Rachel vê Jânio

[Manoel Hygino dos Santos]

Pela Academia Brasileira de Letras, Edmilson Caminha teve editado, no final de 2010, seu "Rachel de Queiroz, a Senhora do Não me Deixes". Cearense como a escritora evocada no livro, Edmilson é dos autores brasileiros contemporâneos que se podia classificar de "econômicos". Seu lema é dar o recado, sem encher páginas e páginas, só para aumentar o volume da publicação.


Assim é o trabalho que lançou, no ano passado, sobre a escritora nascida em Fortaleza, em 17 de novembro de 1910, filha de magistrado e fazendeiro e de uma senhora que tinha gosto pelos estudos e livros e que deixou à primogênita uma preciosa coleção de cinco mil volume.


São descritas as andanças de Rachel por cidades de seu estado, pelo Rio de Janeiro, onde se consagrou pelo romance, e principalmente pela crônica, que a fizera popular nos jornais com que colaborou. E também na "Ultima Página", da revista "O Cruzeiro", a de maior circulação no país e que chegou a 700 mil exemplares, um fenômeno para a época.


Do ponto de vista político, inclinou-se ao socialismo em certo momento, por julgar que ele seria o condão de fazer justiça social no Brasil. Nasceu em uma família de arraigadas convicções políticas. Disse: "Nós, os Queiroz (pela parte de meu pai), e nós, os Alencares (pela parte de minha mãe), sempre fomos raça de repúblicos e rebeldes. Não houve um único dos meus 16 tataravós, Queiroz ou Alencar, que não fosse morto, ou perseguido, ou fugitivo, ou encarcerado naquele agitado período de 1817 a 1824, no Nordeste".


Na revista, era vedada a escrever sobre política. Mas alguma coisa escapava. Em 15 setembro de 1970, manifestou-se: "A situação econômica, está aí, para quem quiser enxergar. O controle da inflação, que parecia impossível, hoje já se considera conquista assegurada. A exportação cada vez maior, mais diversificada, as marcas "Indústria Brasileira" ou "Made in Brazil" espalhadas pelas sete partes do mundo".


Confessou: "A política é que às vezes me azeda". Contudo, em plena campanha pela sucessão de Juscelino, comentou, em 26 de setembro de 1959: "O sr. Jânio Quadro é talvez um grande candidato, mas a verdade é que a gente tem medo dele. Muito messias, muito salvador, muito sobre a Joana d'Arc - sem os santos.


Um homem que se governa e nos governaria pelos arrancos da inspiração, que é, sabidamente, uma deusa erradia. Novo-rico da política, com toda a arrogância, os personalismos, o anseio da originalidade de todo novo-rico.


Homem sem amigos, só tem fé em si mesmo - o que seria muito bom para um tirano, mas o que não parece bom para um governante democrático, que por si só não é nada e só vale na medida em que serve de denominador comum para os demais. Sim, temos medo dele.


Aliás - nem seria bom falar em medo, porque medo mesmo quem faz é o outro, por definição homem de guerra, armado até os dentes, senhor de todos os tanques, espadas, aviões e morteiros. Saraxá!"