Renúncia, impeachment, Lava-Jato e crise econômica
Por Cunha e Silva Filho Em: 22/03/2016, às 10H42
Cunha e Silva Filho
As três situações de desordem, indicadas no títlo do artigo exceção feita à da Operação Lava-Jato, configuram o quadro atípico da vida em nosso país. Elas estão inextricavelmente interpenetradas. Daí seu caráter assustador. O deslindamento de cada um exige de minha parte deveres com a minha consciência e com a minha dignidade de cidadão brasileiro que, antes de tudo, só aspira a um desfecho que venha servir ao bem-estar de nosso povo e, por povo entendo os vários níveis sociais e culturais.
O primeiro item, a renúncia, de Dilma é uma saída honrosa tanto para ela quanto para a Nação. Sei que vai ser espinhoso o que virá depois disso, ou seja, um mandato-tampão a ser ocupado em consonância com a legislação vigente. Será efetivado consoante com os princípios constitucionais do preenchimento da vaga deixada. Pode até não ser uma figura ideal o novo ocupante, mas ela terá, sob sua responsabilidade, que evitar o tumulto social, político e econômico. Tal mudança atenderá à maior parte da sociedade civil e evitará um mal maior e indesejável para todos os compatriotas.Isso não configuraria nenhum atentado à Constituição e, por conseguinte, não seria um golpe conforme alegaria a política da situação.
A presidente Dilma não mais atende à vontade da maioria que foi às urnas maciçamente pedir o seu afastamento ou o seu impeachment, assim como a punição dos responsáveis pela rapinagem praticada por políticos do PT e de outros partidos. Todo o trabalho de dois anos da Polícia Federal, nas várias etapas realizadas sob o amparo da Lei e tendo à frente as gestões corajosas do juiz Sérgio Moro, foi o de revelar culpado e conluiados em lavagem de dinheiro, formação de quadrilha envolvendo o governo federal , e grandes empreiteiras que financiaram campanhas políticas milionárias para elegerem o ex-presidente Lula e inúmeros políticos petistas e da base aliada.
Ora, esse desvio surrupiado dos cofres públicos se estendeu até os governos de Dilma tendo como fonte principal a menina de ovos de ouro, a principal e mais poderosa estatal brasileira, a Petrobrás num esquema sórdido montado por alguns de seus dirigentes em conchavo criminosos com os políticos do governo durante toda essa era dominada pelo petismo. Todo esse período em que o petismo tem mandado e desmandado impunemente no governo só poderia desaguar nas contínuas e profundas investigações, denúncias e delações premiadas levadas a cabo graças à competência da Polícia Federal, do Ministério Público e de Procuradores Federais e, sobretudo, da coragem e patriotismo do jovem e destemido juiz federal Sérgio Moro.
O caos econômico, ao contrário do que apontam economistas, alguns deles professores de universidades federais, estaduais e até particulares (caso da PUC) com implícitas simpatia pelo petismo, não teve nenhuma relação com a situação externa do país. A desordem financeira atual se originou, máxime do dinheiro desviado da Petrobrás para pagamento de milionárias propinas a políticos do alto escalão da República em decorrência de contratos celebrados entre os dirigentes da Petrobrás e as conhecidas grandes empreiteiras, contratos em licitações com cartas marcadas favorecendo grupos de empresários e políticos da situação e de partidos da base aliada.
O imbróglio em que se meteu o ex-presidente Lula ao ser convidado por Dilma para o relevante cargo de ministro da Casa Civil complicou ainda mais a situação constrangedora dele junto aos brasileiros, principalmente quando foi grampeada uma conversa dele com Dilma, na qual a presidente expressamente lhe concede, diante do desespero em face da iminência da prisão de Lula, o cargo de ministro e até com o termo de posse antecipado. A atitude no mínimo insólita da presidente atesta, por si só, o estado de emparedamento diante da gravíssima situação da sua malograda administração.
A posse atropelada de Lula provocou seguramente mais transtornos ao governo Dilma, mais desgastes, mais desmoralização da opinião público, ainda mais reforçada por um outro grampo feito pela investigação Lava-Jato que flagrou uma conversa de dois personagens trocando informações sobre o que poderia acontecer com o Lula.
O mais intrigante é que nessa conversa pude perceber nitidamente o nível de irresponsabilidade e de incertezas em que o diálogo aconteceu. A forma de linguagem – um prato cheio para a análise do discurso de algum professor de linguística – possui um certo ar de tragicomédia com que são discutidos assuntos algo sórdidos nos bastidores do governo petista. É tão medíocre o que Rui Falcão, presidente do PT, diz para o ex-ministro da Defesa, Jaques Wagner, que me deixa impressionado a falta do que fazer, de como agir num diálogo, diria melhor, quase monólogo afásico entre os dois. A conclusão que tirei desse diálogo mal-ajambrado, claudicante, sem-saída, digno mais de uma ópera-bufa, foi que ambos pareciam atônitos, logo os dois tão acostumados às fanfarronices e ao baixo clero da politicagem nacional.
A polêmica inflamada decorrente da impugnação da posse de Lula para o cargo de ministro da Casa Civil pelo ministro Gilmar Mendes tem dividido a opinião de magistrados e juristas de todas as colorações políticas. E a alegação de se dizer que um ministro do STJ sempre é movido pela imparcialidade é um ato falho, porque não há como ser imparcial avant la lettre se levarmos em conta o elemento da subjetividade. Mesmo a objetividade mais despojada, contém algo de subjetivo. Somos humanos, não máquinas, como diria o genial Charles Chaplin.
Um juiz, um magistrado, tem o seu lado pessoal, suas preferências políticas. Porém, no caso, de Gilmar Mendes ele não poderia ser indigitado como parcial, de vez que é a sociedade brasileira que, para as ruas no país inteiro, tem afluído gigantescamente clamando por justiça e pela moralidade e fim da impunidade no país.
A gran de questão nacional no tocante a partidos políticos é que nela o diálogo é quase escasso.Contudo, há certas circunstâncias ou conjunturas históricas que, ante dos fatos e as evidências comprovadas nas investigações da Polícia federal desde o início do governo Lula, nos dão o equilíbrio e a consciência necessários ao discernimento para verificarmos o que realmente anda errado nas administrações petistas.
O que se revelou das investigações complicando o comportamento e as ações supostamente éticos do PT – lavagem de dinheiro, falsidade ideológica, desvios astronômicos do dinheiro público, desídias de toda a sorte praticadas e consentidas pelos próceres do PT e dos seus aliados nem precisaria de tantas filigranas e chicanas jurídicas para comprovação da realidade político-social-econômica nacional.
Tudo está claramente visto, denunciado, revelado, avaliado, comprovado e a comprovar, pois as ações da Lava-Jato não terminaram ainda. Seria tapar o sol com uma peneira não ver que o ciclo petista se desviou radicalmente dos princípios de formação ideológica voltados sobretudo para os desfavorecidos. Reconheço, sim, alguns pontos positivos, melhorias dos excluídos e outros benéficos sociais fundamentais da vida de grande parcela dos brasileiros que historicamente viveram na pobreza absoluta, como, de certa forma, ainda vivem alguns patrícios nossos nesse país de dimensão continental.
Por outro lado, fazer algo de bom para uma minoria,não é o suficiente se o partido escolhe, a certa altura da era Lula, o caminho mais execrável possível: o da falta de ética, o da roubalheira, o da compra de aliados para se sustentar, a todo o custo, no poder o dos inúmeros escândalos enlameando as raízes éticas da formação do PT.
Com isso, o partido dos trabalhadores debandou-se para a politicagem mais nauseabunda e cínica de que se tem notícia, na qual tudo valia para que o petismo se perpetuasse no poder.
Por outro lado, quem, em sã consciência, vai negar o holocausto, os crimes de Hitler, de Mussolini, de Fidel Castro, de Franco, de Idi Amin, de Mussolini, de Salazar, de Bashar Al-Assad, de Pinochet, do stalinismo, do Estado Novo getulista, dos excessos e da ditadura militar no Brasil, da forma nefasta e criminosa do governo Bush II e outros tantos crimes de ditadores e tiranos pelo mundo afora, sem falar de novas formas de extrema violência de grupos terroristas que estão assolando a paz intera até de países antes tranquilos? E essa selvageria só abrange certa parte da contemporaneidade de séculos mais próximos de nós.
Diante dessas ponderações, a minha pergunta final é: quem pode, sem paixão nem fanatismo nem tampouco oportunismo criminoso afirmar que o governo do PT seja hoje o que foram os seus fundamentos históricos, éticos, ideológicos ?