[Flávio Bittencourt]

O sinistro magnata das ferrovias Percival Farquhar

De acordo com Monteiro Lobato, ele foi mais do que isso: Farquhar teria sido um "clássico construtor de império".

 

 

 

 

 

 

 

 

Percival Farquhar construiu a Madeira-Mamoré (visitada por um grupo de autoridades em 1910)
Foto: Dana Merrill, divulgada na Internet

 (http://www.novomilenio.inf.br/santos/h0336.htm)

 

 

 

 

 

"FARQUHAR PODE TER SIDO SINISTRO, MAS INVESTIU PESADAMENTE NO BRASIL: MONTEIRO LOBATO O ATACAVA SEGUIDAMENTE, MAS, COMO ASSINALA C. GRAIEB, DA REVISTA VEJA, EM CERTO MOMENTO O GRANDE ESCRITOR PERCEBEU QUE O 'CLÁSSICO CONSTRUTOR DE IMPÉRIO' (capitalista) FOI EXTRAORDINARIAMENTE INTELIGENTE, AO APOSTAR NO LUCRO POSSÍVEL DA EXPLORAÇÃO DA MONUMENTALIDADE ECONÔMICA DO BRASIL, percepção, que, de resto, igualmente não escapou ao Rei da Bélgica, quando ajudou a que, em Minas Gerais, fosse construída a siderúrgica Belgo-Mineira [MAS ESSE NÃO É O ASSUNTO DO DIA, FICANDO PARA UMA PRÓXIMA OPORTUNIDADE]"

(COLUNA "Recontando estórias do domínio público")

 

 

 

 

"(...) Depois de sua queda e até morrer, em 1953, Farquhar continuou insistindo em investir no Brasil. Sua atenção voltou-se para a extração e exportação de minério de ferro em Minas Gerais, mas seus planos de fundar companhias mineradoras foram barrados por sucessivos governos. Apenas às vésperas da morte ele conseguiu pôr de pé uma empresa – a Acesita, que existe até hoje. Assim como ocorrera em sua primeira fase no Brasil, os esforços de Farquhar para explorar o ferro atraíram muita polêmica. Na década de 30, um de seus críticos mais ferrenhos foi o escritor Monteiro Lobato – o criador do Sítio do Picapau Amarelo. Anos mais tarde, contudo, Lobato mudaria de idéia. Num ensaio intitulado Farquhar e o Brasil, ele deixou de considerar o americano como um capitalista sinistro para descrevê-lo como um "clássico construtor de império", imbuído de um inabalável otimismo econômico. Uma visão bastante razoável sobre o personagem."

(CARLOS GRAIEB, revista Veja, reportagem transcrita adiante, na íntegra [PUBLICADA POR OCASIÃO DA EXIBIÇÃO DA MINISSÉRIE DA TV GLOBO MAD MARIA])

 

 

 

 

 

 

 

"CARLOS GRAIEB BEM LEMBROU QUE PERCIVAL FARQUHAR PERTENCE À GERAÇÃO IMEDIATAMENTE ANTERIOR À DE FIGURAS COMO VANDERBILT, MORGAN E ROCKEFELLER"

(COLUNA "Recontando...")

 

 

 

 

 

 

                                 QUANDO SE HOMENAGEIA TONY RAMOS,

                                 UM DOS MAIS COMPETENTES ATORES NO MUNDO, HOJE,

                                 QUE VIVEU, ESPLENDIDAMENTE, FARQUHAR

                                 NA MINISSÉRIE MAD MARIA (TV GLOBO) E

                                 O ESCRITOR MÁRCIO SOUZA, QUE ESCREVEU O

                                 ROMANCE DE MESMO TÍTULO - MAD MARIA -,

                                 UM LIVRO VERDADEIRAMENTE MAIOR, E

                                 AGRADECENDO A CARLOS GRAIEB (REVISTA VEJA)

                                 PELA REPORTAGEM QUE PRODUZIU, COM

                                 ENORME EFICIÊNCIA, SOBRE

                                 O MAGNATA ESTADUNIDENSE QUE FOI  BASTANTE

                                 FRIO, DISTANTE E "SINISTRO",

                                MAS ACREDITAVA NO BRASIL E NOS BRASILEIROS

 

 

 

21.5.2011 - Se Vargas Llosa já produziu romances sobre a Guerra de Canudos (Brasil) e Roger Casement (cuja atuação no Peru foi digna da sua dedicada atenção), a vida de Farquhar está à sua disposição - O homem ganhou o prêmio Nobel de Literatura, sendo que o homem de quem se fala não é P. Farquhar, mas Vargas Llosa, naturalmente. (PARA QUE SE SEJA BEM FRANCO, COMO VARGAS LLOSA NÃO É MAIS UMA CRIANÇA, TORCE-SE PARA QUE ELE ESCREVA LOGO SOBRE FARQUHAR, se ele endender que fazer isso vale o esforço de sua pesquisa e produção literária, maiores.)  F. A. L. Bittencourt ([email protected])

 

 

 

 

REPORTAGEM DE

CARLOS GRAIEB SOBRE

PERCIVAL FARQUHAR:

 

"Televisão


Uma locomotiva
da globalização

Percival Farquhar, o magnata
das ferrovias, foi muito mais
que o capitalista inescrupuloso
retratado na série Mad Maria


Carlos Graieb

 


Reprodução/Dana Merril
Trem da ferrovia Madeira–Mamoré: pouco lucro, muitas mortes

O americano Percival Farquhar (1864-1953) foi um dos grandes jogadores do mercado financeiro mundial nos primeiros anos do século XX. "Naquele tempo, eu podia levantar dinheiro para o que quisesse", disse ele ao seu biógrafo Charles Gauld, no final da vida. Não era uma bravata. Entre 1904 e a eclosão da I Guerra Mundial, Farquhar teve acesso livre aos maiores investidores da Europa e dos Estados Unidos e canalizou um enorme capital para ferrovias, portos, frigoríficos, companhias elétricas e de comunicações, loteamentos, fazendas. Não foi em sua terra natal que ele montou esses negócios. Foi no Brasil. Em 1913, ele controlava algo em torno de 50 milhões de libras, o que o tornava o principal administrador de recursos estrangeiros no país. A mais célebre – e polêmica – de suas realizações foi a Estrada de Ferro Madeira–Mamoré. Aberta na selva amazônica para dar cumprimento a um tratado entre Brasil e Bolívia e facilitar o acesso desta última ao Atlântico, a "ferrovia do diabo" foi uma insanidade: prodígio de engenharia que ligou o nada a lugar nenhum, como se disse na época, ela custou a vida de 1.500 trabalhadores e jamais deu o lucro esperado.


Divulgação
Reprodução
Tony Ramos como Farquhar (à esq.) e o próprio (à dir.): negociatas com austeridade quacre

Baseada no romance homônimo do amazonense Márcio Souza, a minissérie Mad Maria, que a Rede Globo exibe desde a semana passada, revive a epopéia dessa construção e dá destaque a Farquhar. O livro e a série tomam liberdades com o personagem e lhe reservam um papel de vilão. Márcio Souza o descreve como "um vigarista feliz na maré mansa nacional" e o ator Tony Ramos lhe conferiu o tique de esfregar sempre os dedos, como quem conta dinheiro. Mas Farquhar foi mais que isso. Mad Maria mostra o americano como alguém que passou da miséria à riqueza. Farquhar, na verdade, nasceu em família abastada e de boas ligações políticas. Formou-se em engenharia em Yale, uma universidade de elite. Na biografia The Last Titan, Charles Gauld associa à religião quacre traços de caráter como a austeridade e uma determinação férrea, que Farquhar exibia não só nos negócios: aos 89 anos, ele decidiu operar o cérebro para tentar suavizar a doença de Parkinson, de que vinha sofrendo.

O nascimento de Farquhar, em 1864, o torna uma geração mais jovem que figuras como Vanderbilt, Morgan e Rockefeller, os empreendedores (ou barões do roubo, para os detratores) que deram forma ao capitalismo americano na segunda metade do século XIX. Farquhar não ombreia com esses nomes lendários, mas o fato de ter voltado sua energia para a América Latina o torna uma figura especial. Nos últimos anos, tem-se formado um consenso em torno da idéia de que a primeira onda de globalização econômica ocorreu entre 1870 e 1914. Pesquisas recentes demonstram que, em alguns sentidos, o nível de integração econômica era maior que o de hoje. Logo antes da I Guerra Mundial, 50% da poupança britânica, por exemplo, estava investida no exterior, financiando obras de infra-estrutura. Os mesmos níveis eram observados em países como França, Alemanha e Bélgica. Taxas como essas nunca mais se repetiram. "A região mais exposta ao investimento estrangeiro foi a América Latina. Ela foi a mais beneficiada pelas forças externas do mercado de capitais, e também a mais vulnerável a elas", diz o economista americano Alan Taylor, autor de um estudo sobre a economia latino-americana na virada do século XX. Uma porção considerável do dinheiro aplicado na América Latina passou pelas mãos de Farquhar. Ele foi, por assim dizer, um agente da globalização.

Antes de chegar ao Brasil, em 1904, Farquhar fez ferrovias em Cuba e na Guatemala. Suas primeiras obras nacionais foram no Rio de Janeiro – ele criou sistemas de bonde, eletricidade e comunicação (incidentalmente, criou também os guias telefônicos por sobrenome; antes, as listas eram caóticas). Depois investiu na Bahia, no Pará e no Acre, em São Paulo e no sul do país. Tornou-se um inveterado colecionador de ferrovias, como disse um observador de seus negócios, embora não se restringisse a isso. A expansão do Sindicato Farquhar, como se dizia então, despertou três tipos de oposição: a dos concorrentes, como a família Guinle, que disputava muitos dos mesmos contratos; a dos nacionalistas rábidos, que denunciavam a "invasão do ouro ianque"; e a daqueles que se inquietavam com possíveis negociatas. "A política e os negócios estão inextricavelmente ligados no Brasil", disse Farquhar certa vez. E ele aprendeu a jogar o jogo, conquistando (e, ao que tudo indica, comprando eventualmente) aliados no Congresso e no jornalismo – como o futuro magnata da imprensa Assis Chateaubriand. Farquhar manteve uma discrição quacre sobre os bastidores de seus negócios. Só parece ter se irritado com os políticos baianos, a quem chamou de "corruptos, inconfiáveis e instáveis".

Os empreendimentos de Farquhar murcharam quando o grande fluxo internacional de capitais cessou, no começo da I Guerra. "Foi um período de queda generalizada nas ações de ferrovias, em face do aumento dos custos operacionais", lembrou ele mais tarde. Para piorar a situação, todas as suas apostas fora do campo ferroviário – em gado, madeira, terras ou portos – fracassaram. Seus negócios estavam mal estruturados. O administrador de sua concordata, em 1914, descreveu a situação como uma "bagunça trágica" e sentenciou: no afã de se expandir, Farquhar se esquecera de garantir os recursos necessários para a operação e a manutenção dos negócios.

Depois de sua queda e até morrer, em 1953, Farquhar continuou insistindo em investir no Brasil. Sua atenção voltou-se para a extração e exportação de minério de ferro em Minas Gerais, mas seus planos de fundar companhias mineradoras foram barrados por sucessivos governos. Apenas às vésperas da morte ele conseguiu pôr de pé uma empresa – a Acesita, que existe até hoje. Assim como ocorrera em sua primeira fase no Brasil, os esforços de Farquhar para explorar o ferro atraíram muita polêmica. Na década de 30, um de seus críticos mais ferrenhos foi o escritor Monteiro Lobato – o criador do Sítio do Picapau Amarelo. Anos mais tarde, contudo, Lobato mudaria de idéia. Num ensaio intitulado Farquhar e o Brasil, ele deixou de considerar o americano como um capitalista sinistro para descrevê-lo como um "clássico construtor de império", imbuído de um inabalável otimismo econômico. Uma visão bastante razoável sobre o personagem.

(http://veja.abril.com.br/090205/p_100.html)

 

 

 

 

 

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"Intelectuais criticam presença de Vargas Llosa em feira argentina

Escritor foi escolhido para inaugurar Feira Internacional do Livro de Buenos Aires, que acontece de 20 de abril a 9 de maio

AFP | 02/03/2011 09:54

 

Foto: AP Ampliar

O escritor Mario Vargas Llosa

Intelectuais ligados à presidente argentina, Cristina Kirchner, criticaram a escolha do peruano Mario Vargas Llosa, prêmio Nobel de Literatura em 2010, para inaugurar a Feira Internacional do Livro de Buenos Aires, que acontece entre 20 de abril e 9 de maio.

"Gostaria que ele não estivesse presente na abertura da Feira do Livro. Seu liberalismo é expressado de maneira taxativa e diria que, se me permite o paradoxo, autoritária também", disse o diretor da Biblioteca Nacional, Horacio González.

O secretário de Cultura, Jorge Coscia, disse que não concorda com a tentativa de proibição, mas criticou Vargas Llosa. Coscia chamou o peruano de "reacionário, inimigo das indústrias culturais e útil a um sistema de dependência cultural na América Latina".

"Parece-me válido que os intelectuais tomem partido. No que não estou de acordo é na proibição", declarou.Aurelio Narvaja, da editora Colihue, também pediu a retirada do convite a Vargas Llosa para a abertura da Feira em 20 de abril, apesar de considerar o peruano merecedor do Nobel.

"Cristina Fernández é um desastre total. A Argentina está conhecendo a pior forma de peronismo, populismo e anarquia. Temo que seja um país incurável", afirmou Vargas Llosa recentemente ao jornal italiano Corriere della Sera. Ao jornal espanhol El País, o autor de "Pantaleão e as Visitadoras" afirmou que Cristina Kirchner e o falecido marido, o ex-presidente Néstor Kirchner, são 'capitalistas exemplares que conseguiram multiplicar sete vezes seu capital'. "

(http://ultimosegundo.ig.com.br/cultura/livros/intelectuais+criticam+presenca+de+vargas+llosa+em+feira+argentina/n1238125130499.html)

 

 

 

 

 

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FARQHUAR NA HISTORIOGRAFIA - E ESTORIOGRAFIA - SANTISTA

(CIDADE DE SANTOS, ESTADO DE SÃO PAULO, BRASIL)

"HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS
Farqhuar... as Docas e a Madeira-Mamoré (A)

CDS, sediada no Rio de Janeiro, participou da luta nacionalista anti-Farqhuar

Pouco antes de rebentar a Primeira Guerra Mundial, um empresário nascido em 19/10/1864 em York, no estado norte-americano da Pennsylvania (e que morreria em 4/8/1953 em New York), Percival Farquhar, investia pesadamente no Brasil, assumindo o controle de diversos serviços estratégicos, como os dos transportes e os portos (e até da Companhia Guarujá, que em 1911 continuou a construção desse balneário paulista). Foi ele um dos grandes responsáveis pela construção da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, pouco antes de uma onda nacionalista e grandes azares financeiros forçarem a sua saída do País.
 

Nessa questão, pelo lado nacionalista, figurou em destaque a Companhia Docas de Santos (CDS), construtora e administradora do porto santista, como foi relatado por Hélio Lobo, em seu livro Docas de Santos - Suas origens, lutas e realizações (Typ. do Jornal do Commercio - Rodrigues & C. - Rio de Janeiro/RJ, 1936 - exemplar no acervo do historiador Waldir Rueda) - ortografia atualizada nesta transcrição:

Percival Farquhar construiu a Madeira-Mamoré (visitada por um grupo de autoridades em 1910)
Foto: Dana Merrill, divulgada na Internet

CAPÍTULO LII
A Fase Farquhar

Nenhum movimento de opinião, envolvendo a Empresa de Santos (N.E: a Companhia Docas de Santos - CDS), sobreleva nesse período ao que se relacionou com as chamadas concessões Farqhuar.

Engenheiro, industrial, grande manejador de capitais, planejou Percival Farqhuar, para nosso país, uma empresa gigantesca. Não é deste papel o estudo de tal empresa, os fins a que obedecia, os móveis em que se inspirou. De dizer, sim, é que nasceu com ela violenta campanha na imprensa carioca, deturpando-se quiçá a inspiração realizadora, para fazê-la aparecer sob os trajes de um colossal manejo de absorção de nossas fontes de riqueza.

Davam-lhe as aparências, cumpre dizer, esse aspecto. De Norte a Sul, de Leste a Oeste - estradas de ferro, portos, campos de criação, o melhor aparelho industrial do Brasil -, articulavam-se numa vasta organização estrangeira para exploração do solo: a Madeira-Mamoré, os portos do Pará, Rio de Janeiro, Paranaguá e Rio Grande do Sul, as estradas de ferro Paulista, Mogiana, São Paulo-Rio Grande, a rede de viação do Rio Grande do Sul. A impugnação incluiria também a luz e força no Rio de Janeiro e São Paulo, que Farquhar negou estivessem no seu plano.

Do último trimestre de 1912 ao primeiro de 1913 andou exaltado o nacionalismo brasileiro. Havia Alberto Torres dado alarme com palavras que não seriam só para aquela época, senão exprimiam um quadro de impressionante realidade nos anos vindouros, ao descrever nosso fatalismo e nossa falta de organização, sem esforço construtivo nem vibração cívica, com injustiça até à gente boa, que é a nossa [1].

Estávamos, nas suas expressões, sendo invadidos "por uma formidável organização financeira admiravelmente combinada, com raízes profundas e poderosas ramificações e por outras não menos perigosas", entregue o Brasil, desde os municípios até o Governo Federal, "aos caprichos e leviandades de administradores ignorantes de nossos interesses reais, de nossos problemas práticos e dos riscos da nossa posição na política mundial".

Havia o Estado do Pará cedido cerca de 60.000 quilômetros quadrados à Amazon Land Colonisation, enquanto em Mato Grosso, em terras que se diziam também de fronteira, passava o solo a mãos forasteiras. Na Câmara Calógeras falou contra, - "doação incauta, na frase do Paiz (N.E.: jornal da então capital federal, Rio de Janeiro), no dia imediato da nossa terra aos primeiros solicitantes, sem reflexão nem exame de todos os perigos que semelhante procedimento acarreta" (21 de outubro de 1912).

E embora a Amazon Land desistisse e o Governo do Estado explicasse não se tratar de terras de fronteiras (havia ali, no seu dizer, 1.850.000 quilômetros quadrados de área, dos quais só 300.000 explorados e os restantes 850.000, inteiramente abandonados, não tinham população alguma), a campanha não diminuiu.

"Brasil, colônia tropical da Light", era o grito de um. "Nova Turquia", tal a exclamação de outro. "Nuvem negra", eis o protesto de terceiro. Na impugnação sobressaiu-se a Gazeta de Notícias. "Falhou a tentativa em Buenos Aires". "As arapucas da Traction e a Imprensa Estrangeira", "O Farquahrismo em Londres, o Farqhuarismo aqui", foram algumas epígrafes de oposição, às quais corresponderam, no mesmo jornal, contra a empresa Canadense e o grupo Farquhar, as escaramuças de Alberto de Faria, com títulos não menos soantes: "Temor, medo, sim!", "A Moral de Wilson", "O trust é o inimigo". Faria escreveu:

"Aqui, um sindicato, ou antes, um homem detêm em suas mãos todos os meios de transporte de mais de metade da população brasileira, atravessa-se na entrada dos nossos melhores portos, monopoliza os tramways (N.E.: bondes), a luz, a força na Capital e em várias cidades, obtém de uma assentada e grátis 60.000 quilômetros quadrados no Pará, na fronteira, enfim (para antecipar o futuro de três a cinco anos, apenas) fica dono, senhor, possuidor ou usufrutuário de todo o Brasil! E todos se calam!

"Não cansados de dar do mundo os mais tristes espetáculos, vamos oferecer este, com os seus perigos e humilhações, - uma nação de 25 milhões de homens enfeudados ao Sr. Farquhar [2]".

De Paris, onde então se achava, explicou este seu pensamento, surpreso diante dos desígnios que lhe emprestavam. Não era um novo no Brasil, pois desde 1905 aqui estivera, tendo sido convidado desde 1904 para ocupar-se com a Port of Pará e desde 1907 tomara posse da São Paulo-Rio Grande. O futuro do país, suas riquezas inexploradas, a articulação a fazer-se entre rios, portos e vias-férreas, em bem da produção e de sua movimentação, fê-lo decidir-se por nosso lado, em vez da Argentina, onde o chamavam também grandes interesses, ou de Cuba e América Central, onde havia já instalado mais de uma indústria.

País imenso, de profunda dispersão econômica, o Brasil precisava ter estreita ligação ferroviária e de portos; ao Sul, para suas necessidades com o Prata; ao centro, para o escoamento das regiões bolivianas e paraguaias; ao Norte, para o escoadouro sobretudo da Amazônia, tudo com tarifas baixas, que permitissem no interior a troca necessária e no exterior facilitassem o escoamento, uma vez que mau era o prognóstico econômico geral, e a borracha, de situação já inquietadora, ia desaparecer diante das plantações do Oriente. Para essa obra, já nos havia trazido cerca de 45 milhões de libras esterlinas.

Com relação ao Sul e depois de referir-se ao pesadelo da barra do Rio Grande, por ele vencido: "Não entrou em tudo isso como agente financeiro para obter a garantia de juros do Governo. Teve o sonho de ver ainda em seus dias o começo de uma grande civilização, a formação de uma imensa riqueza, como viram na Argentina homens de outras nações que ali levaram capitais para preparar o desenvolvimento estupendo daquele país. Quanto mais rápido o desenvolvimento, mais depressa ficará livre o Tesouro do peso da garantia de juros. Para isso, procurou fazer o que se faz nos Estados Unidos. Criar elementos de tráfego..."

Com relação ao Norte: "Acusam-no de querer fundar impérios procurando obter concessões e compras de grandes extensões de terras. Já disse qual foi seu intuito no Sul do Brasil. No Norte visava o problema da fixação de trabalhadores, pois o que existe nas populações da região da borracha é a população nômade, que vai e vem do Ceará e do Rio Grande do Norte. O que visava era que houvesse uma grande região amazônica salubre, onde os trabalhadores pudessem fixar suas famílias, onde se pudesse produzir carne e cereais, que o Amazonas importa de vários países. No mundo há companhias possuindo enormes extensões de terra. A Canadian Pacific recebeu do governo 27.710.400 acres e na Argentina a Florestal Land possui 1.154.368 acres".

Concluindo: "Só a reunião de uma grande rede ferroviária, composta de estradas de ferro que não são concorrentes entre si, pode permitir facilidades de tráfego e de tarifas. Grande número de companhias americanas possui 15 mil e mais quilômetros. E não há razão para que o Brasil não possa ter um dia empresas dessa importância.

"Realmente essa obra é grande, mas é o forte encanto de sua vida e é de molde a encher mais que uma vida... Como estrangeiro, não espera glórias, mas está certo que no futuro, quando não mais existir, ver-se há que ninguém foi mais amigo do Brasil, nem trabalhou com mais fervor por seu progresso e seu grande porvir [3]".

Belo sonho, na verdade, que o meio, as circunstâncias não permitiram realizar. Nossas deficiências e exaltações, as notórias lacunas da educação política e econômica brasileira, o pouco interesse, desde os primeiros anos, que mostramos sempre pelas questões concretas da nacionalidade, a posição geográfica, tudo concorreu para adiar a solução desse problema fundamental sempre esquecido - a articulação material do país em nossas bases duradouras. E nos vingamos dessa inferioridade, malsinando aos que, arriscando tudo, trazem para aqui seu esforço e seu dinheiro.

Dando a público as palavras de Percival Farquhar, escreveu o Jornal do Commercio algumas breves, pertinentes palavras. O de que precisávamos, na sua opinião, era de esforço intelectual e moral, de educação sob todas as formas. A exploração de nossos recursos pelo estrangeiro devia-se à nossa fraqueza; e se soubéssemos ser atilados, ela só nos traria benefício.

A que se deve o imenso progresso da União Americana, senão ao capital de fora? Na Argentina, com mais de 35.000 quilômetros e vias férreas, somente duas linhas das 26 existentes e representando apenas 3.600 quilômetros não eram estrangeiras. Nada mais perigoso, por outro lado, que alienar terras em grandes extensões, mas ainda aí, como nos Estados Unidos da América, onde a Northern Pacific obteve cerca de 47 milhões, a Atlantic Pacific cerca de 17 milhões de geiras, as cautelas oficiais e individuais faziam redundar tudo em benefício nacional:

"E a propósito disto observaremos, de passagem, um fato que o próprio Sr. Farquhar poderia ter alegado e que importa ao nosso ponto. Ele não foi o concessionário feliz de nenhuma das muitas linhas férreas ou portos que explora, mas as tem ido comprando com os meios que os capitalistas fascinados pelas suas combinações ousadas, pela sua confiança no futuro do Brasil, lhe têm suprido para esse fim. Foi assim que comprou a propriedade dos contratos do porto do Pará, do Rio Grande do Sul e desta cidade. Foi assim que comprou a concessão da Madeira-Mamoré, dada a um brasileiro; as ações da São Paulo-Rio Grande, possuídas por outro brasileiro, etc.

"Não diremos que as ações de empresas nacionais sejam vendidas a estrangeiros ricos que ofereçam mais que outros nacionais, mas não vemos meio prático, legal de impedi-lo e acrescentamos que não vemos perigo nessa aquisição por estrangeiros, desde que tenhamos leis e juízes dignos do nome e um Governo inteligente e vigilante, que salvaguarde os interesses nacionais de qualquer incursão desses anonimatos".

Para esse movimento de opinião concorreram as Docas de Santos, porque, recusando-se entrar no consórcio, representavam, de certo modo e honrosamente, o esforço nacional em antagonismo ao de fora. Depois, pela luta que vinham tendo, eram bem a mostra de quantos empecilhos graves se levantavam no país às necessidades de seu progresso, o que, pelo contrário, lhes avultava o esforço.

Cândido Gaffrée, já falecido Eduardo P. Guinle, opôs só a resistência, elevando as ações a setecentos mil, os mesmos pelos quais recusaria, depois, quase um conto de réis. Nos jornais do tempo, apareceu este episódio numa guerra diária de ineditoriais, porque azado era o momento, pelo menos numa única vez, de realçar uma instituição nacional até então maltratada por parte da opinião. No próprio Estado de São Paulo havia-se escrito (Tribuna, Santos, 19 de julho de 1910):

"Agora imagine-se a força irresistível e esmagadora desse trust, dentro de alguns anos, quando toda a sua vasta operação se vir realizada. Pense-se que ele chegue um dia a acaparrar as Docas de Santos e calcule-se como tudo lhe ficará sujeito em toda a maior e mais rica parte da República Brasileira. São todas as estradas de ferro do Sul, numa rede colossal, abrangendo São Paulo, Minas, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande nas suas mãos, com os portos a que elas conduzem".

Foi quando se saiu Osório de Almeida, meses a fio, sob pseudônimo [4], com o seu "Caso que não foi e que não é sério", reduzido depois a volume [5], a propósito do arrendamento da Sorocabana e Ituana; e também no Club de Engenharia, a propósito dos capitais estrangeiros.

Ali se analisava a administração paulista do acordo; aqui se punha em confronto a obra de engenharia nacional em face da estrangeira, com Mauá, "a quem se deve a primeira via férrea do Brasil, a instalação do primeiro tramway nesta capital e muitos grandes estabelecimentos industriais que seu cérebro privilegiado ideou e a sua tenacidade, o seu tino e a sua atividade realizaram"; com Mariano Procópio "levando avante a construção da estrada de rodagem União e Indústria, calcada nos melhores modelos de estradas da Velha Europa"; com o saneamento do Rio de Janeiro, espantalho dos estrangeiros, sobre que se consultaram as maiores sumidades de além-mar, como Parkes em Londres, Max von Pattenkoffer em Berlim, e que, entretanto, ficou resolvido por Oswaldo Cruz, na companhia de homens eminentes como Lauro Müller e Francisco Pereira Passos, sob Rodrigues Alves; com a própria Central do Brasil, cuja engenharia só na primeira seção (Rio-Belém) foi de importação, construindo-se toda por homens como Honorio Bicalho, Oliveira Bulhões, Sobragy, Eugenio de Mello, Burnier, Lobo Leite etc.; finalmente, com as obras do cais de Santos, as quais "realizadas por nacionais, com capitais também brasileiros, aliadas às obras de saneamento projetadas e construídas por engenheiros nacionais, transformaram a cidade, de insalubre, de foco de irradiação de epidemias, em verdadeiro sanatório do Estado de São Paulo" [6].

Foi quando Alberto de Faria também escreveu pela Empresa, em pseudônimo primeiro, sob seu nome depois, contra uma ação da São Paulo Light & Power para restituição de capatazias; contra as concessões Farquhar; e, por fim, contra o pedido de um cais, feito pelo Estado de São Paulo. Sua pena era ágil, combativa, penetrante sem deixar de ser cortês, profunda sem cair em injúria. Consolidou então Alberto de Faria sua reputação de polemista, abrindo-se-lhe primeiro a Diretoria da Empresa, e depois, com a vida de Mauá, as portas da Academia Brasileira.

Havia escrito "Um acionista", e era ele (Jornal do Commercio, 20 de outubro de 1912):

"Estamos fazendo os maiores sacrifícios pecuniários para organizar a defesa do solo; armamos soldados e artilhamos fortalezas, compramos dreadnoughts e municiamos a maruja, e depois inutilizamos tudo isto, concentrando nas mãos de um homem, um estrangeiro, todas as outras forças de resistência.

"A cabotagem, que subvencionamos e privilegiamos como reserva da marinha, já lhe está quase nas mãos. As estradas estratégicas, construídas a peso de ouro, são dele.

"Dos portos, escapará Santos.

"Transporte, luz e energia elétrica nas grandes cidades, tudo pode ser paralisado ao seu aceno.

"Em cada fronteira, léguas e léguas de terra, superfícies maiores que muitos países, já lhe pertencem.

"Quem não sente o perigo?".

Ao que correspondeu a voz de "Outro acionista", evidentemente com a mesma pena e tinta (Jornal do Commercio, 22 de outubro de 1912):

"Que sejam as Docas obrigadas ou não a exibir seus livros; que tenham ou não o direito de cobrar capatazias; que sua conta de capital seja de tanto ou de quanto; tudo isso é inteiramente secundário diante do inapreciável serviço, que estão prestando, de fazer face à invasão do território nacional pelo estrangeiro".

Havia o articulista falado de Portugal, "essa desgraçada Pátria dos nossos defeitos e nossas qualidades" e motivo foi para que "Um acionista português" alegasse ser de portugueses parte do cais, pois que tinham estes ali suas economias, quando o Banco da República abriu crédito à concessão (Jornal do Commercio, 26 de outubro de 1912):

"Sim, não esqueçam, vocês, isto: com que dinheiro foi então feito o primeiro trecho do cais, cuja renda deu depois para a construção do resto, senão com os cobres do Banco do Brasil, que o falecido Diogo franqueou, como coisa sua, à Diretoria da Docas?

"E de quem eram essas quantias lá depositadas, por sinal que alguma se evaporou depois, senão do comércio português?

"Porventura, os ingleses, os alemães, os franceses, e mais estrangeiros tinham lá contas-correntes?

"Dos brasileiros nem é bom falar, são todos doutores, mas em matéria de cobres estão sempre a tinir. E então, naquele tempo, em que o trabalho nacional ainda não estava valorizado pelo protecionismo...

"Não! reconheçam a verdade. Nós portugueses, concorremos muito para aquela grande obra, e não é para sermos agora tratados de 'filhos da desgraçada pátria dos nossos defeitos e das nossas qualidades', assim como quem diz: 'Meu pai era um grande pedaço de judeu'".

E nesse tom, ora grave, ora leve, seguiu a polêmica. Estes confiavam na Empresa, mas urgia providenciar: "O Sr. Gaffrée resiste; muito bem. Sua têmpera rija é uma garantia. Mas habituados a triunfar à la longue, ele confia demais na sua estrela". Aqueles se assustavam com certos recursos da defesa: "Pedimos às Docas de Santos, em nome de grandes interesses que nelas temos, que não permitam ao seu advogado continuar na defesa que lhes está fazendo. Com tal defesa, nossas ações vão por água abaixo..." Ao passo que terceiros, sob o título "Acuda-nos Sr. Gaffrée!", se alarmavam, pois sendo a cotação das ações de 750$000, estavam sob a ameaça de devolução caso vingasse a ação judiciária da São Paulo Light.

Ao que respondeu, ainda sob pseudônimo, Alberto de Faria (Jornal do Commercio, 25 de outubro):

"Escuta Zé: o Sr. Gaffrée não me leva assim facilmente pela mão. Se ele te leu, e se me ler agora, dirá lá com os seus botões: 'Sempre o conheci meio ingovernável'.

"Tranquiliza-te, Zé. De todas as lutas, as Docas têm saído cada vez mais fortes, com dividendos maiores e com cotações mais altas. Para as Docas, cujos contratos são sérios e são seriamente executados, a discussão ou com o Governo ou perante os Tribunais é um bom exercício: dá saúde e dá muque, como se diz em linguagem de sport".
 


NOTAS DE RODAPÉ

[1] "A situação atual do Brasil é uma injustiça a seu povo e uma calúnia a seu espírito e a seu caráter; o povo brasileiro está sendo vítima de resultados de coisas artificiais, políticas e administrativas; não tem o Governo que merece; não conhece a realidade de sua vida pública; não sabe a história exata dos atos e responsabilidades de seus homens; vive embalado em um delírio de retórica, de literatice, agitando entre manejos e chicanas da política de corrilhos tonto, em meio das festas, dos banquetes, das ovações, com que, todos os dias, se celebra a apoteose dos semi-deuses de nomeada". Alberto Torres, Nação ou Colônia?, no Jornal do Commercio, 23 de outubro de 1912.

[2] No Jornal do Commercio, de 19 de outubro de 1912.

[3] No Jornal do Commercio, de 23 de dezembro de 1912. Ler ainda mostras de sua fé em trechos como este: "As estradas de ferro que construiu quase no deserto é que não podiam esperar a ação lenta e danificadora do tempo, do sol e das chuvas. Comprou 225 mil hectares de terras cobertas de pinheirais e outras madeiras. Fundou duas serrarias-modelos. Fez estudar quanto era preciso para conhecer e evitar as causas que faziam o pinho paranaense ser refugado". Ou ainda: "Vê agora que o acusam de querer esses 900 novilhos e o gado comprado para cruzamento, para fazer o monopólio da carne. Achava que o Brasil devia aspirar a produzir gado, que não só barateasse o mercado interno, como chegasse para a exportação. A prova de que era esse seu pensamento e que cuidou da organização de matadouros frigoríficos e fábricas acessórias, para o aproveitamento de todos os produtos do gado. Para sua organização, estudava o modelo de Chicago, superior ao de Buenos Aires".

[4] Jornal do Commercio, 23 de julho de 1912 e seguintes.

[5] Um caso que não foi e não é sério. Rio de Janeiro. Tip. do Jornal do Commercio de Rodrigues & Cia., 1913, 2 volumes.

[6] Sessão do Conselho Diretor, de 24 de dezembro de 1912. No Jornal do Commercio, de 26 seguinte.

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 Farqhuar... e a ferrovia na Serra do Mar (B)

Capitalista pretendia criar uma ferrovia na Serra do Mar, mas foi bloqueado

Pouco antes de rebentar a Primeira Guerra Mundial, um empresário nascido em 19/10/1864 em York, no estado norte-americano da Pennsylvania (e que morreria em 4/8/1953 em New York), Percival Farquhar, investia pesadamente no Brasil, assumindo o controle de diversos serviços estratégicos, como os dos transportes e os portos (e até da Companhia Guarujá, que em 1911 continuou a construção desse balneário paulista). Foi ele um dos grandes responsáveis pela construção da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, pouco antes de uma onda nacionalista e grandes azares financeiros forçarem a sua saída do País.
 

O grupo Farquhar pretendia também criar uma ferrovia própria na Serra do Mar, ligando o porto santista à capital paulista, em concorrência direta com a São Paulo Railway. Manobras conjuntas da SPR e do governo brasileiro acabaram inviabilizando a operação, como já se pressentia nesta matéria, publicada na primeira página do jornal santista A Tribuna, edição de segunda-feira, 13 de janeiro de 1913 (ortografia atualizada nesta transcrição):

Imagem: reprodução parcial da matéria original

A S. Paulo Railway e o sindicato Farquhar

O malogro das negociações que tinham sido entabuladas para a absorção, pelo sindicato Farquhar, da São Paulo Railway, está sendo discutido vivamente e com o maior interesse nos meios financeiros de Londres.

A entente feita entre o governo do Brasil e a S. Paulo Railway, segundo se diz, é para que esta possa construir uma nova linha destinada a fazer concorrência à rede da Brasil Railway.

Aos escritórios da S. Paulo Railway acorreram numerosas pessoas, entre elas muitos jornalistas, a pedir informações seguras sobre os boatos que, a respeito, corriam na City.

Os diretores da empresa respondiam vagamente, não desmentindo os boatos da entente, mas mostrando-se, sobre os restantes boatos, de uma reserva extrema.

A opinião geral nos centros financeiros era de que o projetado acordo entre o governo do Brasil e a S. Paulo Railway seria favorável à rede ferroviária desta companhia e constituiria um sério obstáculo aos projetos do sindicato Farquhar.

Outro telegrama de Londres diz que as ações da S. Paulo Railway caíram de sete pontos, ficando cotadas a 259, em conseqüência de vendas mandadas efetuar por especuladores que as haviam comprado na expectativa de que o sr. Farquhar adquirisse o controle dessa companhia.

A campanha recente feita no Brasil contra os interesses do grupo à cuja testa se acha o sr. Farquhar amedrontou os especuladores; esse estado de espírito tornou-se mais intenso anteontem com o boato de que o governo brasileiro havia feito um contrato com a S. Paulo Railway para que esta última construísse uma nova linha, enfraquecendo assim o valor da concessão Farquhar.

Não se declara qual o traçado dessa nova linha, mas é dado como certo que ela vai atravessar uma zona remuneradora, e que o custo da sua construção será feito parte com elementos tirados do fundo de reserva da S. Paulo Railway e parte por uma nova emissão.

Não se conhece qual a natureza do auxílio prestado pelo governo à Companhia.

É digno de notar que diversos indivíduos preponderantes do grupo Farquhar, que haviam tomado passagem para a América do Sul, mandaram anular os seus bilhetes de passagem.

Com relação à situação financeira do projeto Farquhar na República Argentina, os corretores compraram hoje, prontamente, a 98 por cento, notas da Argentine Railway Company, de juro de 6 por cento e resgatáveis dentro de 2 anos, no valor de £ 1.500.000, sendo com esse dinheiro paga toda a dívida flutuante dessa Companhia."

(A: http://www.novomilenio.inf.br/santos/h0336.htm

B: http://www.novomilenio.inf.br/santos/h0336b.htm)