"Tenho mais almas que uma"
Em: 03/12/2007, às 15H10
ENTREVISTADO:
Fernando Pessoa - uma colagem de Rodrigo de Sousa LeãoComeço pedindo perdão aos puristas. Meu objetivo não foi escrever o currículo de Fernando Pessoa, como sempre ocorre, nas linhas de abertura da entrevista. Todos o conhecem. Dito isto...
Em 1888 nasce Fernando Antônio Nogueira Pessoa, em 13 de junho, no Largo de São Carlos, Lisboa. Com sete anos escreve o seu primeiro poema, intitulado À Minha Querida Mamã. Desta data até 1935, no dia 30 de novembro, quando vem a falecer; Fernando Pessoa ergue a sua obra literária. Em vida publicou apenas Mensagem, com o qual ficou em segundo lugar num concurso literário. Sua última frase escrita foi: "I know not what tomorrow will bring".
Rodrigo Souza Leão
Nesta vida em que sou meu sono, Álvaro de Campos Tenho mais almas que uma. Os impulsos cruzados Ricardo Reis Fernando Pessoa Como é o seu processo criativo? As vezes tenho idéias felizes, Álvaro de Campos Alberto Caeiro O que os deuses querem de um homem como Fernando Pessoa? Queriam-me casado, cotidiano, fútil e tributável? Álvaro de Campos O senhor acredita em Deus? Às vezes sou o Deus que trago em mim Às vezes não sou mais que um ateu [Novas Poesias Inéditas] O senhor tem um lado zen. O que é pensar no nada? Pensar em nada Álvaro de Campos O senhor é/foi maluco beleza? Fui doido e tudo por Deus. [Poemas Dramáticos Existe algum mistério no Universo? O único mistério do Universo é o mais e não o menos. A Realidade é apenas real e não pensada. Alberto Caeiro O principal desejo do poeta é a eternidade? ama o infinito porque mais do que todos O Senhor é saudosista? Eu amo tudo que foi, [Poesias Coligadas/inéditas] [Quadras ao gosto popular] O senhor é um sábio? Sábio é o que se contenta com o espetáculo do mundo, Ricardo Reis Como definiria a VIDA neste mundo de meu Deus? A vida é um hospital [Quadras ao gosto popular] Quem é o poeta? O que busca na poesia? O poeta é um fingidor, Fernando Pessoa Alberto Caeiro Tem algum mote que o acompanhe? "Tudo vale a pena quando a alma não é pequena." Fernando Pessoa Qual o conselho pode dar aos jovens de espírito? Segue o teu destino, A realidade Suave é viver só. Vê de longe a vida. Mas serenamente Ricardo Reis Publicado originalmente no Jornal de Poesia
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Quem é a pessoa atrás do Pessoa?
Não sou meu dono,
Quem sou é quem me ignoro e vive
Através dessa névoa que sou eu
Todas as vidas que eu outrora tive,
Numa só vida.
Vivem em nós inúmeros;
Se penso ou sinto, ignoro
Quem é que pensa ou sente.
Sou somente o lugar
Onde se sente ou pensa.
Há mais eus do que eu mesmo.
Existo todavia
Indiferente a todos.
Faço-os calar: eu falo.
Do que sinto ou não sinto
Disputam em quem sou.
Ignoro-os. Nada ditam
A quem me sei: eu 'screvo.
Se as coisas são estilhaços
Do saber do universo,
Seja eu os meus pedaços,
Impreciso e diverso.
Eles foram e não foram.
Idéias subitamente felizes, em idéias
E nas palavras em que naturalmente se despegam...
Depois de escrever, leio...
Por que escrevi isto?
Onde fui buscar isto?
De onde me veio isto? Isto é melhor do que eu...
Seremos nós nesse mundo apenas canetas com tinta
Com que alguém escreve a valer o que nós aqui traçamos?...
Não me importo com às rimas. Raras vezes
Há duas árvores iguais, uma ao lado da outra.
Penso e escrevo como as flores têm cor
Mas com menos perfeição no meu modo de
exprimir-me
Porque me falta a simplicidade divina
De ser todo só o meu exterior
Queriam-me o contrário disso, o contrário de qualquer [coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
E então eu sou o Deus, o crente e a prece
E a imagem de marfim
Em que esse Deus se esquece.
Desse Deus meu que eu sou quando me exalto.
Olho em mim todo um céu
E é um mero oco céu alto.
é ter a alma própria e inteira.
Pensar em nada
É viver intimamente
O fluxo e o refluxo da vida.
Só a loucura incompreendida
Vai avante para os céus.
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Só a loucura é que é grande!
E só ela é que é feliz!
Primeiro Fausto]
Percebemos demais as cousas — eis o erro, a dúvida.
O que existe transcende para mim o que julgo que existe.
se apega à vida, desejando-a infinda,
sob a simulação de resignar-se com a transitoriedade.
Tudo que já não é,
A dor que já não me dói.
A antiga e a errônea fé,
O ontem que dor deixou,
O que deixou alegria
Só porque foi e voou
E hoje é já outro dia.
Saudades, só portugueses
Conseguem senti-las bem
Porque têm essa palavra
Para dizer que as têm
E ao beber nem recorda
Que já bebeu na vida,
Para quem tudo é novo
E imarcescível sempre.
Onde quase tudo falta.
Por isso ninguém se cura
E morrer é que é ter alta.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
Ser poeta não é uma ambição minha.
É a minha maneira de estar sozinho
Rega a tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós próprios.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras
como ex-voto aos deuses.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode
Dizer-te. A resposta
Está além dos deuses.
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam.