0

 

Suas mãos suadas seguravam um pequeno quadrado verde de plástico. Nele se destacava, impresso em tinta preta, o número vinte.
Olhando em torno da sala, conseguiu identificar, com facilidade, os números dezessete e dezenove. Dezoito havia desaparecido. Para se acalmar formulou algumas teorias. Talvez ele estivesse no banheiro. Talvez tivesse simplesmente ido embora. Ou, quem sabe, ele nem existisse. Odiava a incerteza. No entanto, tinha confiança que se pudesse vê-lo tudo ficaria bem.
Remexendo na sacola, encontrou o papel que precisaria apresentar. Era uma folha branca na qual garranchos ilegíveis se espalhavam por toda a extensão. Para qualquer outro eles nada significariam, mas para vinte os garranchos não guardavam mistérios. Ele os compreendia. Ah! Como compreendia!
De repente, vindo do nada, dezoito apareceu. Respirando fundo, sentiu seu coração se desacelerar. Dezessete. Dezoito. Dezenove. Vinte. Uma sequência perfeita. Agora tudo estava bem!
Dezessete e dezoito foram chamados. Aparentemente calmos, aproximaram-se do balcão. Eles também traziam folhas brancas com garranchos indecifráveis. Duas moças de sorrisos simpáticos receberam seus papéis e seus pequenos quadrados verdes de plástico.
Quando desviou o olhar, vinte percebeu que dezenove o fitava com insistência. Com um leve aceno da cabeça, ele deu a entender que, se tudo corresse bem, eles seriam os próximos.
As mãos suadas e nervosas haviam amassado a folha de papel. Colocando com cuidado o pequeno quadrado verde de plástico sobre a cadeira ao lado, vinte tentou, sem muito sucesso, tornar novo o que já estava velho.
Viu dezessete se encaminhando para a saída. Em uma das mãos ele levava uma sacola branca de plástico. A expressão de seu rosto era de alivio.
Dezenove foi chamado.
Dezoito permanecia em frente ao balcão. Sem querer, vinte lançou-lhe um olhar que era uma mistura de raiva e medo.
Raiva, pois dezoito estava impedindo que a vida seguisse o seu curso. Medo porque em breve seria ele a ficar diante daquele balcão, vendo os garranchos indecifráveis de sua folha de papel tornarem-se uma realidade da qual não podia fugir.
Um suspiro involuntário escapou de sua boca. Vinte sentia que, a cada minuto a mais que permanecesse naquela sala, mais depressa seria arrastado para longe da racionalidade que a tanto custo procurava manter. Pensamentos carregados de imagens formavam-se em sua mente, sem que fosse capaz de controlá-los. Sentia-se refém das próprias emoções.
Dezoito, finalmente, deixou o balcão e, junto com 19, dirigiu-se ao elevador. Para eles a espera havia terminado.
- Vinte, por favor! – chamou a moça simpática.
Um breve momento de dúvida foi rapidamente vencido. Levantando-se da cadeira, aproximou-se do balcão. Sem esperar, entregou à moça simpática o pequeno quadrado verde de plástico no qual estava impresso o número vinte. Depois foi a vez da folha de papel. Com alívio, percebeu que a partir daquele momento deixava de ser um número para se tornar novamente uma pessoa.
Sem olhar para trás sabia que vinte e dois, vinte e três e vinte quatro aguardavam a sua hora de serem chamados.
A moça simpática empurrou o papel em sua direção, indicando onde deveria assinar. Assinou sem mesmo ler. Com um gesto amigável o elevador lhe foi indicado, era preciso subir até o terceiro piso. Despediram-se com um daqueles sorrisos que só estranhos podem trocar: simpático, mas ausente.
Na frente do elevador vinte e um já aguardava. Movido pela curiosidade, ele perguntou:
- Vou fazer uma densitometria óssea e você?
Maldita curiosidade! Porque algumas pessoas insistem em dizer em voz alta aquilo que pode ser compreendido apenas pelo silêncio? Evitando o olhar de vinte e um, vinte simplesmente respondeu:
- Uma mamografia.
No rosto de vinte e um uma expressão de entendimento surgiu. Ele silenciou. E foi em silêncio que eles entraram no elevador.