Pedra de limar

[Valber Ribeiro]

Ser pedra de limar é uma missão. É como um dom. Não se pode esgueirar-se dele nem sair pela tangente, porque as circunstâncias se apresentam inexoravelmente à sua frente. Essa rocha deve ser tão resistente quanto o diamante, para que possa aparar as arestas das que são pontiagudas, incólumes e ásperas.

Na natureza, o ser pedra de limar é intrinsicamente elemento dela mesma. E é o ato de rolar morro ou ladeira abaixo que a leva a cumprir sua função de deixar redonda, polida sua semelhante. Nesse contexto, trata-se de um evento definitivamente normal.

Na sociedade, entretanto, ser pedra de limar implica deparar-se frequentemente com seres pontiagudos, lisos, afiados, insensíveis, egoístas, frios, calculistas e dispostos a causar ranhuras na pedra de limar. Contudo, resta ao ser, cujo destino é humanizar o outro em estado de matéria bruta, fazer um trabalho árduo de compreensão e sublimação das grosserias, da arrogância, da prepotência, da falta de gentileza etc.

Em contextos particulares, é comum que um chefe seja contundente com um funcionário ao chamar sua a atenção, e este lhe diga coisas impublicáveis. Então, provavelmente, deve haver nesse lugar uma pedra de limar que intervenha para que o equilíbrio se restabeleça.

Ser pedra de limar é tornar o outro mais humano, tolerante, disponível e compreensivo. Em outros termos, é harmonizar as relações nos mais diversos espaços de convivência.

Assim, todos nós somos, em algum momento e grau, pedra de limar. Todavia, há aqueles que o são por essência. Nesse rol, não raro, encontram-se professores, líderes religiosos, pais, psicólogos e outros no plano terreno. E em todos os planos Deus. Na jornada de burilar pedras de configuração humana, elas se apresentam com as mais diversas formas: ríspidas, mal acabadas, porosas e eivadas de contravalores que beiram à irracionalidade. E a relação intersubjetiva com tais pedras machuca-nos, mas nos fortalece. Portanto, sejamos limatão.