PASSEIO PELO SHOPPING  (12)

                                                                      Cunha e Silva Filho    

     

Acompanhado de minha família, lá vou eu, após um bom almoço, dar uma passadinha num shopping da Tijuca, nesse domingo chuvoso carioca. É claro que cada um  de nós,  minha mulher, meu filho  Alexandre (o outro, o Francisco Neto, está no frio de Curitiba) e eu, ao entrarmos no grande shoppping, tem  um objetivo especial,  ou melhor, uma preferência íntima,  para ali   passar  algum tempo. O da minha mulher,  a se ver pela direção que  toma, é costumeiramente olhar  as vitrines das lojas, parar alguns instantes numa delas, olhar os produtos, verificar os preços e,  em seguida, deslocar-se para outras lojas, sempre parando em cada uma delas para  seguir o mesmo  ritual:  olhar  objetos à venda, ver os preços e me dar a impressão de que  deseja comprar alguma coisa.

       Mas, observo com cuidado que a loja que mais lhe chama a atenção é a de joias ou de bijuterias. Nesta ela demora mais tempo. Fixa os olhos  no brilho daquelas  peças, desde as maiores até as minúsculas  feitas de  ouro, prata, diamante (Onde estão os famosos  diamantes  raros das aulas  compassadas do saudoso  professor de ciências do Domício, o professor João Antônio, que também, se não me engano,   era professor de educação física, alto, meio magro, calvo, paciente, educado,  voz tranquila, que, segundo papai, ocultava  um homem de muita força  física e imbatível na quebra de braço das mesas  boêmias regadas a cerveja de bares teresinenses lá pelos anos cinquenta do velho  século  passado?), pedras preciosas ou semipreciosas ou de  outras espécies: água-marinha, esmeralda,  ametista, opala, pérola, rubi, safira, colares em forma de brincos, pulseiras, anéis, cruzes,  brincos, pingente,  broche, colares, relógios de diferentes  designs  e das mais custosas marcas.

       Ao lado de minha mulher, fico dando algum palpite  somente para não a contrariar.  Logo me vem à lembrança os poucos dias que compareci à elegante H. Stern na condição de trainee para me preparar  para a função do que chamavam  de  guide-tour, - período de treinamento rápido ao final de cuja aprendizagem éramos destinados a acompanhar sobretudo   clientes  estrangeiros por vários andares do prédio-sede,  mostrando-lhes  como eram  preparados e lapidados os diversos tipos de  joias feitas de várias espécies de pedras preciosas desde as  menos raras às mais sofisticadas e  dispendiosas só ao alcance de milionários 

       Cada  trainee tinha um instrutor que nos acompanhava  mostrando as diversas workshops e as muitas fases de preparação  daqueles produtos de beleza exuberante, de cores, brilhos e tamanhos   diferentes. As explicações dos instrutores eram dadas em inglês, francês, espanhol e italiano, conforme  fosse a língua  ou línguas do domínio do trainee. Era um treinamento exaustivo, pois tínhamos que  memorizar uma apostila no idioma escolhido por nós.. Eu tive certa dificuldade de  memorizar com perfeição  todas aquelas fases  de preparação das joias e me  atrapalhava todo  trocando  as fases  de preparação  das joias até o seu acabamento final. Eram vários os instrutores que nos  ensinavam  essas etapas. Alguns  dominavam bem a língua; outros eram menos fluentes e  não tinham boa pronúncia.

         Me lembro de que um deles, um italiano,  uma vez me acompanhou fazendo uma exposição  muito rápida e demonstrava pouca paciência em ensinar-me. Era antipático e malcriado e me falara que eu não  tinha  memorizado  como devia para exercer  a tarefa. Achei que aquilo  me humilhou e terminei  desistindo de continuar o treinamento. Além disso, achava chato aquele ritual  pelo qual passávamos. Um outra  razão para meu desestímulo era a obrigatoriedade de  usar terno e gravata.  Acontecia que só tinha um terno e me envergonhava de estar todo dia lá  envergando o mesmo  terno. O de que precisava urgente era ganhar dinheiro para tocar  a vida, enquanto não entrava para a universidade.

       A única coisa boa que aconteceu foi ter encontrado uma colega de trainee, uma jovem  simpática, fluente  em inglês, porquanto  tinha  na época há pouco chegado  do Canadá e estava com o inglês fluente. Acredito que tenha sido aproveitada para a função. Essa jovem me achava parecido com o cantor Paul Anka e me dizia que, daquele grupo de jovens que  faziam parte do treinamento, só eu lhe parecia  um jovem verdadeiro, diferente daqueles outros jovens que  para ela não passavam de  gente artificial, burguesinhos sem graça, emproados e vazios. Não sei se a declaração daquela jovem  escondia alguma admiração além da simples amizade. Tempos, depois,  casualmente a vi na Rua das Laranjeiras. Trocamos algumas palavras e  nunca mais nos vimos.

       Prosseguindo o nosso passeio pelo shopping, fomos nos pesar  numa balança de uma  farmácia. Em seguida,  entramos numa livraria, a Saraiva. Tenho um vício danado, que é o de  entrar em livrarias e, ao mesmo tempo,  tenho uma frustração, a de  sair de uma livraria e  não  comprar um livro sequer. Meus dois filhos  são  igualmente  vidrados em  livros e até nas livros de  sebos, que hoje podemos encomendar pelas livrarias virtuais.

       Tenho observado nas livrarias  um dado novo relacionado a línguas estrangeiras. Era algo impensável no passado: a quantidade de autores e de livros para o ensino de línguas estrangeiras dos idiomas vivos mais conhecidos e  - grande surpresa - nas línguas que nem pensávamos que  hoje seriam   procuradas por interessados, como  o russo, o árabe, o japonês, o chinês, o russo, o aramaico, o hebreu, o holandês, o grego e o latim e  línguas de outras  origens exóticas  - fruto certamente da globalização  da economia mundial.