Quando eu era criança
Em: 27/02/2014, às 20H44
[Bráulio Tavares]
(Eu e Tide no carnaval)
Tem um blog impagável (http://coisasqueeuachavaqdoeracrianca.tumblr.com/) onde as pessoas contribuem com suas lembranças de infância, aqueles pequenos equívocos meio absurdos que toda criança comete por não entender direito o mundo dos adultos. Exemplos do blog: “Eu pensava que em hotéis só entravam homens, e em motéis, mulheres”; “Eu pensava que uísque 12 anos era para crianças de 12 anos tomarem”; “Eu achava que sexo oral era de hora em hora e sexo anal de ano em ano”, etc.
Bem... Eu me lembro que eu achava que a Terra boiava solta no espaço, junto com planetas e estrelas, e que por baixo de tudo havia o Oceano Atlântico, que se expandia até o infinito em todas as direções. Outra: meus pais mandavam ter cuidado com giletes, dizendo que havia perigo de alguém se cortar, etc., de modo que sempre que eu via uma gilete de bobeira eu a pegava, me trancava no banheiro, quebrava-a em pedacinhos, jogava na privada e dava descarga. Quando pequeno, eu ouvira dizer que o Inferno era embaixo do chão, então quando eu via um buraco qualquer na terra eu me agachava para espiar, para ver como era o inferno.
Uma vez perguntei a minha mãe o que tinha dentro do corpo da gente, eu ficava apontando: “E aqui?”, e ela dizia: “O fígado”, etc., até que a outra pergunta ela respondeu distraída “o ovário”, e dias depois eu disse: “Não posso ir pra aula, estou com dor no ovário”. Ainda nos mistérios sexuais, eu lia nos contos da época coisas como “e daquele beijo apaixonado nasceu um dia nosso filhinho...” e imaginava que as mulheres engravidavam com um beijo, o que trouxe um suspense adicional a qualquer filme, pois bastava haver um beijo e eu ficava imaginando que a mocinha ia ser botada de-casa-pra-fora.
Uma vez, ouvindo uma novela de rádio, eu lamentei que não fosse TV para a gente ver as aventuras dos heróis na selva, e minha irmã Clotilde disse: “Não, se fosse TV a gente ia ver uma sala cheia de microfones e as pessoas lendo o texto em folhas de papel”, e eu achei a TV uma decepção. Minha Tia Adiza, que era solteira, morou conosco muitos anos, e como ela todo dia trocava de roupa e ia para o trabalho, tal como meu pai, eu perguntei a minha mãe se Tia Adiza era mulher ou homem.
Durante algum tempo acreditei que quando alguém era condenado a prisão perpétua ele ia para a cadeia e nunca mais morria. Uma vez discuti com Tide sobre a pronúncia do nome Washington, que eu dizia que era Uachínton e ela dizia que era Vasguitón. Vendo filmes de guerra, eu cheguei à conclusão de que quando dois países entravam em guerra eles mandavam os respectivos exércitos brigar na África, que era uma espécie de continente baldio.