Elmar Carvalho

Piripiri é uma aprazível e bucólica cidade, como já disse em outra oportunidade e aqui repito com mais ênfase ainda. A esta comuna sou ligado através dos estreitos laços de sangue dos meus ancestrais e parentes. Terra das buganvílias e madressilvas, como a cognominou a professora universitária Cléa Rezende Neves de Melo, a pessoa que, sem favor algum, mais vem fazendo pela preservação da memória histórica e cultural desta terra, celeiro amplo e abarrotado de importantes figuras que se destacam no cenário histórico do Piauí, tanto na política como na magistratura, nas artes, na música, na literatura e no humor.

Entre esses luminares da cultura, do jornalismo, da literatura e da poesia, gostaria de lembrar, apenas como uma pequena amostragem ilustrativa desse celeiro artístico, que é Piripiri, do nome do grande poeta Baurélio Mangabeira, membro da Academia Piauiense de Letras. Menestrel de versos muitas vezes satíricos, jornalista destemido, perambulava por diferentes paragens com a sua imprensa itinerante, como um verdadeiro cigano do jornalismo e da poesia. Boêmio e inquieto, fez uma viagem a Oeiras, a cavalo, com a finalidade de visitar o seu amigo e poeta Nogueira Tapety, que se encontrava doente de tuberculose, então doença muito temida, apenas para palestrar e tomar – quem sabe? – umas boas talagadas da branquinha.

Dizem os doutos e entendidos que a palavra Piripiri, etimologicamente, provém de certo tipo de capim que havia na região. Assim, Piripiri, em sua assonância pitoresca e exótica, em sua singularidade lúdica e telúrica, já lembra o bucolismo da paisagem em que foi fundada e a paisagem em seu derredor. Cidade cortada pelo rio dos Matos, já florido em seu próprio nome e pelas árvores que se debruçam sobre seu leito, formando um túnel de ramas ou uma alameda fluvial. Fernando Pessoa dizia que o rio Tejo era mais bonito que o rio que banhava sua aldeia, mas que o rio Tejo não era mais bonito que o rio que cortava sua aldeia porque o rio Tejo não era o rio de sua aldeia. Dessa forma, como Piripiri para os piripirienses é a capital do mundo, do mesmo modo o rio dos Matos, como no poema pessoano, é o mais bonito rio do universo.

O poeta João Ferry, amigo do poeta Osíris Neves de Mello (sobre quem já me detive em longo estudo), que bem merecia ter um logradouro com o seu nome, se é que já não o tem, cantou todo o encantamento deste torrão no poema que leva o seu nome – Piripiri. Cantou os pau-d’arcos floridos, derramando suas flores de ouro, como lustres soberbos de góticas catedrais. Exaltou o belo bucolismo da Fonte dos Matos, do Recreio, do Mocozal, do Paciência e do Mosquito, no exotismo engraçado desses nomes, que nos fazem viajar nas asas poderosas do pensamento e da saudade. Nesse périplo poético nos deparamos com o riacho Cabresto, que certamente só tem rédeas nos verões das secas inclementes, mas creio ser indomável nas invernadas das chuvas, nos tempos felizes das cachoeiras, da fartura e do verde reverdecido em verde cada vez mais verde. O Garibalde de tantas recordações, de tantas conversas, de tantos sonhos que se concretizaram em realidade e de outros que se derruíram em desilusões e irrealizações. Açude Anajás, Flor dos Campos e rio dos Matos, já nos trazem evocações líricas e bucólicas na poesia de seus nomes, que cheiram a terra molhada e a flores silvestres. O primeiro é um céu a retratar outro céu, na ressonância da imagem dacostiana; o segundo faz lembrar um campo matizado de flores do campo, flores simples, flores humildes, flores incultas, jamais encontráveis nos jardins dos palácios e das mansões, porque apenas cultivadas pelo Supremo jardineiro que as criou; e o rio dos Matos, filho dos matos, na sugestão de seu nome floral.

Por fim, a evocação dos festejos de Nossa Senhora dos Remédios, onde tantos buscaram remédio para seus males, nas promessas da esperança e da fé, onde tantos namoros foram deflagrados, na cumplicidade dos olhares, onde a saudade nascia das bocas das amplificadoras, nas músicas e nos recados do locutor, onde corações eram arrematados nas quermesses dos apaixonados, onde prendas eram leiloadas nas quermesses dos devotos, para as obras da Igreja e ajuda aos necessitados.