Sei que não estarei por aqui no tempo em que todas as evidências se comprovarem, todas as teses se confirmarem ou forem refutadas; todas as propostas aceitas ou negadas; todas as pesquisas ou estudos chegarem aos resultados pretendidos; todos os problemas culminarem numa solução; todos os conselhos acolhidos, sendo, os bons, convertidos em ação e os ruins, em reação; em que as luzes forem apagadas pelos últimos que saírem; quando, ainda em relação à luz, ela não for mais uma esperança, mas uma realidade ao fim do túnel.


 Em que os políticos passarão a ser menos hipócritas e demagogos; ninguém mais morrerá de fome nem será morto ou vítima de procedimentos violentos; não sofrerá de mal inusitado, de doença desconhecida ou incurável; nenhum homem deixará de ter aquilo de que mais gosta, deseja ou precisa por falta de condições de possuí-lo ou de obtê-lo.


Desejaria, apesar de saber ser isso uma quimera, estar ainda neste teatro quando somente os livros de história registrassem cenas de trabalho escravo e de degradação ambiental.


 Temo que não mais estarei neste plano quando os governantes, de fato, passarem a pensar no bem-estar dos governados, distribuindo de forma equilibrada a riqueza produzida; quando a igreja compreender que não é a única dona da verdade e, irretorquivelmente, aceitar que o Deus em que crê escreve certo por linhas tortas.


 Duvido de que esteja entre os vivos no dia em que a ciência declarar, taxativamente, que nós, realmente, descendemos do macaco e que o universo surgiu mesmo depois de uma explosão atômica.


 Imagino que me terei transformado em lembrança e ainda estaria distante o tempo em que não mais haveria exceções, preconceitos de qualquer natureza; todas as incertezas ou desconfianças estariam dirimidas ou solucionadas; os sonhos sonhados por cada um já seriam realidade ou se teriam esvaído, de vez, na ampulheta da história.


 Não tenho a menor hesitação em dizer que, não somente os anseios, medos, incertezas, descrença, ceticismo, vicissitudes, desejos, sonhos, previsões, augúrios; enfim, esperanças, continuarão existindo quando eu e você mudarmos de cenário ou nos formos, da mesma forma que já existiam antes de chegarmos.


 O que me leva a crer que nunca verei os homens preocupados, de verdade, com todos os seus semelhantes e com a vida no planeta em que vivemos como condôminos de um grande conglomerado residencial; que a ciência jamais se livrará - pois que sempre com ela concorrerão - das especulações, dos empirismos, das tentativas de contestá-la, contrariá-la.


 Essa certeza de que não vislumbrarei, nem todos nós, tampouco, um mundo perfeito, com todas as coisas em seus devidos lugares; um tempo em que a fé seja, de verdade, uma fonte inesgotável de integral apoio e sustentação para os crentes, e não um mero conceito escolástico – uma crença religiosa sem fundamento em argumento racional; enfim, em que nada mais restará por fazer ou esperar, vem do fato de acreditar que esse tempo não virá.


 Continuaremos sendo seres imperfeitos, vivendo e construindo um mundo imperfeito; acreditando e desacreditando em verdades, mentiras e mitos; sonhando maravilhas que depois se convertem em pesadelos e, vice-versa; sofrendo e usufruindo momentos espetaculares ou especiais, entremeados de outros nem tanto assim. Nosso destino, porto de chegada, cais, ou como queiram chamar ou traduzir, é sermos falíveis indivíduos, entes que cometem erros e que, para conseguirmos uma melhor forma de nos realizarmos existencialmente, devemos aprender a corrigir, pois que é impossível evitá-los, aqueles que, potencialmente, possam nos causar danos irreparáveis.


     Antônio Francisco Sousa – Auditor-Fiscal
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