Teixeira de Pascoaes (P.1877-1952)

Canção Da Névoa

 

Tristezas leva-as o vento;

Vão no vento; andam no ar...

Anda a espuma à tona de água

E à flor da noite o luar...

 

Vindes dum peito que sofre?

De uma folha a estiolar?

Donde vindes, donde vindes,

Tristezas que andais no ar?

 

Eflúvios, emanações,

Saídas da terra e do mar,

Sois nevoeiros de lágrimas

Que o vento espalha, no ar...

 

Suspiros brandos e leves

De avezinhas a expirar;

Ermas sombras de canções

Que ficaram por cantar!

 

Brancas tristezas subindo

Das fontes, que vão secar!

E das sombras que, à noitinha,

Ouve a gente murmurar.

 

Saudades, melancolias,

Que o Poeta vai aspirar...

Melancolias e mágoas,

Que são almas a voar.

 

E o Poeta solitário

Fica a cismar, a cismar...

Todo embebido em tristezas,

Levadas na onda do ar...

 

E o Poeta se transfigura,

É a voz do mundo a falar!

E aquela voz também vai

No vento que anda no ar...

 

in As Sombras