Será que, no Brasil, alguém merece o nosso voto?
Por Cunha e Silva Filho Em: 13/10/2021, às 23H06
SESSÃO NOSTALGIA:
quarta-feira, 8 de outubro de 2014
Será que, no Brasil, alguém merece o nosso voto?
Cunha e Silva Filho
Se a política brasileira constitui uma soma de simulacros, em que as imagens dos candidatos se constroem graças à publicidade enganosa, a marqueteiros vendilhões, a mentiras trocadas entre candidatos e, agora, no segundo turno, a recomposição de candidatos que, antes se atacavam olho no olho ou em viagens pelo país afora, já começam a jogar seus papéis múltiplos no ping-pong de partidos de orientações ideológicas díspares e incompatíveis com os seus programas de governo e metas a serem atingidas durante seus mandatos, como é que fica a cabeça do eleitor sem ponto de apoio seguro, transparente, diante de tanta balbúrdia?
O segundo turno gerou a bipolarização pronta a vender a alma ao diabo desde que seja o vencedor dessa segunda rodada. Os antigos inimigos se tornam, agora, amigos de oportunismo porque, na peleja renhida, tudo vale nas alianças feitas. Os fundamentos ideológicos dos candidatos se esfarelam, viram uma salada mista, um saco de gatos, um samba do crioulo doido.
No meio desse mafuá (não o do grnde lírico Manuel Banderia) de novas combinações estapafúrdias, o país continua desatrelado das suas obrigações e compromissos assumidos da candidata-presidente: aumento dos preços, novas revelações de corrupção, violência calamitosa, o estado de Santa Catarina em polvorosa, com explosões de violência, ônibus incendiados, bandidos à solta teleguiados por ordens de alto crime, cujas decisões partem dos presídios. O país está em baixa, política, moral e eticamente. Até os eleitores menos instruídos que, porém, têm experiência da vida e dos homens, me dizem em conversas na rua que o país vai mal, que ninguém acredita mais em políticos nem em melhorias para a Nação, que estão decepcionados com todos e tudo que traz o sinete do que chamam de política.
A crise política é de ordem ética, de falta de confiança nos nossos homens públicos. Vejam-se alguns candidatos reeleitos para a Câmara dos Deputados ou para o Senado. Vejam que os mais bem votados nada podem representar de útil ao país; são oportunistas que, por pertencerem à mídia cultural, são feitos deputados e senadores. O pior: esses candidatos, durante os mandatos anteriores, nada fizeram pelos seus estados. Fizeram, sim, para si mesmos, ou seja, para se beneficiarem das condições de marajás – condições estas que não mudaram desde os tempos do Collor que, por sinal, foi eleito senador.
Transformamos a eleição num espetáculo circense, no qual os eleitores estão presentes ao voto para se divertirem com o próprio cinismo e falta de auto-respeito.
Não vejo o voto nulo, o voto em branco como falta de atitude cidadã. Esse comportamento do eleitorado tem sua razão de ser: ele espelha a náusea que cada um sente pelo que está vendo acontecer no país. Ele sabe que, ao se eleger um político para defender os direitos e atender aos anseios da sociedade, nada se concretiza das promessas falaciosas do que afirmou na campanha. Foram palavras ocas, sem substância, sem o peso da verdade.
Essa postura negativista do eleitorado é um sinal de alerta ao sistema democrático que, assim, é posto em dúvida no que concerne à sua validade. Quando o embuste, a mentira, a falsidade, e mormente o cinismo se tornam moeda corrente entre quem abraça a política por oportunismo e interesses pessoais, o nível de ceticismo, de descrença do eleitorado ascende a proporções alarmantes e perigosas para os alicerces da democracia e se torna presa fácil para o arrivismo populista ou messiânico, ou senão para lançar os incautos à fogueira dos regimes de força de triste memória, não só no Brasil como em outros países.
Não se pense que as manifestações – compreenda-se, as pacíficas - do ano passado contra os erros da política brasileira, contra a corrupção e outros males nacionais foram em vão. O futuro governante da Nação não pode nem deve subestimá-las. Elas permanecem como um vulcão pronto a entrar em erupção novamente e com mais poder de força caso não sejam solucionados os graves problemas do país.
O “homem cordial” brasileiro tem suas complacências, seu lado pacífico e ordeiro, mas, se sentir aviltado, esbulhado em suas justas reivindicações, saberá como agir sem violência nem depredações, mas com a firmeza da massa indignada contra os desmandos do poder arbitrário. E o mesmo vale para todos os três poderes constituídos. Lembrem-se os futuros governantes que o mero fato de conquistar mandatos políticos não lhes faculta o uso do autoritarismo, da prepotência, da enganosa ilusão que, no exercício do poder, possa arvorar-se em "donos do poder". A soberania da nação é apanágio do povo, não de políticos de plantão.
O merecimento de nosso voto está em estreita dependência dos valores morais, da integridade , competência e do real desejo de os políticos propiciarem o bem-estar da sociedade.