Miguel Carqueija

Há muitos anos atrás. Algo que me ficou na memória.

Quando eu era criança, ou no início da adolescência, meu irmão José, quatro anos mais velho, resolveu ensinar-me a usar shampu, mostrando-me, no banheiro, como fazia. Note-se que eu, como todas as crianças, em mais novo era banhado por minha mãe, e ela não usava shampú na minha cabeça, mas sabonete normal. Quando passei a tomar banho sozinho continuei com esse hábito. Ninguém tinha o hábito do shampú; o José com certeza o adquiriu por conta própria ou por influências externas.

De qualquer modo ele pegou um frasco cheio de shampú. Abriu e começou a aplicar, em grande quantidade. Sei que aplicou, lavou e tornou a aplicar. Fui logo ficando espantado pelo desperdício evidente que se patenteava à minha frente. Muito tímido naquela idade creio que não protestei, mas o fato é que, no fim, o José havia gasto quase todo o frasco. E eu fiquei imaginando que, se ele quisesse terminar o pote em outra lavagem, teria de completar com outro. A terceira lavada ficaria no segundo pote ou já faria abrir o terceiro?

Este incidente deve ter contribuído para que eu firmasse meu temperamento econômico. Jamais seria um esbanjado. E assim eu fui um sujeito parcimonioso pelo resto da minha vida.

Eu devia, portanto, estar prosperando. Infelizmente, ao longo da vida, pessoas de minha família (e até, às vezes, algumas amizades) fizeram-me gastar dinheiro, inclusive além da conta, levando-me a entrar no círculo vicioso das dívidas.

O que eu não teria gasto por mim mesmo gastei por causa dos outros.

O resultado aí está: vou chegando ao limiar da velhice, quase de pires na mão...