Onze de setembro
Por Bráulio Tavares Em: 13/09/2011, às 16H20
[Bráulio Tavares]
Naquele dia, meu filho, que na época tinha nove anos, mudou de canal, do Cartoon Network para a Globo, para assistir Dragonball Z no programa da Xuxa. Acordei não tanto com o volume da TV, mas como o tom angustiado e nervoso na voz do locutor; e já estava diante da tela quando o segundo avião explodiu de encontro à segunda torre. Fiquei colado ali, e perplexo como todo mundo. Antes do meio-dia, atendi telefonemas (sabe Deus como conseguiram meu número) da Rádio Jovem Pan e da Folha de São Paulo, ambas com a mesma pergunta: A ficção científica previra algo assim? Falei que a FC propriamente dita não, mas escritores de techno-thrillers como Tom Clancy tinham chegado perto. E comentei, com certa imodéstia, que meu conto “Jogo Rápido” (em A Espinha Dorsal da Memória, 1989) também postulava um ataque a um “cartão postal” – neste caso, um grupo terrorista que arrancava e roubava a cabeça do Cristo Redentor. (Não eram terroristas políticos, eram terroristas estéticos, um grupo de milionários que colecionava cabeças de estátuas famosas do mundo inteiro).
Fantasioso, eu? De jeito nenhum, pensei, diante da TV onde as torres desmoronavam coreografadamente. Nos dias seguintes, li o depoimento do compositor Stockhausen, dizendo (e causando um tremendo escândalo junto à imprensa): “Aquilo foi a maior obra de arte que já existiu. Pessoas passam dez anos se preparando para um ‘concerto’, e no momento da execução morrem”.
Eu já havia escrito os dois parágrafos acima quando, pouco antes da meia-noite entre sábado e domingo passados (de 10 para 11 de setembro) terminei a leitura da coletânea de contos Saffron and Brimstone de Elizabeth Hand, e me surpreendi ao ver no fim do livro uma “Afterword” datada de 11 de setembro de 2006. Hand fala que alguns contos do livro foram inspirados por um amigo que ela julgou ter perdido no atentado ao WTC. O último conto do livro, “The Saffron Gatherers”, mostra San Francisco sendo destruída por um terremoto no momento em que o avião da protagonista decola (ela vê tudo lá de cima). Diz Hand que a história desse amigo se tornou “a personificação das minhas ansiedades: desejo e perda; a ameaça do apocalipse; o poder e a vulnerabilidade do artista; meu fracasso constante em criar alguma coisa a partir da tristeza e do desespero”. Foi só mais uma sincronicidade (me ocorre com frequência ler por acaso um livro em que surge a mesma data em que o estou lendo), mas acho que exprime o que os atentados de 2001 passaram a significar para muitos escritores e artistas em geral. A necessidade, e a impossibilidade, de fazer literatura e arte sobre uma catástrofe tão esmagadora.