O descobrimento do Brasil
Rogel Samuel
Dali se via o mar. Imenso, azul. Sim, dali principalmente se via o mar imenso e azul. Os dois homens andavam, de um lado para outro, na alameda da bela casa de D. Bento Esteves, respirando o ar que vinha do grande imenso e azul oceano. D. Bento tinha acabado de jantar.
- Sabe o Senhor quem está em Lisboa? – perguntou Julio Gonçalves a D. Esteves.
- E quem? – fez parando e encarando o amigo o velho Esteves.
- O Senhor de Belmonte, Pedr’ Álvares Cabral.
- O quê? – fez o outro repuxando a casaca. Já chegou ele?
- Sim, sim, disse D. Julio.
- E como foi a viagem para as Índias? Um sucesso, espero...
- Não, não, meu caro senhor... Foi uma tragédia!
D. Esteves não pode assimilar de imediato o choque e parou, apoiando-se na amurada de pedra de sua bela casa. Depois, sentou-se num banco de mármore liso que pertencera à sua avó.
Ele se lembrava vivamente do embarque, na praia do Restelo, e estava no cerimonial da missa da véspera da partida. Junto ao rei, D. Manuel, a corte toda vestida de luto, como era de uso nas despedidas, viu zarparem as treze naus no dia 9 março de 1500...
- O que aconteceu? - perguntou o velho, depois de um silêncio de pedra.
- Das treze naus que partiram, contou, cauteloso, Julio Gonçalves, somente quatro voltaram: a de Cabral, a de Pedro de Ataíde, a do Cunha e a de Nicolau Coelho.
- Mas a nau de Gaspar de Lemos retornou antes, não foi?
- Sim, sim. Trouxe aquelas cartas com que anunciaram a descoberta de Santa Cruz, terra de além-mar. Sim, sim. Terra só de índios e de papagaios amarelos. Não tem ouro. Nem prata. Sem interesse comercial.
- Mas depois, continuou Gonçalves, Cabral prosseguiu para as Índias, para Calecute... Quatro naus se perderam na tempestade do Cabo, inclusive a de Bartolomeu Dias... Seis chegaram a Calecute... a nau de Pedro Dias desgarrou-se na costa oriental da África... Já no regresso a de Sancho de Tovar encalhou perto de Melinde... enfim foi somente com quatro naus que ele apareceu por aqui ontem.
A face de D. Bento Esteves se anuviou. Pesou sobre ele uma nuvem de desgosto. Ele estava arrasado. Tinha investido muito ouro naquela expedição. Baixou a cabeça pensativo e depois se levantou e ficou a contemplar o mar-oceano.
Ao longe, via a noite que se aproximava.
O descobrimento do Brasil
Por Rogel Samuel Em: 31/01/2016, às 05H18