Onças Rogel Samuel Alencar é cinematográfico. Estou relendo "O guarani". O livro começa por um "fio d'água". Alencar seduz pela leveza. Logo aparece uma cena "impossível": Peri caça uma onça preta com as próprias mãos. Perto de Manaus vivia um caboclo, caseiro meio índio, forte como touro selvagem. Certo dia uma jaguatirica, também chamada "gato do mato", do tamanho de um cão, caiu na armadilha para paca. O animal ficou entrelaçado de cordas pelo corpo, mal podia mover-se, mas arrancou-se dali. Ele ouviu aquilo, foi lá com a filha pequena. A onça conseguiu pular sobre a menina. Mas o animal estava de costas, entrançado de cordas. Ele o pegou para estrangular. Quando chegaram outros homens a onça estava ainda viva e, com as unhas da única pata livre, cortava o inimigo que quase morreu. Em Alencar, Peri enfrenta a onça preta. As onças pretas estão em extinção. Famosas. Na minha época só existiam no Norte. Meu amigo A., que viajou 40 anos pelo Amazonas, só encontrou uma, ele descendo um igarapé estreito, motor quase em silêncio, sobre um tronco de árvore caída, ao sol, ela. Deu marcha a ré. O animal voltou-se, soberano. Olhou com desprezo, voou como um pássaro, atravessou a margem. Conheci um "matador" de onças, velhote magro, vivia daquilo, no Careiro, perto de Manaus. Amarrava um porco, subia na árvore, ficava na espera. Nesta época digital estou relendo Alencar e falando de onça. Alencar é a Mata Atlântica. Alencar organiza a estória como a história do Brasil, que sai de sua obra inteira. Sente a floresta, que ele conheceu bem. Sem não me engano, ele veio, por terra, do Ceará ao Rio de Janeiro. Naquela época, uma epopéia, uma caminhada digna da coluna Prestes. Lula também fez a caminhada da cidadania assim. Meu amigo NL viajou com Lula pelo interior do Amazonas. Marta estava lá, também. Mulher bonita, a Marta. O guarani, ópera, filme, medieval, com direito a castelo, cavaleiro (Peri), donzela, rei. Alencar escrevia para o jornal, os romances saíam em seriados. Ele amava esse país de índios, negros e portugueses. É um escritor brasileiro. Veio, por terra, do Ceará ao Rio de Janeiro. Como Prestes. Minha amiga NG ficou furiosa com Lula porque em Manaus preparou-lhe um almoço com as próprias mãos e depois de comer Lula foi agradecer à cozinheira: "Companheira..." E deu-lhe um abraço. Ela é escritora, mas gosta mesmo é de ser elogiada na cozinha. Se você for almoçar lá e não elogiar a comida ela entra em depressão. Ou fúria. Seu livro x. está sendo traduzido na França. Prestes eu conheci, já muito idoso, em conferência no Fundão. Brizola também. Logo que voltou do exílio, em Nova Iguaçu. Brilhante orador, abriu e fechou o congresso do PDT. Voz metálica, imagem exata e exaltada. Conheci Juscelino, na Faculdade de Filosofia. E Lacerda. Só me faltou D. Antonio de Mariz, pai de Cecília.