[Whashigton Ramos]

     Saudade de adolescentes que estudavam de manhã na escola e, à tarde, após o almoço e depois de lavarem a louça e arrumarem a cozinha, pois na casa não havia empregada doméstica, sentavam-se à mesa da sala de estar, abriam livros e cadernos para fazer o dever de casa. Aqueles que estudavam à tarde na escola, acordavam cedo, merendavam, lavavam a louça do café, arrumavam a cozinha e sentavam na sala de estar e faziam o dever de casa, quando não o haviam feito na noite anterior. Raramente eram interrompidos pela mãe, que, estando também muito ocupada, dizia: “João, meu filho, vá comprar um tubo de linha verde no armarinho”; ou, “Carlos, vá ver se a água do arroz já secou”; ou ainda, Mirtes, vá na mercearia dá uma ajuda a seu pai, ele está lá desde as seis horas.” Todos obedeciam sem reclamar, sem fazer cara feia.

     Saudade de uma pequena turma de adolescentes (uns quatro ou cinco) que se encontrava no clube de jovens do bairro para passar a noite estudando (“virar a noite”, como se dizia.). No intervalo, à meia-noite, comíamos pão com ovo frito e tomávamos café. Saudade de um amigo adolescente, como eu na época, com quem virei a noite na sala dois do velho Liceu Piauiense, estudando matemática.

     Saudade da casa de um amigo na Vila Operária que tinha um quadro negro de madeira, onde resolvíamos problemas de matemática. Todos os filhos naquela casa eram muito estudiosos, embora os pais, que os incentivavam muito para os estudos, fossem pessoas semiletradas.  Um dia, estávamos pegados com uma equação de segundo grau, quando, voltando do Liceu, chegou um amigo que desenhava bem e ficou ilustrando os problemas que estávamos resolvendo e rindo dos nossos erros e acertos.

     Desses amigos adolescentes, nenhum matou ou feriu alguém fisicamente. Acho muito difícil que algum deles tenha pensado em ir armado à escola.   Nenhum deles é  admirador de Hitler nem dos descendentes desse genocida que incentivam o uso de armas de fogo e o discurso de ódio.

     Saudade de uma época em que a televisão ainda estava engatinhando e foi chamada de “máquina de fazer doido” por Stanislaw Ponte Preta. O que ele diria hoje da internet e do celular?

     Será que a internet e o celular vão continuar fazendo da escola a guilhotina de professores e alunos? O paredão de fuzilamento de docentes e discentes? Os adolescentes de hoje não viram mais a noite estudando? As famílias não veem mais seus filhos estudando na sala de estar ou no quarto de estudo onde havia o quadro negro? É verdade que cada filho se isola hoje em seu quarto com o celular e o notebook e não deve ser perturbado em “sua sagrada” individualidade?

     Não tenho respostas a essa perguntas, mas elas me lembram a atitude de uma amiga minha, mãe durona de três filhos adolescentes. Ela lhes dizia sempre: “Enquanto estiverem sob o conforto de meu teto e comendo de meu feijão, vão ter que me obedecer.”