O pensamento positivo e a crise atual do capitalismo
Em: 25/11/2008, às 22H37
Por Antônio Carlos Rocha - especial para Entre-textos.
Para uns é o sinal dos tempos, para outros o fim do mundo, há ainda quem fale em hecatombe planetária, e no título escrevemos crise atual porque o decadente sistema capitalista já teve outras crises.
Em 25/11/08, quando estamos escrevendo este artigo, a mídia que nos imprensa (parodiando o antigo Pasquim) nos diz que o governo Bush teve que socorrer o Citigroup, o segundo maior banco da América; no domingo anterior, 23/11/08, o jornal O Globo falava dos milhares de desempregados e demitidos da então próspera indústria automobolística dos EUA.
Recentemente, o Prêmio Nobel de Literatura, o escritor português, José Saramago, histórico membro do Partido Comunista Português, declarou que Marx estava e está certo, pois, há muito dinheiro para salvar os bancos em bancarrota, já para os pobres... nada...
Quem nos socorre, na reflexão do artigo ora em curso, é o famoso psicanalista italiano radicado no Brasil, Contardo Calligaris, em seu ótimo artigo publicado na Folha de S. Paulo, de 02/10/08, quando cita o seguinte trecho que transcrevemos:
“O que foi? Cobiça dos Jones e dos Smiths? Ganância de executivos preocupados só com seu bônus de Natal? Uma grande jornalista americana, Bárbara Ehrenreich, no New York Times de 23 de setembro, aponta para um responsável menos óbvio: o pensamento positivo, triunfante na cultura americana das últimas décadas.
Para Ehrenreich, o problema é que, há anos, “tropas de pastores de superigrejas e um fluxo infinito de best-sellers de auto-ajuda” juram que, para conseguir o que a gente quer, é suficiente “acreditar firme”: deseje ardentemente o objeto de sua ambição, e eis que o mundo e Deus responderão a seu pedido.
As estantes das livrarias de aeroporto mandam cada viajante (sobretudo se for um executivo) ser loucamente otimista e confiante. Em seus sites, os conferencistas motivacionais ainda listam orgulhosamente, entre seus clientes, Lehman Brothers e Merril Lynch...” (bancos americanos também salvos pelo governo dos Estados Unidos).
Nosso comentário: Não cremos que o único responsável seja só , “o menos óbvio”, o desenfreado pensamento positivo; deve ter e certamente tem outros fatores.
Nosso bom amigo, Sidarta Gautama, o Buda, sempre falou em pensamento correto, podemos até interpretá-lo como pensamento positivo, mas é bom lembrar também que Mestre Sakyamuni no “Discurso aos Kalamas” recomendava “não acreditarmos em tudo o que ouvimos” e por extensão em tudo o que lemos ou assistimos.
Temos visto alguns espiritualistas, aqui no Brasil, ainda continuarem a bradar sobre os ilimitados poderes do pensamento positivo e afins. Há duas semanas, certa amiga, membro da corrente carismática da Igreja católica, já tendo um apartamento, resolveu comprar outro e agora estava desesperada com as notícias econômicas, exclamava toda hora para si mesma: “Papai do Céu é o dono do banco e ele vai me ajudar a pagar”, uma frase muito usada por carismáticos, pentecostais e neopentecostais no quesito finanças.
Especialistas no setor dividem-se: para uns a crise vai durar só uns três anos, para outros pode durar uma década ou mais, há aqueles que falam em fase terminal do capitalismo e necessidade de novos rumos na economia mundial.
Fórmulas prontas não existem, contudo, uma boa dose de equilibrado otimismo é boa porque ajuda a manter a auto-estima elevada e esta faz bem à saúde e pode evitar a depressão. Portanto, beba esta dose de otimismo... com moderação...
Novamente, nosso bom amigo Buda, já ensinava no século VI aC., caminho do meio em tudo, equilíbrio, evite os extremos, olho na lei da impermanência que move o mundo físico.
A milenar filosofia chinesa, inspirada no ensinamento de Buda, também advoga que toda crise tem pelo menos dois aspectos: o perigo e a oportunidade. Escolha o segundo item, com bastante plena atenção. Na palavra crise tire a letra “s” e fica o verbo crie, criar, criatividade...
Para os que seguem a Bíblia (com todo o respeito estamos citando estas correntes) os capitalistas se esqueceram de um importante versículo: “Não vos enganeis”. A Bíblia tem 166 versículos a respeito do verbo enganar e termos derivados. Os capitalistas e neoliberais se enganaram, pensaram que lucros, especulações e afins eram sempre eternos.
A saída? Esses dois grandes mestres da humanidade, Buda e Cristo, há muito já ensinaram: simplicidade, caridade, generosidade, humildade... mas até o planeta voltar a ter equilíbrio financeiro, espiritual e social, muita água vai rolar...
(*) Doutor em Ciência da Literatura, formado pela UFRJ.