Os homens e o clima
Por Cunha e Silva Filho Em: 18/12/2009, às 14H51
Cunha e Silva Filho
Há um descompasso visível e mesmo amedrontador entre o que está se vendo com a Mãe-Natureza e os desdobramentos pouco alentadores das autoridades responsáveis pelos destinos do nosso alquebrado Planeta, agora reunidas nos estertores da COP 15, em Copenhague, em meio a protestos de manifestantes e enfrentamentos do porrete da força bruta, igual em qualquer parte, e utilizando-se dos mesmos instrumentos de repressão dos governos locais. Somos iguais na repressão, o que muda é a língua. Todas as polícias são iguais, as diferenças são mínimas. Não há como retomar aqui o maniqueísmo (positivo neste caso) entre o certo e o errado. O errado tem a força e o fogo, o certo tem a consciência dos males da civilização.
Veja-se o exemplo das condições climáticas e pluviométricas no Brasil que, a bom entendedor, dá a medida da compreensão necessária para a elucidação das conseqüências do efeito estufa. Não é preciso ir muito longe no cerne do problema. Basta ver o volume de chuvas torrenciais que castigam boa parte do país e de forma nunca vista no seu conjunto: São Paulo, a região sul, parte do Rio de Janeiro, por enquanto. Aí temos regiões assoladas ainda com vendavais, tufões, que destroem tudo que encontram e deixam saldo crescentede vítimas fatais, a par de prejuízos materiais enormes causados às habitações, ao comércio, à indústria, aos governos, diminuindo as possibilidades financeiro-econômicas dos estados e da nação no seu todo. As maiores vítimas são as populações pobres ou abaixo da linha da pobreza que, com as inundações impiedosas, perdem tudo, móveis, eletrodomésticos, alimentos, roupas etc. Tudo perdido em questão de minutos. Da noite pro dia viram sem-teto, sem nada. Restam o choro e a lamentação.Perdem, pois, sua identidade espacial. A única coisa que lhes resta é o próprio corpo e o espírito esfacelado pelas águas inclementes. Os flagelados vão engrossar o nível do pauperismo e de todos os males decorrentes dessa situação.
Enquanto isso, os Obamas, os Lulas, os demais potentados, bem postos na vida, cercados de conforto e segurança, em hoteis luxuosos, bem vestidos, bem alimentados, acompanhados de ministros, assessores e assemelhados, vão à tribuna das reuniões de cúpula para discutirem a intrincada e vital questão do aquecimento da Terra causado por milhares de toneladas de CO2 saindo das chaminés das fábricas e indústrias das grandes e poderosas nações que estão matando o que resta de vida em nosso planeta.
Não creio nas declarações mais retóricas do que genuínas desses representantes e líderes mundiais, porque, no cômputo geral, o que mais vai pesar serão os gastos bilionários que os grandes terão que desembolsar para aliviar as pequenas nações de suas menores cotas de poluição, provendo-as de tecnologia e de infraestrutura a fim de que elas avancem no seu progresso sem aumentar muito os níveis de poluição. Ora, e as grandes e gigantescas nações, por que primeiro não se sacrificam um pouco na sua desenfreada atividade econômico-industrial sem os atuais altíssimos níveis de liberação de CO2? Como pretender ajudar as pequenas nações se esses gigantes não se policiam proporcionalmente ao seu consumo e ganância de dólares? De uma certeza estou convencido: a de que, se não sustarmos nosso avassalador envenenamento de nossa atmosfera, não haverá vivente para contar aos netos o que ficou da Terra.
Estamos mais do que técnica e cientificamente informados dos males irreversíveis ocasionados pela insânia dos homens que, pensando ser os donos do mundo, ainda não se deram conta de que a Terra está muito enferma.
Sabemos quem são os culpados pelo aquecimento terrestre. Contudo, como já aconteceu com os desígnios bíblicos do Velho Testamento, ninguém está se lixando para as vozes que parecem falar pela boca dos Céus.
Continuam poluindo, desmatando o Planeta.Teimam em consumir além das necessidades, sobretudo no “planeta” do dólar, região paradisíaca dos milionários que parecem acreditar na imortalidade da força do vil metal, com o qual compram tudo, até a consciência do que é justiça, do que é limite, do que é ser dotado de humanidade. Na sua embriaguez dionisíaca visando à dinheirama a fundo perdido, nos seus excessos de todos os tipos, no seu hedonismo, esses multimilionários apátridas, multipátridas e ubíquos nas suas gastanças pelos quatro cantos do planeta, apenas pensam em si mesmos e o mundo da miséria que vá pras cucuias. Nunca se viu tanta ausência de integridade da pessoa humana..
As águas vão rolar e aí então nem os palácios, as mansões, os castelos medievais com seus arrivistas-proprietários, nem o ouro, o euro, o real e outras invenções dos homens vão dar jeito. Os mares, os oceanos, as calotas polares, os tsunamis, os furacões, os terremotos, os maremotos, os vulcões e outros acts of God não estão pra peixe, quanto menos para esses ínfimos seres que se chamam (deviam se envergonhar disso) humanos.
Pouco ou nada sobrará, exceto as águas do mar como no exemplo paradigmático de Moby Dick de Helman Melville (1819-1891), onde as águas oceânicas, depois da tragédia, mal davam sinal de que a vida ali esteve presente e para a qual o destino se fez morte através da ação do homem. Ahab e tudo o mais que estava com ele não passavam de águas do mar que se moviam como sempre o fizeram “há cinco mil anos.”