Quando a inspiração atrasa
Por Denise Veras Em: 16/11/2025, às 14H08
“Quando chove fica mais triste a espera por alguém que não vai chegar”, eis um trecho da canção “Quando chove”, de Patrícia Marx. Sempre penso nessa música quando estou precisando escrever e a inspiração não vem. Me apronto, ligo o computador, preparo um café e nada dessa diva caprichosa aparecer.
De tanto esperar desenvolvi técnicas, e hoje aprendi a escrever sem ela. Quando ela aparece é sempre uma alegria, mas não dá para depender da boa vontade de alguém que você nunca sabe se irá aparecer. Aprendi a escrever sem ela.
A escrita é sacerdócio laico, desses que exigem compromisso, horário, disciplina e uma certa teimosia produtiva. É preciso cumprir com agendas que muitas vezes nós nos impomos. Isso é ruim? Não necessariamente. O romantismo que envolve a atividade da escrita nutre o imaginário de que ela acontece sem dores nem sacrifícios, e isso não é verdade. Escrever exige dedicação e empenho, mesmo quando não sabemos o que dizer, ou quando estamos travados. Em todas essas situações é necessário continuar.
Além do mito do escritor arrebatado por relâmpagos criativos, me incomoda o do escritor boêmio e vida louca, esse ser folclórico que acredita que precisa viver tudo o que escreve para que o texto “pulse melhor. Isso também não corresponde à realidade, o que faz a escrita pulsar não é o inventário de experiências vividas, e sim a força de quem narra. A literatura nasce da criatura que conta e do criador que sustenta a história. Escrever dói, cansa, pesa e a carga de emoção imposta ao escriba é o que faz a sua literatura ser viva.
Fazer literatura exige vontade e persistência. É preciso sentar e seguir adiante. Mas como nem tudo são dores, a parte boa é o movimento. Quem empunha uma caneta não permanece no mesmo lugar. No fim das contas, escrever é caminhar. Às vezes com tropeços, outras com passadas largas e até carreiras, mas o mais importante é nunca ficar parado.

