Prima e primo, e um casamento desfeito

[Chagas Botelho] 

Alice jogava casca de laranja fresca no teto. Se a tira prendesse na ripa de madeira, logo casaria. Senão, ficaria para titia.

Não acertava uma. Entrou em desespero. Passou a treinar diariamente arremesso de casca de laranja na cumeeira. Afinal, o hábito faz o monge. Moça velha, nem pensar. Carmelo, Deus que a livrasse.

Um dia, acertou. Jogou e acertou. Vibrou muito com a casca de laranja pendurada. Casou-se logo. Teve muitos filhos. Procriou feito coelho. Tempos depois, como se passa nos filmes, ligou chateada para o primo Luís. Jovem rapaz não muito afeito a matrimônio. O casamento da prima estava em crise. Ia se separar. Separou-se.

— Primo, descobri que não nasci para casar. Afirmou em prantos.

— Entendo. Luís respondeu lacônico. Para em seguida completar:

— Olha prima, se servir de consolo, Tolstói, sabe quem é, né? O grande autor de Guerra e Paz, disse que “o casamento é uma doença mortal”.

— Concordo com ele, primo. O meu foi só guerra. Disse Alice lamuriosa.

Luís, irônico, insensível, ainda provocou a coitada:

— Prima, e agora descasada, vai jogar casca de laranja no oitão da casa para arranjar outro marido?

Chateada, Alice sapecou:

— Olha aqui seu Luís, primeiro, moro em apartamento. Segundo, tenho gastrite e nem de laranja gosto mais.

Tutututu, desligou.