O acadêmico,em texto deveras bajulador,tenta se fazer erudito, ininteligível, talvez àqueles a quem não queira que saibam desse seu lado insidioso e piegas: o do adulador; e inteligível pelos que conhecem razoavelmente o vocabulário da língua utilizada, mas não a figura homenageada; o resultado é que a troca de pés pelas mãos, do escrevinhador, torna o escrito ininteligível ou descontextualizado para gregos e troianos; notadamente, quando diversos dos vocábulos dos quais se serve para evidenciar seu alvo não passarem de produtos de sua lavra criadora, invenções, ficções, termos ausentes dos mais completos dicionários e gramáticas próprios da língua; neologismos proscritos ou não autorizados por nenhum acordo ortográfico firmado entre as nações e localidades que falam a língua utilizada.
     O acadêmico, tomado aqui como sinônimo de bom escritor, e não porque, necessariamente, ocupa uma cadeira em uma academia de letras, imbuído de desmesurada vaidade, pensa que pode se dar ao luxo de arvorar-se em figura para quem as obrigações e os cuidados com o que escreve não existem, uma vez que os leitores, ao tomar suas obras para lê-las, certamente, não irão questionar a qualidade gramatical, ortográfica, semântica ou léxica daquelas.
     Não é bem assim. Entre os que leem os acadêmicos, mesmo que alguns não contem com boa quantidade de público leitor, estão, provavelmente, muito mais que os críticos profissionais, os contumazes, que tecem seus comentários ou elogios a respeito de gosto literário pessoal, entre amigos, companheiros, colegas; não raro, aconselhando a outrem obras de que hajam gostado e desaconselhando as que nada acrescentará a quem poderia lê-las. Partindo desse pressuposto, convém que os beletristas, naturalmente vaidosos ou convencidos de que suas criações são o que há de mais interessante no mundo literário, convençam-se de que ninguém pode fazer com a língua o que dá na telha. Assim como existe quem lê como autômato, apenas preocupado com o enredo ou a trama da obra – o que não deixa de ser até salutar, pois ler é melhor que não ler -; existem também os que preferem uma obra bem escrita, escorreita, com estrita obediência às regras gramaticais e vocabulares, sem falsos neologismos nem arrogância intelectual; ainda que pouco preocupada, por vezes, com a justeza, clareza, transparência, verdade criadora ou argumentação quanto ao assunto enredado.
     A propósito, o que ocorre ao acadêmico, às vezes, de maneira contrária, acontece com o sofrível beletrista, no que diz respeito a seus leitores. Não é incomum termos mais paciência e respeito com quem tenta escrever eruditamente, ainda que faça isso com intenções escusas, do que com aquele escrevinhador que maltrata a língua e falsifica a linguagem quanto ao tema abordado na obra.
     É usual, até, que espaços e meios disponibilizados ao medíocre escritor - pois existem mais elementos desta espécie na sociedade que acolhe a ambos -, sejam mais fartos do que os do acadêmico ou escritor de qualidade. Isto talvez explique por que a mídia e as editoras precisam dar voz e vez aos dois: ao primeiro, por pura obrigatoriedade, haja vista ser ele, no mais das vezes, muito mais lido e vendido do que o outro; ao segundo, para garantir e preservar alguma qualidade literária ou intelectual ao meio de comunicação que o torna público.
     Aconselha-se ao acadêmico e ao sofrível beletrista tomarem cuidado com os exageros: o público leitor e os críticos se cansam com muita facilidade, tanto dos que escrevem mal, naturalmente, quanto dos que não escrevem bem porque preferem fazer-se ininteligíveis, seja particularizando sua obra, seja por exagerada ou inexplicável vaidade intelectual.
     Antônio Francisco Sousa – Auditor-Fiscal ([email protected])