[Flávio Bittencourt]

O Prof. Zizek lamenta a ascensão da direita populista na Europa

Em entrevista concedida em abril de 2010, Slavoj Zizek lembrou que a crise do capitalismo alimenta o crescimento, na Europa, de um populismo inquietante e autoritário que tem em Sílvio Berlusconi o maior intérprete.

 

 

 

   

 

 

 

 (http://www.luckyfilm.it/pages/stampa.html)

 

 

 

 

"Avatar É O QUE ZOA"

(FRASE QUE PODERIA SER DITA POR PESSOAS LINGUISTICAMENTE

ATUALIZADAS DA REGIÃO CENTRO-OESTE DO BRASIL)

 

 

 

 

"Il manifesto est un journal politique italien, créé à l'origine comme une revue politique à périodicité mensuelle, publié pour la première fois le 24 juin 1969. Il fut fondé par une frange dissidente du PCI dont les protagonistes furent Aldo Natoli, Luigi Pintor, Rossana Rossanda. Ceux-ci furent exclus du parti dès la sortie du deuxième numéro, en novembre 1969, qui condamnait l'invasion de la Tchécoslovaquie par les troupes de l'Union soviétique.

Avec la transformation de la revue en quotidien (intervenue en avril 1971), le groupe de dissidents s'organisa en parti politique, participant aux élections législatives de 1972. Ce groupe fusionna par la suite avec le Parti d'unité prolétarienne (PdUP), pour former, en 1974, le parti de l'unité prolétarienne pour le communisme.

En 2005, Giuliana Sgrena, journaliste à Il manifesto est prise en otage en Irak, et fut sauvée, au péril d’un chef des services secrets italien (en). (...)".

(http://fr.wikipedia.org/wiki/Il_Manifesto,

sendo que IL MANIFESTO é sediado em Roma,

como se pode conferir na mesma fonte de informação:

o verbete 'Il Manifesto' da Wikipédia [VERSÃO EM FRANCÊS

E OUTRAS TRADUÇÕES ENCICLOPÉDICO-DIGITAIS])

 

 

 

 

"PARA UTILIZAR UMA GÍRIA NÃO SEI SE APENAS BRASILIENSE - ou também goiana? - DIGAMOS QUE AVATAR ' é o que zoa'  (É OBJETO DE GRANDE INTERESSE E CIRCULAÇÃO POPULAR). MAS O DIGNO PENSAMENTO DO TEÓRICO ESLOVENO SLAVOJ ZIZEK É O QUE ZOA NAS MENTES DAS PESSOAS INTRIGADAS COM MENSAGENS POLITICAMENTE CORRETAS EMANADAS DA SUSPEITA HOLLYWOOD, sendo que a expressão HOLLYWOOD é aqui entendida como LUGAR PRIVILEGIADO DE CRIAÇÃO E REPRODUÇÃO DA ABJETA IDEOLOGIA IANQUE (norte-americana) DA ATUALIDADE: o que é por assim dizer BOM (bondoso) pode ser SUSPEITO."

(Coluna "Recontando...")

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  

 

ZIZEK

(http://www.outraspalavras.net/2011/04/26/zizek-%E2%80%9Cnada-esta-perdido%E2%80%9D/)

 

 

 

 

  

"O filme de James Cameron [AVATAR] é agradável, divertido, uma obra inovadora do ponto de vista do uso das tecnologias digitais. Mas aqueles que sustentam que os críticos radicais nos Estados Unidos são uma espécie de ala marxista de Hollywood não me convencem. Eles escreveram que Avatar retrata a luta de classes e a luta dos pobres contra os ricos, com o fim de auto-determinarem sua vida. Há um planeta, Pandora, que é invadido por uma tropa de mercenários a soldo de multinacionais. O objetivo é depredar seus recursos naturais, colocando, assim, em perigo o milenário equilíbrio que os seres vivos estabeleceram com o luxuriante ecossistema. Podemos estabelecer certa analogia com o que as multinacionais e os países imperialistas fazem com a floresta amazônica, com o Iraque ou com toda aquela realidade onde estão as fontes energéticas e as matérias primas fundamentais para a produção de riqueza. No filme, os aborígenes de Pandora, em nome de uma visão holística de relação com a natureza, opõem-se ao capitalismo, vencendo, no final, sua batalha. Mas a natureza é um produto cultural que muda com a mudança das relações sociais.

Os seres sempre retiraram da natureza os meios para viver e se reproduzir como espécie. Mas ao fazê-lo, transformaram a natureza. Não é, portanto, retornando a uma idade de ouro idealizada, como sugere James Cameron, que se pode derrotar o capitalismo. Avatar é pura fantasia, fascinante por certo, mas sempre fantasia."

(SLAVOJ ZIZEK, uma das respostas da entrevista adiante transcrita na íntegra)

 

 

 

 

AVATAR:

OS NATIVOS-EXTRATERRESTRES, cujo país é invadido por terráqueos

facistóides e maus, SÃO ECOLOGICAMENTE CORRETOS,

BONZINHOS, CHEIOS DE CORAGEM E AMOROSOS

(mas o sistema cutural-industrial que os concebeu é suspeito):

(http://huwdavid.wordpress.com/2010/01/13/avatar-a-visual-feast/)

 

 

 

 

 

 

"NO ENTENDIMENTO DE SLAVOJ ZIZEK, AVATAR É UM FILME APOLÍTICO e essa consideração não é elogiosa, pelo contrário (MAS NÃO CHEGA A SER CRITICAMENTE AGRESSIVA)"

(COLUNA "Recontando estórias do domínio público")

 

 

 

 

"O ÚLTIMO GRANDE ACONTECIMENTO DA PRODUÇÃO TEÓRICA MUNDIAL, crítica, A RESPEITO DA PRODUÇÃO CINEMATOGRÁFICA HOLLYWOODIANA FOI A CONSIDERAÇÃO DO PROF. SLAVOJ ZIZEK SOBRE AVATAR, DE QUE ESTE FILME, SEM CHEGAR A SER fascista (O ESPECTADOR PREFERE OS NATIVOS-EXTRATERRESTRES-PUROS-OPRIMIDOS-INVADIDOS AOS ARROGANTES INVASORES DO PLANETA TERRA, MILITARIZADOS E PODEROSOS), PODE SER CONSIDERADO APOLÍTICO. Se a palavra APOLÍTICO não for considerada, propriamente, um XINGAMENTO - como ALIENADO quase chega a ser -, TODO TEXTO DE ZIZEK EM QUE ESSE AUTOR ESBOÇA UMA CRÍTICA AO APOLITICISMO MERECE SER ESTUDADO COM MUITA ATENÇÃO. E, bem, o diretor de AVATAR está de olho da AMAZÔNIA, para, em próximo filme, mostrar como terráqueos maus, poderosos e militarizados não respeitam nem as culturas milenares de etnias que lá habitam, nem muito menos os seus complexos e ricos ecossistemas naturais"

(IDEM)

 

 

 

 

 

"O MAIOR POPULISTA DE DIREITA NA ALTA POLÍTICA DO BRASIL CHAMAVA-SE JÂNIO DA SILVA QUADROS E A CONFIANÇA QUE NELE A MAIORIA DO POVO DEPOSITOU FOI ABSOLUTAMENTE  CATASTRÓFICA (de certa forma, é por isso que cidadãos que gostam da mensagem ecologicamente correta transmitida no filme AVATAR devem ler com atenção as considerações de Zizek sobre POPULISMO DE DIREITA e sobre o mencionado filme AVATAR)"

(IBIDEM)

 

 

 

 

 

 

                         ABRAÇANDO FRATERNAMENTE, talvez de forma "apolítica", 

                         TANTO O PENSADOR SLAVOJ ZIZEK - o que ele fala e escreve É O QUE ZOA -

                          QUANTO O DIRETOR DE CINEMA JAMES CAMERON

                          (este último, afinal, DEFENDE A INTEGRIDADE

                          ECOLÓGICA DA AMAZÔNIA) - E PENHORADAMENTE AGRADECENDO A

                          BENEDETTO VECCHI, DE IL MANIFESTO, PELA ENTREVISTA QUE FEZ COM O

                          PROFESSOR ZIZEK, como seus colegas-jornalistas e do apoio profissional,

                          E A ANETE AMORIM PEZZINI, PELA PERFEITA TRADUÇÃO,

                          DO ITALIANO PARA O PORTUGUÊS, DESSE UNIVERSALMENTE RELEVANTE

                          PRONUNCIAMENTO, QUE TAMBÉM ARGUTAMENTE DISCUTE 

                          O FILME AVATAR, por Cameron criado e dirigido, QUE HÁ MAIS DE UM ANO 

                          "É O QUE ZOA(O FILME, mas também a fala do Professor S. Zizek)

 

 

 

 

 5.5.2011 - Como sou meio ingênuo, adoro ver, na superprodução americana AVATAR, pessoas boazinhas do planeta Terra defendendo (clandestinamente) nativos puros de outro planeta que são injustamente expulsos de riquíssimos e sagrados territórios, de quase-terráqueo-amazônica ecologia e inigualável beleza natural, onde seus ancestrais estão enterrados - O PROBLEMA NÃO PARECE SER O APOLITICISMO DO FILME (a ideia de Zizek é respeitável e a nossa colocação não passa de um provocação teoricamente simples para fazer o leitor prosaicamente pensar), MAS O FATO DE PESSOAS suspeitas (TODO O SISTEMA SEMIÓTICO-IDEOLÓGICO DE HOLLYWOOD É SUSPEITÍSSIMO) ESTAREM DEFENDENDO BOAS CAUSAS: EM RESUMO, O DIRETOR DE AVATAR, James Cameron, ESTÁ NÃO ESTÁ ERRADO QUANDO LEVANTA A BANDEIRA DE QUE A FLORESTA AMAZÔNICA DEVE SER DEFENDIDA; o problema é QUANDO e ONDE e PORQUÊ ele levanta corretas causas como essa. (O Brasil que abra o olho com esse tão suspeito pessoal da "Yankeelândia"...)  F. A. L. Bittencourt ([email protected])

 

  

 

"Zizek: “nada está perdido”

Entrevista por Benedetto Vecchi, no Il Manifesto | Tradução: Anete Amorim Pezzini

A crise do capitalismo alimenta o crescimento, na Europa, de um populismo inquietante e autoritário que tem em Sílvio Berlusconi o maior intérprete. Mas abre também espaço inédito para uma política que tenda à sua superação, como mostra esta entrevista com o filósofo esloveno Slavoj Zizek, por ocasião do lançamento do livro Primeiro como tragédia, depois como farsa1.

Escrita em estilo sóbrio, a obra analisa o mundo depois da crise econômica e a tendência de muitos governos de intervir, por meio de financiamento das dívidas dos bancos e das grandes instituições financeiras, para evitar aquilo que apenas há poucos anos parecia a trama de um filme de ficção sobre o colapso do capitalismo. 

Mas o autor procura distanciar-se das posições teóricas de muitos estudiosos marxistas, que sempre viram o neoliberalismo como um parêntese que, eventualmente, seria substituído por uma realidade social e política mais consentânea com as leis econômicas, dando pouco espaço para os rentistas que enriqueceram com as loucuras especulativas das últimas décadas.

Para Zizek, ao contrário, o neoliberalismo, tem sido uma adequada contra-revolução que cancelou a constituição material e formal surgida após a II Guerra Mundial, quando o capitalismo era sinônimo de democracia representativa. No início do terceiro milênio, a contra-revolução terminou, abrindo espaço para uma política radical que Zizek, em sintonia com o filósofo francês Alain Badiou, chama enfaticamente de “hipótese comunista”.

O filósofo esloveno não fecha, porém os olhos para o fato que os sinais provenientes de toda a Europa apontam para a ascensão de uma direita populista que conquista consensos onde os partidos social-democratas eram tradicionalmente fortes – como na Holanda, Noruega, Suécia. E também era irônico que com os democratas e norte-americanos radicais, que “nos Estados Unidos, depois de haver saudado a eleição de Obama para a Casa Branca como um evento divino, agora deleitassem-se em discutir se é politicamente mais incisivo Avatar, de James Cameron, ou Guerra ao Terror, de Kathryn Bigelow”.

 Eis a entrevista: 

 

Em um artigo seu, o senhor lançou farpas contra Avatar, definindo-o como um filme apolítico. No entanto, no filme de Cameron, há fortes referências tanto à guerra do Iraque quanto à destruição da floresta amazônica: em ambos os casos, os vilões são as multinacionais… 

Slavoj Zizek: O filme de James Cameron é agradável, divertido, uma obra inovadora do ponto de vista do uso das tecnologias digitais. Mas aqueles que sustentam que os críticos radicais nos Estados Unidos são uma espécie de ala marxista de Hollywood não me convencem. Eles escreveram que Avatar retrata a luta de classes e a luta dos pobres contra os ricos, com o fim de auto-determinarem sua vida. Há um planeta, Pandora, que é invadido por uma tropa de mercenários a soldo de multinacionais. O objetivo é depredar seus recursos naturais, colocando, assim, em perigo o milenário equilíbrio que os seres vivos estabeleceram com o luxuriante ecossistema. Podemos estabelecer certa analogia com o que as multinacionais e os países imperialistas fazem com a floresta amazônica, com o Iraque ou com toda aquela realidade onde estão as fontes energéticas e as matérias primas fundamentais para a produção de riqueza. No filme, os aborígenes de Pandora, em nome de uma visão holística de relação com a natureza, opõem-se ao capitalismo, vencendo, no final, sua batalha. Mas a natureza é um produto cultural que muda com a mudança das relações sociais.

Os seres sempre retiraram da natureza os meios para viver e se reproduzir como espécie. Mas ao fazê-lo, transformaram a natureza. Não é, portanto, retornando a uma idade de ouro idealizada, como sugere James Cameron, que se pode derrotar o capitalismo. Avatar é pura fantasia, fascinante por certo, mas sempre fantasia.

O senhor tem frequentemente sublinhado que o populismo seja uma doença do Político. Não lhe parece que o populismo, mais que uma doença, seja a forma política melhor que as outras se adapta ao capitalismo contemporâneo?

Slavoj Zizek: Até alguns anos atrás, afirmava-se que o capitalismo era sinônimo de democracia na sua forma liberal, fundada sobre a tolerância, o multiculturalismo e o politicamente correto. Agora, ao contrário, assistimos às forças ou aos líderes políticos que invocam a mobilização do povo para combater os inimigos do estilo de vida moderno. O filósofo argentino Ernesto Laclau analisou a fundo a lógica do populismo, sustentando que existe uma variante de esquerda e uma variante de direita. A tarefa do pensamento crítico consistiria em evitar a derivação de direita.

Não estou de acordo com essa posição. Em primeiro lugar, o populismo é sempre de direita. Além disso, o povo, como a natureza, é uma invenção. Laclau acredita que para fazê-lo tornar-se realidade deve-se imaginar um universal que contenha e supere as diferenças dentro dele. Daí a necessidade de identificar um inimigo que impede a formação do povo. Não é uma coincidência, então, que a forma acabada de populismo seja o anti-semitismo, porque indica um inimigo que vive entre nós. O mesmo fazem os populistas contemporâneos quando indicam os migrantes como a quinta-coluna entre nós.

De acordo com o senhor, o populismo dirigirá o conflito contra inimigos de conveniência, para esconder o sistema de exploração do capitalismo. Isso quer dizer que esta tendência ocupa um espaço político abandonado, por exemplo, pela esquerda. Como recuperar esse espaço?

Slavoj Zizek: Walter Benjamin escreveu que o fascismo emerge de onde uma revolução foi derrotada. Um conceito que, aplicado à realidade contemporânea, explica o fato de o populismo emergir quando a hipótese comunista, que não coincide com o socialismo real, é retirada da discussão pública. Entretanto, no tolerante capitalismo contemporâneo assistimos à campanha midiática contra os migrantes, porque atentam contra nossa segurança. Ou ficamos atordoados com intelectuais que, como Bernard Henri-Levy, debatem longamente sobre a superioridade da civilização ocidental e sobre o perigo representado pelo fundamentalismo islâmico, qualificado como islamo-facismo.

Creio, todavia, que há fortes pontos de contato entre a ideologia liberal e o populismo: ambos são pensamentos políticos que levam em conta o estilo de vida capitalista ocidental como o único mundo possível. Os liberais, em nome da superioridade da democracia, os populistas em nome do único estilo de vida que as pessoas se dão. Há também diferenças. Os liberais estão impondo, mesmo com as armas, a democracia e a tolerância entre quem não é democrático nem tolerante. Os populistas desejam, ao contrário, aniquilar de modo suave de polícia étnica as diversidades culturais, sociais, de estilo de vida. O populismo é, portanto, uma das formas políticas do capitalismo global, mas não a única. Silvio Berlusconi, frequentemente julgado como um comediante ou um personagem de opereta, é, ao contrário, um líder político para ser estudado com atenção, porque pretende conjugar a democracia liberal com o populismo.

O premiê italiano está, todavia, acelerando uma tendência presente em todos os sistemas políticos democráticos. Sua obra visa modificar o equilíbrio dos poderes – executivo, legislativo, judiciário – para benefício do executivo, de modo tal que o executivo que englobe o legislativo e o judiciário, mas sem cancelar os direitos civis e políticos. As eleições são consideradas como uma sondagem sobre a obra do executivo. Se Berlusconi perde, invoca em seguida a soberania popular representada por ele. A forma política que propõe é, sim, uma mescla entre democracia e populismo, se bem que a sua ideia de democracia seja uma democracia pós-constitucional que faz da invenção do povo o seu traço distintivo. Tudo isso faz com que a Itália, mas que um país atípico, seja um laboratório inquietante onde se desenvolveu uma democracia pós-constitucional. Desse ponto de vista, na Itália está-se construindo o futuro dos sistemas políticos ocidentais…

Slavoj Zizek: O que você quer dizer com pós-constitucional?


Uma democracia que elimina a antiga divisão e equilíbrio entre os poderes executivo, legislativo e judiciário. Equilíbrio dos poderes definido por todas as constituições europeias e pelo Bill of Rights dos Estados Unidos…

Na Europa, tudo isso é chamado pós-democracia. Claro, Sílvio Berlusconi deseja superar a democracia representativa que conhecemos no capitalismo. Por isso é um líder político mais que nenhum outro. Acho que o presidente Nicolas Sakozy tem uma visão muito mais clara do que aquela posta em jogo no capitalismo. Isso quer dizer que é mais perigoso do que os outros expoentes da direita europeia ou estadunidense. Não nos encontramos, portanto, em frente a um personagem de opereta, que vai às mulheres e promulga leis ad personam. A tragédia apresenta sempre momentos de opereta. Mas há tragédia quando se manifestam conflitos radicais, onde não há possibilidade nem de mediação nem de salvação.

Será, por isso, interessante ver como evoluirá a situação italiana, que não representa — e sobre isso, estou de acordo contigo — uma anomalia, mas um laboratório político cuja existência condicionará muitíssimo o futuro político da Europa. Na Holanda, na Suécia, na Noruega, na Dinamarca, na França, na Inglaterra há, de fato, forças políticas populistas que recolhem sempre mais consensos eleitorais graças às campanhas anti-migratórias que conduzem, mas não têm aquele radicalismo que apresenta a situação italiana.

Dito isso, não é preciso, no entanto, desenvolver uma visão apocalíptica da realidade. É claro: há uma guerra civil rastejante na sociedade capitalista. A inquietação ambiental atingiu os níveis de vigilância. A democracia é reduzida a um simulacro. Ainda assim, nem tudo está perdido.

Pelo contrário. Como demonstra a recente crise econômica, quando tudo parece perdido, abre-se espaço para uma ação política radical, que eu chamo de comunista. Peguemos o recente encontro sobre ambiente realizado no ano passado em Copenhague. O resultado final, mais que um êxito decepcionante, foi um desastre político. Há propostas, derrotadas nos trabalhos da cúpula, que indicam na salvaguarda do ambiente uma das prioridades para salvar o capitalismo. Podemos pensar em uma aliança tática com quem o carrega avante.

A crise econômica, além disso, exigiu uma intervenção do Estado para salvar da bancarrota empresas, bancos e sociedades financeiras. Mas isso significou que o tabu sobre a periculosidade da intervenção reguladora do Estado foi quebrada. Isso pode reforçar os socialistas — isto é, aqueles que apontam para uma redistribuição de renda e de poder. Não é a política que eu amo, mas abre espaço a propostas mais radicais. Em outras palavras, volta forte a ideia comunista de transformar a realidade. O que proponho não é um mero exercício de otimismo da razão, mas a consciência de que há forças e relações sociais que podem ser liberadas a partir da camisa de força do capitalismo.

Toni Negri e Michael Hardt acham que enfatizando as características do capitalismo pós-moderno criam-se condições para o governo da comuna — isto é, do comunismo – graças àquilo que definiu a virtude prometeica da multidão. Mais realisticamente, acho que devemos organizar as forças sociais oprimidas para uma ação praticável no presente e no futuro imediato.

 

O senhor escreve, em sintonia com Alain Badiou, que o comunismo é uma ideia eterna. Uma política “comunista” deve, todavia, ancorar-se numa análise das relações sociais de produção e das formas que ela assume em uma contingência histórica. Pode-se estar de acordo ou em discordância com a tese de Negri e Hardt sobre o capitalismo cognitivo, mas seus escritos assinalam exatamente essa necessidade. Caso contrário, o comunismo torna-se uma teologia política, não acha?

Slavoj Zizek: Não acredito, como Hardt e Negri, que com o desenvolvimento capitalista a forças produtivas, mais cedo ou mais tarde, entrem em rota de colisão com as relações sociais de produção. Precisamos agir politicamente para que isso aconteça. É esse o legado de Lenin que não pode mais ser apagado. Mas deixemos fora os textos sagrados e olhemos o capitalismo real. Existe certamente uma setor de força-trabalho cognitiva, mas que também continua a trabalhar em fábrica e que, como os migrantes, é reduzida a uma condição de submissão servil no processo laboral.

Para não jogar no lixo da história esses “excluídos”, ou “marginais”, é preciso uma forte imaginação política, capaz de recompor e unir as diferentes setores da força-trabalho. A teologia é sempre fascinante, mas, quando digo que a ideia comunista é eterna, refiro-me ao fato de que é uma constante na história humana a tensão de superar a condição de escravidão e exploração. Por isso, o comunismo volta sempre, mesmo quando tudo previa que fosse permanecer definitivamente sepultado sob os escombros do socialismo real.

1A entrevista foi feita por ocasião do lançamento da edição italiana do livro, em abril de 2010. A tradução para o português é do site Rosa Blindada".

(http://www.outraspalavras.net/2011/04/26/zizek-%E2%80%9Cnada-esta-perdido%E2%80%9D/)