Cunha e Silva Filho

 
          O mundo se tornou uma cozinha, com copa e sem copa, porque esta última, na política, nos palácios dos governos federal, estadual e municipal era locus privilegiado para as fofocas e conchavos entre partidários arquitetando planos para derrubar antagonistas, ou mesmo fofocas da vida familiar e íntima de políticos municipais, estaduais ou federais.
        Por isso, uma vez estranharam o título que meu pai deu a um dos livros dele publicados, Copa & cozinha.( Teresina: Academia Piauiense de Letras/ Projeto Petrônio Portella, 1988, 127 p.). Imaginavam que dizia respeito à arte culinária, quando não tratava nada disso e sim de política, regional, nacional e internacional, de temas sociais, de sistemas de governos, de aspectos autobiográficos de um jornalista político doutrinário e de fibra.
       Naturalmente, algumas páginas da obra desviavma sua atenção para narrativas ou exposições um tanto satíricas, um veio de sua escrita em que era bem forte. Assim a obra não deixa de nos propiciar momentos de humor e de situações engraçadas.
      Mas, o assunto desta crônica não é analisar aquele importante livro de meu pai e sim olhar em torno desse mundo de espetáculo que é o nosso, cheio de uma dinâmica de acontecimentos e de novidades que mal nos damos conta de sua velocidade e de suas mudanças.
     A moda agora são os chefs de cozinha, alguns até importados, sobretudo da França, como um deles, um conhecido gordinho do programa da TV Band, Master Chef, que tem tido ótimo sucesso, desde a sua estreia com candidatos jovens a ganhar prêmios e até temporada em Paris a fim de aprimorar seus métodos culinários. É sabido que os franceses, antes de tudo, adoram comer, e não é gratuita a circunstância de que a culinária francesa é, de longe, a mais apreciada do mundo.
     Depois do sucesso do primeiro Master Chef, a Band ofereceu aos telespectadores o Master Chef Júnior, onde só meninos e meninas tomaram parte no programa, mostrando as suas qualidades e a sua precocidade em lidarem com o preparo de pratos deliciosos e de não menos sobremesas apetitosas. Li que alguém não aprovou tanto o Master mirim quanto o de jovens de mais idade. O concurso para galgar o primeiro e o segundo lugares é complicado, exige determinação, muita paciência, engenhosidade e mãos habilidosas, sem contar com a necessária inclinação e amor à culinária.
     Este tipo de programa já era, em parte, apresentado no Brasil, mas de forma mais simples, não como um show de brilhos e de momentos emocionantes, em que a assistência televisiva se dividia entre os seus candidatos preferidos. Esta forma de programa voltada para a culinária, como quase tudo o mais de um pais que ainda vive perifericamente dependente do universo cultural do que aprende no exterior, com tal, não é original. Tudo se copia de fora do lixo ao luxo.
     É bem provável que o aumento de programas semelhantes que seguramente vai influenciar outras canais de televisão, reforçará estudos mais aprofundados da culinária, com o advento de cursos superiores neste campo de atividade.
      O brasileiro é um bom garfo e por isso não faltarão oportunidades de empregos a futuros especialistas daqui no mundo da cozinha. O momento de prestígio desses programas trará dividendos para a economia do país e principalmente para os níveis sociais mais elevados.
     Sabe-se que o ser humano não pode deixar de se alimentar duas, três ou quase vezes por dia. Ora, isso é uma alavanca fecundante para o crescimento de restaurantes de melhor qualidade em todo o país com chefs formados em faculdades, prontos a oferecerem pratos mais sofisticados e de refinado sabor.
     A influência dessa novidade é tão forte que os maridos de hoje também são atraídos para o desejo de aprender a cozinhar, de modo que o casal moderno estará mais tranquilo no tocante a quem vai preparar o almoço ou o jantar, ou uma boa sobremesa. Pode, assim, se revezar, poupando a mulher de ser o burro de carga de arcar sozinha com o preparo da alimentação da família.
     Estamos a grande distância dos tempos em que nossas mães nos repreendiam quando nos aproximávamos da cozinha, nos dizendo: “Meninos, lugar de homem não é na cozinha. Saiam daqui.” Isso foi comum em tempos passados. Eram tão comuns em certos lares as advertências e proibições das mães que, quem quebrava essas resistências, era mal visto por colegas a ponto de duvidarem da virilidade daquele jovem que aprendesse a fazer pratos maravilhosos.
     Como pertenço a essa geração de preconceitos contra o homem que cozinhava talvez isso me tenha afastado dos mínimos rudimentos de fazer um bom almoço agora. Só hoje sinto quanta falta faz a quem, na condição de homem, não sabe preparar um prato de feijão, um arroz, entre outras necessidades da cozinha. Fazer bolos nem falar! Uma voz lá distante ainda me ressoa nos ouvidos, não necessariamente em minha casa, mas na casa de amigos: “Cozinha não é lugar de homem.”
    Os tempos mudaram e, para alguns aspectos da vida, para melhor. Tanto é assim que há, se não me engano, mais chefs homens do que mulheres. Pura bobagem dos homens e mulheres do passado. Cozinha nada tem a ver com sexualidade. O machismo nesta área é coisa ultrapassada. Cozinha à vista!