Diego Mendes Sousa e Decio Machado
Diego Mendes Sousa e Decio Machado

ROSA NUMINOSA

 

Por Decio Machado

 

 

“Se queres ser universal, cante sua aldeia”

Leon Tolstoi

 

 

 

O livro Rosa numinosa (2022), do poeta maior Diego Mendes Sousa, divide-se em 04 (quatro) capítulos:

  1. Gestas das ruínas e dos telhados tostados;
  2. Andilhas surradas;
  3. Alba da alma dispersa;
  4. Salmos à gleba das carnaúbas.

O título do livro, termo originalmente encontrado em Velas náufragas (2019), opus poético desse mesmo escritor, já anuncia a sensibilidade lírica da obra, verdadeira encarnação do belo e da força metafórica das palavras.

O livro sustenta-se em fases distintas iniciadas em “Gesta da água”, o poema inaugural que procura a ironia (principalmente nos gestos), e temos uma outra fase mais engajada, as suas andilhas surradas: o grito do eu lírico contra a poluição e contra o horror da pandemia.

Em Alba da alma dispersa o ser poético encontra a morte e a saudade: Efatá! (Abre-te!), o primeiro poema desse capítulo avisa sobre a agonia, a nossa própria vida agônica.

Escrito no auge da pandemia da Covid-19, em Rosa numinosa a espiritualidade aflora, a religiosidade, a fé e a fortaleza ingênua dos mistérios ficam translúcidas quando o vate escreve:

“(...) não somente os espíritos secretos da floresta - que vitalícios nas ilusões de uma lenda (...)”

A terra e o ser, poema da predileção do autor, literalmente divide essa obra-prima; seu soluço foi lavado: “o choro / limpa a alma, / molha o rosto, / lava o tempo / e a saudade”.

O mar não encontra mais o grumete, e sim, o capitão, maduro, com novas armadilhas, renovado, assim é:

“Chorar / é enxurrada /de beleza / que arrasta / as palavras / de amor.”

Fantasmas o enfrentam, porém sólido, o poeta ostenta a espada em punho. Eis o capitão! Percebe-se que o próximo poema é a continuidade tímida do anterior, o mar manso ou sem dono, encontra a bordo as brilhantes imagens, restaurando o tempo.

Do poema Transitório aos versos de Tambores, a ironia, a ironia inteligente daquela primeira fase, dá lugar ao dominador do mar e das dores.

Existem abismos, todavia o poeta declara-se forte e alvissareiro:

“Mar grande / é também o meu amar bravo.”  Página 86.

“Correm comigo (...)” Página 88.                                                                                   

O título de um dos poemas, contido na seção Salmos à gleba das carnaúbas, intitulado Malúrico, neologismo, valoriza a carga semântica; ode à gleba e ao mar. Maduro e confessional, o lord poeta ou poeta lord assume: “o mar demarca a minha origem”, verso completo a vislumbrar sua labuta telúrica e malúrica, sua alma e seu canto. O estar em Parnaíba, combustível da alma litorânea e da geografia lírica de um signo extraordinário e sublime, cuja presença é datada em 28 de novembro de 2020, deixa marcas indeléveis. A importância do maestro de Amo cantador aqui, só aqui, é o momento espiritual do hino natal – Parnaíba e o seu filho poeta. Desejou senti-la e sentiu. Devorou os cajus do Labino e os sumos do cajueiro de Humberto de Campos, pois assim simplesmente o quis. Suas impressões sensoriais tornam-no o próprio poema: o sol a pino; os passarinhos em revoada; “a nostalgia singra entre duas carnaúbas altas”, os cajus, sim, os muitos cajus, as dunas, as ondas, ah! as ondas! os sóis, venha procela! Terra vegetal e mar! Olhos verdes da Musa Altair! Poeta Diego e o Diego Mendes Sousa – bardo nos brinda: resisto malúrico (“sou poeta que beija a terra”), altamar, altair: eu somos nós...

 

Decio Machado, poeta, professor e advogado.