Os trinta raios da poesia

O poema XI  do “Tao te ching” assim o canta:


Trinta raios rodeiam um eixo 
mas é onde o raio não raia 
que roda a roda.
Vaza-se a vasa e se faz o vaso. 
Mas é o vazio
que perfaz a vasilha.
Casam-se as paredes e se encaixam portas 
mas é onde não há nada
que se está em casa. 
Falam-se palavras 
e se apalavram falas, 
mas é no silêncio 
que mora a linguagem. 
É o Ser que faz a utilidade. 
Mas é o Nada que dá sentido.
 
A tradução é do filósofo  brasileiro Emmanuel Carneiro Leão, meu ex-professor de filosofia da linguagem. Os raios seguram e convergem na roda, mas não a são. No vazio do vaso é onde encontramos a água, posta em vasilha. A roda roda no vazio dos seus raios, o vaso envasa no vazio de seu bojo, entre as paredes há o espaço de nossa casa, as palavras se costuram na linha do discurso, em continuidade: mas a linguagem não tem som, tem sentido, e o que é expresso se encontra no seu conteúdo – no vazio do vaso da fala, na poesia da linguagem, o seu silêncio.