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Miguel Carqueija

 

Resenha do romance “Another” (O Outro), de Yukito Ayatsuji. Editora JBC, São Paulo, 2015. Tradução de Edward Kondo. Capa de Shiho Enta. Título original “Another”, Editora Kadokawa Shoten, Tokyo, Japão, 2009.

 

            Não é comum a edição de romances japoneses no Brasil, mas muitos deles são a origem de séries famosas em mangá e animação, como por exemplo a admirável ROD, das manipuladoras de papel. Espero que a iniciativa da JBC, em lançar este “Another” — origem do mangá do mesmo nome — frutifique em novas iniciativas editoriais.

            “Another” é um terror escolar e o autor demonstra uma grande habilidade em concatenar os detalhes, em jogar pistas e amarrar as pontas após muitos capítulos. Foi necessário um grande esforço intelectual para que tudo batesse. A narrativa é feita na primeira pessoa (salvo alguns capítulos especiais intercalados, de diálogos) por Koichi Sakakibara, estudante de seus quinze anos que vai transferido para a Escola Ginasial Yomiyama do Norte, na cidade de Yomiyama, e é alocado na turma 3-3, uma estranha classe, onde todo mundo parece ter medo de alguma coisa, onde uma tensão misteriosa, mesmo entre os professores, ronda o ambiente, mas ninguém esclarece nada ao perplexo estudante. O que piora a situação é que Koichi é tímido, indeciso, e demora muito a tomar iniciativas. Isso é um pouco cansativo, pois se sucedem diversos episódios onde a situação “não ata nem desata” mas finalmente a ação engrena graças principalmente à garota Mei Misaki, fleumática e enigmática, ignorada pelo resto da sala.

            As características de Mei são tão estranhas que os leitores são tentados até a julgá-la um fantasma, uma aparição. O olho falso, a sua residência num local cheio de bonecas sinistras, tudo isso ajuda a compor um clima opresso, além é claro do ambiente na escola; e a situação vai se complicando com a ocorrência de várias mortes entre os alunos e pessoas que com eles se relacionam. Logo Koichi vai pouco a pouco tomando conhecimento da estranha maldição que acompanha a turma 3-3 há diversos anos, décadas na verdade.

            O romance poderia talvez apresentar um final diferente, já que falta um toque de romance que poderia surgir entre os dois protagonistas principais, isso porém foi uma escolha do autor. Outra coisa que me parece merecedora de ressalva está nas citações de obras, não encontrei nada japonês, apenas referenciais do Ocidente. Por exemplo, Stephen King. Isso a meu ver foi uma falha, pois o autor poderia fazer citações da cultura pop niponica, onde inclusive existem obras conhecidas de terror na literatura, quadrinhos e cinema.

            “Another” joga com a perturbadora hipótese de acontecimentos paranormais que interferem com o próprio tecido da realidade, o apagamento de dados das memórias e até dos registros. Os leitores potenciais da obra devem se preparar pois o texto, além de prender a atenção, causa perplexidade.

            Em tempo: o mangá foi editado no Brasil pela mesma editora e o animê também por aqui chegou. Existe também uma versão em imagem real feita para os cinemas.

 

Rio de Janeiro, 1° de setembro de 2016.