Na semana passada, sexta-feira, dia 31 de outubro, terminou, no Centro da cidade do Rio de Janeiro, no espaço cultural Casa – Cooperativa de Artistas Autônomos, Casa Mercado, 45, mais um belo encontro reunindo pesquisadores,, estudiosos, professores universitários, recém-graduados de Letras, escritores amigos de João Antônio, amigos e admiradores-leitores e até casuais pessoas que, tendo tido notícia sobre o encontro pela imprensa, lá compareceram para saber mais sobre o autor homenageado, o contista paulista João Antônio, autor do conhecido livro Malagueta, Perus e Bacanaço(1963) que faleceu prematuramente, em 1996, no seu próprio apartamento em Copacabana, na Praça Serzedelo Correa. O trágico de sua morte foi que o escritor foi encontrado morto após alguns dias de seu falecimento. Nunca se soube exatamente o dia em que morreu. Até nessa circunstância de seu desaparecimento há algo que liga sua vida à sua obra literária.
O Terceiro Colóquio teve resultados animadores diante da qualidade dos trabalhos e Comunicações apresentados entre os dias 28 e 31 do mês recém-findo. O evento foi organizado graças a uma parceria da Pós-Graduação em Literaturas Vernáculas da UFRJ e a UNESP, de Assis, SP, através do Arquivo João Antônio, que está sob a responsabilidade dessa última. A coordenação-geral do encontro ficou sob os cuidados da jovem escritora Ieda Magri, que, por sinal, faz Doutorado em literatura brasileira na UFRJ sobre a obra de João Antônio. Como representante do Arquivo de João Antônio veio a Profa. Dra. Ana Maria Oliveira. O próximo Colóquio já foi anunciado: será na USP, em São Paulo.
Deve-se assinalar que o encontro não se limitou tão-só a apresentações e discussões acadêmicas, mas foi animado por diversos aspectos de sua Programação. Na noite de abertura, a Programação constou da apresentação do grupo Filhotes de Leão, exibindo a Intervenção Urbana Patuléia, conversa informal com o escritor Antonio Torres, amigo de João Antônio, coquetel temático e grande roda de samba, tudo , enfim , para dar um toque de uma atmosfera bem ao gosto do homenageado.
Além desse lado artístico e descontraído, é digno de assinalar que os organizadores do evento aliaram à seriedade das horas destinadas às comunicações e discussões acadêmicas as sessões do encontro que objetivavam propiciar um forte cunho de momentos de descontração que muito tinham a ver com a biografia de João Antônio e com o caráter deambulatório que singulariza a sua ficção, ou seja, o espaço da rua, dos morros, dos botequins, do povão. E para isso a Programação constou de um passeio ao Morro da Conceição, Lapa, Copacabana, bairro carioca que tanto amou e nele , segundo já mencionamos, viveu e veio a falecer.
Fazendo-se o balanço geral do evento, não posso deixar de reiterar a importância do Colóquio, destacando-se a variedade dos temas apresentados pelos participantes, numa demonstração inequívoca da força que o escritor ainda revela para novos pesquisadores. Assistindo a tais discussões, muitas vezes, sob o impacto da emoção de alguns expositores, fico a imaginar que João Antônio muito longe estará de esgotar-se como objeto de estudos e de investigação acadêmica.
Sua obra, aparentemente despojada de sofisticações temáticas, está aí a oferecer aos estudiosos, aproximações crítico-interpretativas para todos os gostos, porquanto por ela perpassam muitas linhas de força em várias frentes de investigação no campo da estilística, da sociologia, da antropologia, das ciência políticas, do jornalismo, da história, da música, do cinema, da filosofia, dos estudos de literatura comparada, da poética, dos estudos do gênero, da biografia, da genologia, da linguagem, da lingüística, da geografia literária, da epistolografia, enfim, um variado e riquíssimo repertório de estudos ainda em muitos aspectos virgens e que estão à disposição dos estudiosos brasileiros ou estrangeiros.
Quero, por outro lado, deixar bem claro que João Antônio longe está de ser um ficcionista para iniciados. Ao contrário, deve ser mais lido e divulgado pelo país afora, o que viria a se concretizar aquela vontade dele de ser conhecido por todos aqueles que se interessam por uma literatura feita com a força da verdade. Ele sempre falava em fazer na sua ficção uma “radiografia do país”
Desejo, finalmente, cumprimentar o filho de João Antônio, o Daniel - que esteve presente ao Colóquio e prestou comovente homenagem ao pai, dando um depoimento afetivo acerca da figura do ilustre contista e jornalista -, por haver assumido, de público, o compromisso de continuar mantendo toda o acervo de João Antônio aqui no Brasil sob a responsabilidade da UNESP-Assis, SP, através do Arquivo João Antônio, cujo prazo conveniado para a utilização do acervo com essa Universidade já estava se esgotando, não se rendendo, assim, ao canto de sereia da Universidade de Heidelberg, na Alemanha, que tinha manifestado um grande interesse de comprar aquela inestimável fonte de pesquisa universitária.
O ponto alto do Colóquio foi a visita dos participantes ao prédio Lambert ,na Praça Serdelo Correa, em Copacabana, vulgarmente chamada Praça dos Paraibas ou dos Paus-de-Araras, em que João Antônio residiu durante muitos anos ate à sua morte. Lá fomos colocar uma placa do lado esquerdo da fachada do edifício em homenagem ao seu mais ilustre morador. A placa traz uma magnífica charge inédita de Cássio Loredano. A imprensa não estava lá no momento, mas o conteúdo das palavras extraídas do início do mais famoso conto do autor, "Malagueta, Perus e Bacanaço ," ficcionista que tanto amou o Rio e o povo carioca, tanto quanto São Paulo, resume bem sua vida e principalmente sua obra:
“Olá, meu parceirinho!
Está a jogo ou a passeio?”
Aqui viveu o bacanaço
João Antônio, escritor e jornalista.
* São Paulo, 1937
+ Rio de Janeiro, 1996
Rio de Janeiro, 30 de outubro de 2008.