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Então o que aconteceu foi o seguinte: O imenso Yarlha Shampo se transformou num pequenino menino, vestido de seda branca, que logo se prosternou para ANL, submisso, devoto.

 

 

 

Mas quando ANL passou pelo planalto de Lhaitsa, o poderoso Thanlha apareceu diante dele na forma de um grande yak.

 

O yak tentou engolir ANL, que fez contra ele o gesto do escorpião. O yak se transformou em um pequeno menino com uma turquesa. E desapareceu.

 

Assim ANL continuou o seu caminho até ao meio-dia, quando o menino reapareceu diante dele, trazendo-lhe várias iguarias, que ofereceu a ele e se foi.

 

ANL aceitou e ali mesmo, sentado sobre a elevação de uma pedra, almoçou.

 

Mas ao longe, na direção do Norte, as montanhas apareciam ameaçadoramente escuras.

 

Sim, ele sabia que encontraria novos obstáculos no caminho. Mas calmamente almoçou, deitou-se na relva e dormiu por uns instantes, durante o qual sonhou com seu guru Ananda, que lhe apareceu sorrindo, aspergindo-lhe umas gotas de água perfumada sobre sua cabeça e depois desapareceu.

 

Quando acordou, algumas gotas de água da chuva estavam sobre seu rosto.

 

Reanimado, ANL voltou a andar.

 

Uma chuva fina começou a cair sobre toda a extensão do vale Lhaitsa, colocando brilhos adamantinos em todas as folhas de ervas.

 

ANL, abrigado sob sua capa, avançava na direção Norte.

 

 

* * *

 

 

A seguir vem uma passagem não se encontra na escrituras da época, mas vem da tradição oral. Foi-me relatada por um lama, num dia em que estávamos perto da grande estupa de Jarungkhasor.

 

Estava ANL então atravessando o Vale da Morte, perto do lago do mesmo nome, quando a noite caiu e ele se abrigou numa reentrância da montanha.

 

Mal tinha chegado lá, quando começava a meditar, uma bela jovenzinha apareceu, saída da ramagem. Estava quase nua, apesar do frio, e exalava o perfume de almíscar da montanha. Seus lábios eram grandes e carnudos. Seus seios, quase à mostra, estavam cheios de desejo, apontando o ar. O corpo seria de uma jovem de dezesseis anos, mas já completamente desenvolvido.

 

Aquela menina tentou seduzi-lo.

 

ANL não era um monge celibatário. Tinha, inclusive, casado, conforme se sabe. Mas ele não se interessou.

 

Vendo o desinteresse do iogue, a menina então lhe disse que tinha de partir, mas antes comentou de como ele podia estar viajando assim, daquela maneira, sozinho, naquela terra de tantos perigos.

 

— Você não tem medo de nada? – perguntou ela.

 

Ele refletiu um momento e respondeu:

 

— Sim, disse. Tenho medo de escorpiões.

 

ANL, que sempre habitava grutas em montanhas, tinha tido sempre problemas com os escorpiões que encontrava nas pedras.

 

Naquele momento a jovem se transformou num gigantesco escorpião, do tamanho de um cavalo.

 

O animal, irritado e terrível, veio atacar ANL. Seus membros eram fortes como colunas de aço, suas duas garras armadas pareciam invencíveis. Na extremidade da calda ele exibia um ferrão para fora, gotejante de veneno mortal. Era um animal muito ágil, rápido, apesar do peso. Parecia invencível.

 

Então naquele instante ANL se mostrou como Gurtak: Sua forma era gigantesca e terrível e tão alta quanto uma montanha. Rugia como um trovão. É mesmo difícil descrever: pois ele estava envolto em violentas labaredas de um fogo abrasador. Seu rosto tinha três olhos esbugalhados. Seus dentes eram de leão. A cabeça, adornada de crânios humanos, tinha os cabelos eriçados para cima. Um colar de cinqüenta cabeças de cadáveres estava pendurada no seu pescoço. Havia várias grandes cobras venenosas enroscadas por todo o seu corpo. Ele vestia uma saia feita de peles de tigres. Com a mão direita, ele empunhava um dorge e com a mão esquerda ele segurou aquele escorpião pelo meio que todo o corpo do animal se quebrou em pedaços.

Tendo erguido o escorpião no ar, atirou-o nas águas geladas do Lago da Morte, e no qual lançou o seu dorge. Quando o dorge caiu na água, o lago se incendiou como se fosse um vulcão.

Naquele momento o escorpião começou a gritar de horror.

Então ANL voltou calmamente à sua forma normal e o retirou do lago com o gesto do gancho, voltando o terrível animal a aparecer como uma bonita jovem, que se prosternou e prometeu servi-lo. Mas ANL a deixou partir e, como se nada tivesse acontecido, voltou a meditar tranqüilamente.