QUATRO POETAS DO PIAUÍ – Poemas – Parte 1

 

FLAGRANTES

 

Elmar Carvalho

 

no céu azul

um urubu

 

sob o negror

do guarda-sol

o pelotão azul

de teus olhos

da sombra

me fuzilou

 

 

MINHA VOZ

 

Clóvis Moura

 

Minha mãe deu-me um cravo cristalino

quando nasci. Guardei-o na garganta.

Por isto a minha voz parece o eco

de todo sofrimento que não canta.

Com isto a minha voz se fez desejo

dos surdos-mudos, das mulheres mancas.

É o plenilúnio dos abortos tristes

e o gira-sol dos cegos que não andam.

Minha garganta já sentiu o travo

da palavra guardada e não ditada

por causa dos fonemas mutilados.

Há na voz desse cravo que não toca

um desfilar de mortos e de enterros

e gritos por silêncios soterrados.

 

ORAÇÃO PARA INVOCAR AS QUE NÃO VIERAM

 

H. Dobal

 

Venham a mim todas as que não me quiseram,

todas as que deixaram de conhecer, no sentido bíblico,

um homem competente não só na palavra amor

mas também nos carinhos mais fundos.

 

Venham todas:

as que morreram,

as que engordaram,

as que se enterraram

na rotina dos casamentos.

Venham todas as que o destino não quis.

 

O HOMEM QUE VOLTA

 

Da Costa e Silva

 

Quando fui, com o meu sonho ingênuo e lindo,

Pelas estradas amplas, luminosas,

Vinham as Graças desfolhando rosas.

 

Ergui os olhos para os céus, sorrindo,

A beleza da vida pressentindo...

 

Quando vim, com o meu tédio miserando,

Pelos estreitos e áridos caminhos,

Iam as Parcas espalhando espinhos...

 

Baixei os olhos para o chão, chorando,

E fiquei para sempre meditando.

 

Poemas extraídos de LB – Revista da Literatura Brasileira, nº 6.