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O Cosmorama 

NEUZA MACHADO

Inicialmente e rapidamente a terra do Estado de Pernambuco se fez presente no romance O Amante das Amazonas: Ribamar saíra da povoação de Patos, Pernambuco, “na madrugada do Natal de 1897”, levando na “mala de amarrado” apenas duas mudas de roupa, “com um Cosmorama onde se avistavam as paisagens de Manaus, Belém, Paris, Londres, Viena e São Petersburgo”[li]. A palavra “madrugada”, no princípio da narrativa, assinala uma futura vida de realizações e glórias; o “Cosmorama”, representativo de uma Saga do Universo determinou o desejo de dilatação ficcional universal. Mas, houve a necessidade de se escalar a Serra da Borborema (ainda o elemento terra obstaculizante) para atingir a finalidade do relato, ou seja, para futuramente interagir com a profunda materialidade aquática da terra revigorada e elevá-la ao panteón literário. Até chegar a uma experiência ficcional positiva com a matéria eleita, tão “inconsistente e móvel”, muitos foram os obstáculos. Para que, ao final do relato, pudesse apresentar aos leitores as inconformadas decadências histórico-sociais da extração da árvore da borracha e da Cidade assinalada, o narrador obrigou-se a uma interação profunda com as matérias compostas de sua primitiva realidade. Todas “reclamavam ser imaginadas em profundidade”, mas a matéria água exigiu um esforço maior. A “mala de amarrado” do primeiro Ribamar, encharcada de água de chuva e de lágrimas do narrador, transformou-se gradativamente em “mala de madeira”. Ao chegar em Manaus, o Ribamar de Sousa já trazia uma “mala de madeira enrolada na mão”, porque já não era um simples retirante, mas um Brabo Homem/(Personagem) da Floresta em busca de colocação na Cidade de Manaus (o representante ficcional daquele que saiu da Floresta para buscar colocação na Cidade Grande, no Mundo).


A partir dali, o Ribamar teria/terá de desenrolar a sua “mala de madeira” e transformá-la em arca de tesouro. Para esta repentina transformação, para esta diferenciada incursão ficcional nas defesas da Cidade, para a elevação social do personagem coadjuvante, o segundo narrador levou os passos de sua criatura ficcional até à soleira da porta de D. Mariazinha, a única que poderia permitir-lhe a entrada triunfal no reduto do passado.

O fogo da labareda da serpente
Sobre O AMANTE DAS AMAZONAS, de Rogel Samuel