O tresloucado Brasil contemporâneo

Cunha e Silva Filho

Sim. leitores, vivemos tempos bicudos em todos os aspectos da contemporaneidade. No Brasil, num exemplo digno de assinalar, é a questão do medo das pessoas que não podem mais andar no Centro de São Paulo, porque está infestado de bandidos de todos os lados.

O Centro de São Paulo, como disse uma mensagem de televisão, virou uma cidade fantasma, com lojas fechadas e o pavor dominante da bandidagem, cujo epicentro é a conhecida Cracolânida, repleta de gente contaminada pelo vírus das drogas, do traficante e das almas perdidas e abandonadas que caíram no desespero inaudito das diversas formas de drogas mortais ou que levam o indivíduo a se torna um verdadeiro zumbi. A velha "Pauliceia Desvairada" de Mário de Andrade ultrapassou a poesia e penetrou no Hades, no Inferno de Dante, num conto de Poe.

Nem a polícia consegue resolver a situação de horror da capital paulista, a maior cidade da América do Sul, que também já foi tema de um composição de Caetano Veloso. Até parece que São Paulo não tem governo nem uma solução governamental firme para debelar essa multidão de enfermos que me lembram um conto de Machado de Assis, vivido entre a atmosfera da insanidade humana transformada em normalidade, numa inversão ambígua em que o que é são se torna loucura ou vice-versa.

São Paulo é o retrato metoní,ico de um país arrasado pela ausência de sucessivos governo estaduais e, por tabela, de governos federais que, até hoje, não discutiram com seriedade e amplamente o seu maior problema: a violência ciclópica e atuante, cujas garras já se apoderaram das cidades brasileiras, sobretudo do eixo Rio-São Paulo. Contudo, as suas ramificações se espraiaram assustadoramente pelo país inteiro.

Ora, uma megalópole com São Paulo não pode dar um mau exemplo de um Brasil metonímico, repito. Que forças poderosas têm para prejudicarem o meio social têm o tráfico, as organizações criminosas, as rivalidades entre facções que parecem crescer como um uma metástase pelo país inteiro e nada se tem feito ou ainda não se teve a vontade de implantar políticas públicas que tratassem da questão tão vital quanto é a de se minimizar o grau de violência do país? Até parece que não dispomos de forças de segurança nacional à altura de voltar-se com bravura contra esse mal maior que atormenta a sociedade civil pelo país afora. Parece que o país já vive ostensivamente o mesmo nível de criminalidade que países como o México, a Venezuela, por exemplo.

A questão da violência brasileira tem solução se contarmos com o apoio interdisciplinar de sociólogos e antropólogos, junto com o aporte fundamental de todas as forças Policiais civis e militares, da Guarda Nacional e da Polícia Federal, inclusive das Forças Armadas. Isso não significa tornar as ações militares incompatíveis de solucionar conflitos sociais usando do autoritarismo das ditaduras que partem para o extermínio de seres humanos nocivos à normalidade da sociedade, porém a de implementarmos estratégias que impeçam a continuidade e a gravidade da vida normal das pessoas que circulam pelas cidades temendo de repente, serem assaltadas por facínoras e delinquentes.

Se o país não se debruçar profundamente sobre a questão da criminalidade, ele sofrerá as imprevisíveis consequências do caos social e dos enormes prejuízos na economia dos estados causados por esta espécie de terrorismo de criminosos que não mais temem a ordem jurídico-social do estado democrático de direito.

As leis brasileiras atuais devem ser modificadas com urgência tanto no Código Penal quanto na aplicação de sentenças a marginais perigosos que têm suas organizações pautadas na força e uso brutal de armamentos pesados e que, portanto, não se intimidam com as forças de segurança, sobretudo porque sabem que a impunidade é um dos fatores favoráveis à continuidade de práticas ilícitas em face da leniência e frouxidão das penas e dos recursos que o criminoso possui sabendo que não cumprirá a sentença porque a própria legislação penal lhes concede benefícios legais de comutação dos apenados.

São as chamadas brechas legais que o sentenciado têm a seu favor. Ora, isso tudo é um componente relevante que servirá a fim de estimular o marginal a continuar perpetrando novos crimes indefinidamente, pois não se intimidam diante do que podem praticar: ações ilícitas e sobretudo letais à sociedade.

O Rio de Janeiro está se tornando uma cidade igual a São Paulo ante o estado calamitoso da violência sem freios. Ora, um cidade como o Rio na qual proliferam favelas em todos os seus limites espaciais independente de bairros, exibe um nível de verdadeiras “cidades paralelas” governadas por traficantes e os chamados milicianos sempre atuando em refregas entre outra favelas pelo domínio do tráfico de entorpecentes ou de outros tipos de ações delituosas mandando e desmandando nos seus “territórios” tomados à força até que outros grupos de criminosos mais poderosos de facções rivais assumam o poder nestes redutos, onde também, infelizmente, vivem famílias decentes, formadas de trabalhadores que não dispõem de renda suficiente a fim de poderem mudar para bairros menos perigosos. Praticamente, em todas as favelas ou comunidades, para usarmos de um eufemismo isento de preconceitos, do ponto de vista da ordem social.

A continuarmos vivendo sob o domínio da violência galopante, sofrerão prejuízos incalculáveis o turismo nacional, o comércio, os serviços, a indústria e sobretudo a arrecadação de impostos governamentais prejudicando as administrações locais e toda a estrutura da máquina do Estado Brasileiro. Diante de tantos malefícios sociais provocados pela criminalidade, observo, no entanto, que esta questão de segurança nacional não é bem (nem nunca foi) ventilada pelo governo federal que, ao invés de primeiro ver os males sociais de nosso país, vai se juntar a líderes do G7, com todo o luxo de que se revestem esses encontros de Cúpulas.

Sei que o Brasil não pode se isolar do mundo civilizado, mas as questões socias sempre hão de ter a prioridade de um presidente da República que aspire a tornar o seu país um espaço continental onde a paz e o bem-estar da sociedade são o cerne de soluções a serem colimadas.