[Maria do Rosário Pedreira]

Num Natal passado, um dos meus irmãos teve um ataque de saudosismo e ofereceu-me de presente os DVD de uma antiga série de televisão chamadaHolocausto, na qual praticamente se estreara a grande Meryl Streep e que fora um verdadeiro sucesso na altura em que a víramos juntos, ainda em casa dos pais. Os filmes e séries televisivas sobre a Segunda Guerra Mundial sempre constituíram um êxito no nosso país, ao contrário dos livros, que, à excepção de O Diário de Anne Frank e outros clássicos, foram sempre difíceis de vender – situação que se alterou apenas ao de leve com o testemunho de Irène Nemirovsky em Suite Francesa, a obra de Primo Levi ou o belíssimo A Música da Fome, do Nobel francês Le Clézio. Lembro-me de, em princípio de carreira, ir à Feira do Livro de Frankfurt incumbida de recusar delicadamente tudo o que me oferecessem sobre a Segunda Guerra Mundial, sob o risco de arranjar um mau negócio aos patrões; e de, mais tarde, essa espécie de restrição se ter estendido também à Guerra Civil de Espanha, uma vez que mesmo os melhores livros sobre o tema (vamos excluir Por Quem os Sinos Dobram, de Hemingway) – comoOs Soldados de Salamina, de Javier Cercas – tinham sido um flop em termos comerciais. Achei, por isso, engraçado que, entre alguns romances que publiquei no último ano, todos de autores portugueses, dois falassem justamente desta última guerra (Rio Homem, de André Gago, e Deixem Falar as Pedras, de David Machado, embora este só de raspão); e que um outro que publicarei em 2012 também se refira aos fuzilamentos de tantos civis na Galiza, tomando como personagens dois inimigos figadais com pais de lados opostos da barricada. Estarão por acaso as coisas a mudar e ainda me aparece um dia destes um romance português sobre o próprio Holocausto para avaliar?