[Maria do Rosário Pedreira]

Nos primórdios das Correntes d’Escritas, foi convidado um autor argentino, Leopoldo Brizuela, cujo romance – Inglaterra, Uma Fábula – lancei então na Temas e Debates. Conhecera-o um ano antes em Lisboa, quando o seu agente, depois de eu fazer uma oferta pelos direitos do livro, me propôs que fosse ao seu encontro, já que ele estava por cá a fazer pesquisa para um segundo romance. Descobri que o Leo era um apaixonado por Portugal e pelo fado, sabendo dezenas de letras e melodias de cor. Com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian, consegui que ele regressasse no ano seguinte para o lançamento e ficasse cerca de dois meses para terminar a sua investigação. Ficámos irmãos e, na altura, levei-o aos fados à Parreirinha de Alfama com o meu pai, que era um boémio amigo de Argentina Santos, e tivemos uma noite inesquecível. Pouco depois, porém, o meu pai morreu e o pai do Leo também. Tornámo-nos, talvez por isso, na nossa orfandade, ainda mais irmãos do que éramos. Mas o romance do mano argentino sobre Portugal tardou e, por muito tempo, cheguei a duvidar de que alguma vez fosse publicado. Graças a Deus, enganei-me: porque Lisboa, Um Melodrama acaba de sair e fala da Lisboa durante a Segunda Guerra, como palco de espiões, resistentes, fadistas, refugiados, homens-de-mão do regime e, claro, os suspeitos do costume. O mais bonito de tudo, para mim, é que na dedicatória figura, entre outros, o nome do meu pai como parceiro de farras e noitadas. Irmãos para sempre, Leo.