[Maria do Rosário Pedreira]

Espero que tenham tido umas boas festas, mesmo que o clima do País não esteja para grandes alegrias. O melhor, contudo, é levantar a cabeça e encarar 2013 com coragem e, claro, bons livros, que esses não hão-de faltar. O que ando a ler devo-o a dois comentadores deste blogue, Anabela F. e Mário Rufino (desculpem se me esqueci de mais algum), que aqui o aconselharam; e é uma obra estranha, inclassificável e absolutamente imperdível (mas às vezes tão perturbadora que temos de fazer, aqui e ali, uma pausa para recuperar o fôlego). Trata-se de uma espécie de romance gráfico e autobiográfico, considerado um dos livros do ano pelo New York Times, que tem por subtítulo Uma Tragicomédia Familiar,embora a vertente comédia me tenha parecido bastante negra. A sua autora,  Alison Bechdel, é sobretudo conhecida como ilustradora e autora de BD, embora mantenha um diário desde os dez anos, que lhe serviu, de certa forma, para compor esta maravilha que é Fun Home, não traduzido na edição portuguesa porque este "fun" é também a abreviatura de "Funerária", uma vez que a personagem central - o pai de Alison - dirige o negócio de gatos pingados da família, ao mesmo tempo que lê Proust e Joyce, vive obcecado pela jardinagem e pela decoração da casa, é tremendamente exigente com os filhos e, não menos importante, se diverte às escondidas com rapazes, alguns deles menores... A descoberta da homossexualidade do pai por Alison, quase na mesma altura em que ela própria revela aos pais que é lésbica, acaba por criar uma teia de culpas e mal-entendidos no momento em que o progenitor é atropelado e não se chega a saber se foi acidente, se suicídio. E essa morte e a dúvida à sua volta são o motor para a narradora nos contar a vida da família Bechdel, na qual todos, afinal, parecem viver sozinhos (a capa dá, de resto, uma boa ilustração disso), carregados de mistérios, complexos e solidão. Um caso sério de literatura culta (as leituras do senhor Bechdel são de respeito) aos "quadradinhos". A não perder.