Razão e emoção
Em: 04/12/2014, às 19H19
A escritora Jane Austen publicou “Sense and Sensibility”, em 1811. Na opinião geral, a discussão feita nessa novela é a da concorrência entre a Razão e a Emoção no processo decisório humano.
Na sabedoria tradicional, mesmo na de hoje em dia, usamos a razão ou usamos a emoção, sendo melhor nos submetermos aos ditames ‘superiores’ da razão. A emoção nos remeteria à animalidade. Essa separação de dois modos alternativos de agir é decorrência da ideia religiosa de alma e de corpo como dimensões autônomas.
O tempo passou, e há muito de novo no entendimento do papel da razão e da emoção nas nossas escolhas. São duzentos anos de discussões e de pesquisas nas áreas da Medicina, da Neurobiologia e das Ciências Cognitivas. O fato científico, em 2014, já válido há décadas, é que as emoções agem como orientadoras ou guias no nosso achamento de cursos de ação na vida.
O pesquisador português António Damásio, com seu livro “O erro de Descartes”, demonstrou ao público comum que não existem em separado: de um lado, uma mente racional, afinada com o conceito de alma; e de outro lado, o corpo humano, o qual deteria a emocionalidade, algo animal. O erro de René Descartes está em ele ter ensinado que a razão está fora da dinâmica básica do corpo e, assim, autônoma em relação à emoção.
A demonstração empírica desta verdade, anunciada ao público leigo, pelo português António Damásio, está nos registros clínicos dos seres humanos que, por efeito de lesão no cérebro nos tecidos pertinentes, perdem a capacidade para as emoções. Eles perdem a capacidade de raciocinar com bom desempenho. Ou seja, a falta de vontade para agir, ou do desejo por isso ou aquilo, ou do amor ao próximo, ou das noções morais, tudo isso leva a que eles façam escolhas estropiadas, sem mínima sabedoria. Por vezes, a falta da emocionalidade leva à absoluta inação. Simplesmente não se decide, e se aceita, sem sofrimento, a própria omissão. Escolher não é uma precisão para essas pessoas “desemocionalizadas”. Se forem pressionadas, ou instadas a ponderar e julgar, o farão como se tivessem um quebra-cabeça para desvendar. Ao chegarem a uma solução, não mostrarão alegria ou um mínimo sorriso.
Essas descobertas, já antigas de décadas, confirmam a importância do que se passou a chamar, também há anos, de “inteligência emocional”, ou seja, aquela capacidade de discernir que antecede e conduz ao ato de julgar racionalmente.
Curioso que seja, eu penso, fazemo-nos humanos pela emoção. Não importa sermos racionais. Essa qualificação, a de sermos dotados da razão, apenas, se tanto, nos distingue dos outros primatas e dos demais primos do reino animal. Todavia, não nos dá meios para a alegria, o conforto íntimo, a compaixão e a solidariedade. Não nos direciona aos sentimentos.
A nossa humanidade, tenho muito gosto em afirmar, está na emoção.