O assassínio de um professor de inglês
Por Cunha e Silva Filho Em: 26/01/2014, às 10H40
Cunha e Silva Filho
Não anotei o nome dele. Sei que tinha 45 anos, um jovem ainda na flor da mocidade produtiva, morto a tiros por uma bandido “cruel.” Estou usando uma palavra de um delegado onde o fato deplorável foi registrado. Este marginal, com antecedentes criminais, ou seja, era um delinquente, um menor há um ano.
Segundo declarações do delegado, este energúmeno, que tem atitudes frias e uma fisionomia na qual os olhos indicam o que lhe ia no íntimo de sua alma perdida, aproveitou-se do fato surpresa e tirou a vida de quem estava no exercício de sua profissão, certamente um professor eu complementava seu salário com aulas particulares, pois era isso mesmo que o mestre de inglês ia fazer.
Estacionou numa das ruas de São Paulo e, quando se preparava para deixar seu carro estacionado perto da casa onde daria uma aula, de repente vê na sua frente um espírito das trevas mefistofélicas que lhe exige o carro e talvez alguma coisa mais. O professor, tendo saído do carro, num átimo de reação mecânica, não se intimidou e entrou em luta corporal com o meliante, predador noturno da vida paulistana, mais uma dessas feras (des)umanas espalhadas atualmente pelas ruas da trepidante e sempre perigosa capital paulista, a maior cidade da América Latina.
Lutou por pouco tempo com o facínora que, talvez mais habilidoso e sendo mais novo, levou a melhor, acertando, creio que à queima-roupa, o peito e outras duas regiões do corpo do jovem professor. Foram, se não me engano, cinco tiros. Morte imediata.
Uma vida encurtada pela impunidade brasileira, pelo código penal superado, pelas brechas imorais de nossa legislação, pela desídia de nossa estrutura jurídica de todas os níveis da Federação e pela ausência de medidas governamentais decisivas a favor de mudanças concretas e duradouras. São
Paulo agoniza não só nas águas tempestuosas das inundações anuais e mortais, atingindo, sem piedade, sobretudo as camadas desfavorecidas da população, mas também no crime impune e contínuo.
São Paulo, por suas qualidades, que são muitas, e por seus defeitos que igualmente são inúmeros, abriga cotidianamente todo tipo de crimes e selvagerias praticadas contra seus habitantes que, além disso, ainda têm que enfrentar uma vida árdua nos transportes precários.
Com demagógicas promessas de seus governos estadual e municipal de melhorarem a qualidade da educação pública sempre adiada, com seus hospitais sem condições de atender à demanda gigantesca de milhões de seus habitantes, com seus moradores pobres sem teto ou vivendo em favelas da periferia, fruto dos desníveis sociais, São Paulo atingiu seus limites de resistência e, assim, clama por mudanças inadiáveis sob pena de ter que enfrentar a indignação da sociedade.
São Paulo e seus quatrocentos e sessenta anos de fundação em 25 de janeiro de 1554, tendo à frente a colaboração decisiva de dois eminentes padres jesuítas, Nóbrega e Anchieta, o Apóstolo do Brasil. A São Paulo de hoje, ameaçadora e a do passado, das primeiras décadas do século anterior. Triste contraste! Esta última mais cordial, mais acolhedora, praticamente em seu estado puro de província com problemas, sim, mas de diferente magnitude e, sobretudo, sem as agruras causadas pela super-densidade populacional sem freios, sem o trânsito caótico, os seus ciclópicos engarrafamentos, os grandes males sociais que deslustram as suas origens histórico-religiosa-culturais, o seu progresso mais ordenado, a potência de sua indústria e comércio, sua vida universitária, seus centros de estudos, seus museus, enfim, a sua condição de carro-chefe da economia brasileira.
Todo esse imbróglio de condições positivas e negativas perdeu seu controle original, sua estrutura de grande urbe, mas bem administrada, com políticos mais conscientes de suas funções públicas e não frutos dos conchavos, compadrios na seleção dos candidatos aos governos estadual e municipal e truques baixos da política nacional.
Além disso, todos esses erros imperdoáveis das instituições públicas são causas que propiciaram a invasão do crime galopante, de marginalidade certa de que não será punida, seja por ser composta de menores meliantes, seja por ser formada de adultos irrecuperáveis e portadores de cérebros degenerados que não podem estar em convívio com a sociedade.
São autores de crimes hediondos, abomináveis, de extrema crueldade e frieza de sentimentos. São do tipo que acabou com a vida do jovem professor de inglês, deixando uma viúva para sempre psicologicamente destroçada a cuidar de um bebezinho e de um filho pequeno. Mais um número na estatística da cidade do crime e da ausência de punição de uma espécie que recomendaria sem restrições: a prisão perpétua.