, capixaba de Vitória, nasceu em 6 de outubro de 1915, estaria muito idoso, hoje. Professor de várias línguas, tradutor, romancista e poeta, autor de muitos livros, diversas traduções.
No seu dicionário, escrever, escravo e escrita são vizinhos.
Eu diria: sinônimos. Afinal, escrever para quê? Por quê?"
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Outros livros desse Autor, de acordo com a Wikipédia:
"Poesia
- 120 Poemas, Edição de Autor, Rio de Janeiro, 1991
Prosa
- O amante das amazonas (romance). Editora Itatiaia, Belo Horizonte, 2005. 2ª ed.
- Teatro Amazonas (romance). Edua - Editora da Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2012.
Ensaio
- Crítica da Escrita. Edição do Autor, Rio de Janeiro, 1979.
- Literatura Básica. Editora Vozes, Petrólis, 1985. 3 vol.
- O que é Teolit?. Editora Marco Zero, São Paulo, 1986.
- Manual de Teoria Literária. 14ª. edição, 2001.
- Novo manual de teoria literária. Editora Vozes, 6ª. Edição, 2011.
- Fios de luz, aromas vivo - Leitura de “Retrato de mãe” de Jorge Tufic. Expressão Gráfica Editora, Fortaleza, 2012."
(http://pt.wikipedia.org/wiki/Rogel_Samuel)
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"(...)
15. HOTEL BRASIL, PARIS
O professor Carlos Augusto estava em Paris para observar a metodologia de ensino nas escolas de S. Gil, de Bruxelas. Na época era Secretário da Educação do Amazonas.
Na manhã do dia seguinte aproveitou para dar uma caminhada no Jardim de Luxemburgo, ali perto. Depois foi pelo Bulevar Saint-Michel até a rua da Sorbonne, voltou pela Saint-Jacques, dobrou a direita até a rue le Golf, onde ficava seu hotel.
Depois da caminhada, sentou-se na sala de recepções, lendo os jornais.
Foi quando viu entrar pela porta o seu amigo Lourival Muniz.
Muniz tinha sido seu colega de escola. Ambos foram alunos do maestro Adelelmo.
Lourival Muniz estava acompanhado de Lourenço Mello, que desde jovem já falava muito bem francês, e era um pequeno gênio, um pequeno caboclo amazonense genial. (ESSE GRIFO NÃO ESTÁ NO ORIGINAL)
Mello nasceu no rio Purus, no famoso Ayapuá, em 1854, trabalhou no comércio, na catequese dos índios “muras”, foi Diretor de Índios e Delegado de Polícia.
Muniz tornou-se violinista, como seu mestre Adelelmo. Estava na Europa aperfeiçoando sua técnica com vários professores. Lourival Muniz foi talvez o melhor aluno do maestro, capaz de escrever uma transposição de tom de improviso.
Logo se reuniram os três na mesma mesa.
- Felix Weingartner vai reger a orquestra de Viena amanhã, disse Muniz. Eu consigo ingressos.
- Excelente! exclamou Augusto.
- Como vai nosso Teatro Amazonas? Perguntou Lourenço Mello.
- Este ano tivemos “La Boêmia” em janeiro. Em janeiro, acrescentou Bittencourt, teremos a “Cavalaria Rusticana”, “I Pagliacci” e outras.
- Não diga! Fez Muniz, batendo as mãos com expressão animada.
- Sim, continuou Augusto. Em “I Pagliacci” o cantor fez sucesso com o “Vesti la giubba e la faccia infarina”.
- Sim? E o maestro?
- Foi o mestre Carvalho Franco. Estava com a Companhia Tomba, com oitenta figuras, dirigida por Gennaro Pesce.
E tirou um jornal da pasta, que abriu sobre a mesa:
- Aqui está no jornal italiano “Almanacco”.
- Mas não diga! Exclamou o aluno de Adelelmo. Estamos no circuito internacional!
- Sim, sim, disse Carlos Augusto. E teremos “Salvador Rosa” de Carlos Gomes, duas de Puccini...
- Bohême e Manon Lescaut...
- Sim. E mais Verdi e Rossini.
- O maestro Franco está-se desgastando na corrida empresarial. Ele é mau negociante, atrapalhado, distraído. Por isso ganhou fama de mau pagador.
- O quê?
- Sim, tem muitos inimigos...
- Invejosos...
- E como é um artista, está todo atrapalhado. Os músicos da orquestra estão debandando... Por isso, para saldar os pagamentos, fez uma récita dedicada a Sebastiana Nery, esposa do governador. A alta sociedade compareceu, pagando muito. As entradas foram muito caras, mas todas vendidas.
- Mas ocorreu um desastre... e que pode prejudicar a vida cultural no Amazonas, disse Augusto.
- Que foi? Perguntaram os outros dois ao mesmo tempo.
- A atriz Giannina Barone faleceu, vítima de malária, a bordo do vapor “Rio-mar”.
- Céus!
- Sim foi, disse Augusto.
- E houve outra morte, não foi?
- Sim, amigos. A cantora Anita Occhiolini, da Companhia Tomba, morreu em Belém, dizem que também vítima da malária.
- Isso?
- A “Folha do norte”, do dia 12, disse que ela morreu de febre amarela na Casa de Saúde São Francisco, de madrugada. Tinha 33 anos. Nem chegou a cantar em Belém, pois só apareceria em “ Pallacci”. (ROGEL SAMUEL,
http://pt.wikipedia.org/wiki/Rogel_Samuel)
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