Teatro Amazonas
Por Rogel Samuel Em: 24/07/2009, às 15H23
TEATRO AMAZONAS
(romance de)
Rogel Samuel
1. O TEATRO VAZIO.
O deputado Fernandes Júnior chegou cedo ao prédio da Assembléia Legislativa Provincial, que ainda estava fechado. Ele entrou pela porta lateral, reservada aos faxineiros, secretários, auxiliares administrativos.
Era uma bela manhã de maio de 1881. O deputado trazia consigo o rascunho do texto que mudaria a história do Amazonas, pois prometera à sua mulher, D. Auxiliadora de Nazaré, que levantaria o pleito de se construir um teatro de alvenaria para a cidade de Manaus.
A cidade dispunha de três espaços para espetáculos: o “El Dorado”, o “Éden-teatro” (um barracão de madeira) e uma sala no Edifício da Beneficência Portuguesa, onde se representou “São Benedito”, uma peça popular.
Na noite anterior, no Éden, a exigente D. Auxiliadora assistira “Ghigi”, de Gomes de Amorim, e anteriormente a “Justiça”, de Camilo Castelo Branco, em 1869.
A vida em Manaus era elegante, rica, alegre, no início do apogeu de uma sociedade que enriquecia rapidamente, com a extração da borracha. Fernandes Junior e sua mulher viviam em festas, piqueniques e espetáculos teatrais. Os salões de sua casa se abriam todas as semanas, nas noites das sextas-feiras, para receber os amigos. Nos domingos, numa grande mesa, sob o caramanchão do jardim, era oferecida uma tartarugada, ou uma peixada, almoço festivo regado a vinho português, sucos de diversas frutas, compotas de doces e banhos nas águas limpas do igarapé que passava atrás da casa.
Aquilo ia até ao anoitecer. Lima Silva, Alarico José Furtado (presidente da província do Amazonas), Emílio Moreira, João Coelho e outros freqüentavam aquela mesa, com esposas, filhos, babás e empregados, congestionando a rua da Conceição, onde morava o deputado. Entre os convidados, o rico comerciante Manuel de Oliveira Palmeira de Menezes, chefe da casa Menezes, Gomes & Cia, o primeiro contratante da obra de construção do teatro, que depois passou para Alexandre Dantas e passou para Rossi & Irmãos da Itália, todos impossibilitados de realizar a obra pelos 493 contos contratados.
Fernandes Júnior era um dândi, simpático, educado, conhecia Paris, tinha refinamento, elegância e alguma cultura, principalmente de autores portugueses. Seu projeto era bem modesto, de apenas 60 contos de réis, para a construção de um teatro. Aprovaram em 120 contos. Mas as obras pararam. Quase dez anos paradas. E chegaram a milhões de contos de réis. Foi uma obra faraônica, uma das maiores e mais dispendiosa obra da República, até hoje. Fernandes Junior faleceu no Maranhão, no dia 24 de abril de 1894, treze anos depois de ver o seu Teatro construído com grandes, gigantescas modificações. Chegou a ver o Teatro Amazonas “erguido e em pleno apogeu”, como escreveu sobre ele Mário Ypiranga Monteiro.
Anos depois, em 1995, estando Paravotti no Brasil, fez questão de ir a Manaus apenas para conhecer o Teatro, que foi aberto somente para ele. Cantou para o Teatro Vazio. Em 1996, foi a vez de José Carreras. O Teatro, entretanto, estava lotado.