ELMAR CARVALHO

 

O José Francisco Marques, competente professor de Inglês, falou-me que passara, como exercício, uma breve redação a ser desenvolvida pelos seus jovens alunos, a qual deveria ser ambientada nos Estados Unidos. Um dos seus discípulos, no decorrer de seu trabalho, perguntou-lhe como deveriam ser escritas as palavras Manhattan e Massachusetts. Evidentemente, o dedicado mestre sabia escrevê-las, mas preferiu responder com uma pergunta/sugestão:

Jovem, por que não você não substitui essas palavras por outras, que você não teria dificuldade em escrever corretamente, como Arizona ou Los Angeles, por exemplo?

 

O que o Zé Francisco pretendia era fazer o jovem raciocinar, à procura de melhor solução para as suas dificuldades. Eu mesmo, quando escrevo, e encontro uma dificuldade gramatical, procuro resolvê-la dando uma nova construção à frase ou empregando um sinônimo, ou usando um outro artifício qualquer, para driblar as armadilhas de nossa lodosa Língua Portuguesa. Os estudiosos recorrem aos livros de Gramática. Como nem sempre tenho tempo ou disposição para esses exercícios filológicos e gramaticais, dou a solução que entendo mais rápida e mais fácil, mas de natureza prática e eficaz.

 

Advertiu o poeta espanhol António Machado: “caminhante, não há caminho, / faz-se caminho ao andar”. Ferreira Gullar endossou essas palavras ao lapidar estes versos: “Caminhos não há / Mas os pés na grama / os inventarão”. Creio que os dois vates estejam certos, seja numa interpretação literal ou metafórica. No início, havia a floresta com as suas árvores, arbustos e ervas, com os seus mistérios e medos, mas o homem, esse eterno caminhante e desbravador, foi tecendo os caminhos, e depois as estradas – reais ou republicanas, irreais ou não.

 

Desde cedo, conheci os símbolos extraídos dos caminhos, tanto os que nos levam ao nosso destino geográfico, como os que nos conduzem à consecução de nossos desideratos. Perdi-me em alguns, reencontrei-me em outros. Há os caminhos longos, cheios de curvas e beleza, sem ladeiras íngremes, sem precipícios e sem pedregulhos. Há os atalhos, bem mais curtos, mas cheio de escarpas, atoleiros, torrentes e obstáculos, como pedras e ervas daninhas. Alguns, por vocação ou por pressa, preferem os caminhos mais curtos, embora com os seus perigos e ciladas.

 

Outros, os cautelosos e medrosos, escolhem os caminhos mais longos, porém mais seguros. Sabe-se que a linha reta determina a menor distância. Contudo, em íngremes encostas, nem sempre é possível construir-se os retos caminhos. Muitas vezes a estrada reta requer altos gastos, com a construção de pontes imensas sobre rios e abismos. Os atalhos, quase sempre, são repletos de urtigas e outras ervas daninhas e espinhentas, que nos dilaceram a carne. E nos cegam, como a beleza e o inebriante cheiro da rosa cegam os incautos e os tolos.

 

Às vezes nos perdemos nas encruzilhadas de nossos caminhos e escolhas. Muitas vezes a estrada larga, reta, sem ladeiras é a estrada da perdição, é a estrada que leva o caminhante direto ao inferno. Assim como uma moeda tem duas faces, o nosso itinerário poderá ter vários caminhos. Os atalhos, com os seus perigos, escarpas e precipícios; os caminhos longos, com a sua segurança e conforto. Cabe-nos a escolha, tomada, muitas vezes, de forma impulsiva, precipitada, em função de nosso desejo mais imediato, ou tomada de forma reflexiva, ponderada, em que se leva em conta os resultados a longo prazo.

 

A escolha de nossos caminhos é feita, claro, em função de nossos desejos, e estes podem ser egoísticos e perigosos. Os caminhos podem ser como os djins ou gênios das lendas árabes, cheios de falácias e vantagens enganosas. Atendem os desejos de forma distorcida, traiçoeira, malévola. A uma bela mulher que disse desejar a beleza eterna, o gênio a transformou numa estátua. Assim podem ser os caminhos. Muitas vezes o mais belo pode esconder um terreno pantanoso ou traiçoeiras areias movediças. Tenhamos, pois, cuidado com as nossas escolhas e com os nossos caminhos.