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CARLOS EVANDRO MARTINS EULÁLIO

O fusca foi o carro mais popular do século passado. Nos anos [19]60, quem não possuía carro, em geral começava  pelo fusquinha. Comigo não foi diferente. Adquiri o meu primeiro fusca/64 em 1973. Passava mais tempo na oficina do que na porta de casa. Nessa época morava no centro, na Rua Riachuelo, zona norte de Teresina. Ali, como a maioria, as casas eram geminadas e não dispunham de garagem. Os carros ficavam estacionados nas calçadas, durante a noite toda e nada acontecia. Não se falavam em furtos, muito menos em atos de vandalismo contra os carros.
 
Entusiasmado com o primeiro carro, tratei logo de arrumá-lo. Confiei-o ao Tinoco, dono da oficina mecânica Seata, que ficava nas proximidades do Hospital Getúlio Vargas. Ali ficou para uma revisão. Ao buscá-lo após três dias, assustei-me diante da quantidade de peças trocadas. De suposto carro novo, o segundo passo era aprender a dirigir. Nessa época, as ruas em Teresina eram tranquilas e, como não havia autoescolas, a saída era incumbir alguém da família a tarefa de instrutor. Na primeira aula, quase atropelo um ciclista, nas proximidades do Colégio Helvídio Nunes. Por coincidência, à noite, no Colégio São Francisco de Assis, onde lecionava, fui abordado por um aluno, dizendo-me ser a pessoa da bicicleta.
 
Logo, logo aprendi a dirigir. O fusca era que não ajudava. Dava o prego nos momentos mais inesperados e nos locais nunca imaginados, como naquele sinal da Miguel Rosa com Frei Serafim, onde por duas vezes quebrou o cabo do acelerador. Nessas horas geralmente aparecia um conhecido ou ex-aluno que me socorria. Gastei com esse fusca quase o correspondente a um carro zero. Vendi-o a um taxista que só fechou o negócio comigo depois de fazer alguns reparos no veículo, além de colocar piso novo, longarina, mesa e chapéu de Napoleão.
 
Após livrar-me desse carro, as preocupações não pararam por aí. Certa noite, ao chegar em casa, deparei-me com uma viatura do Detran à minha espera. Pediram-me para justificar um atropelamento. Por não haver transferido o carro, o comprador, passou pra outra pessoa que também não o fez. O certo é que as intimações e avisos de cobrança para renovação de emplacamento não paravam de chegar. Cansado de tanta chateação, procurei um advogado que me sugeriu pedir uma declaração do primeiro comprador e registrá-la em seguida no Livro de Títulos e Documentos em qualquer Cartório. Ainda tenho comigo esse documento.
 
Para meu sossego, soube que esse carro um dia ficara no prego próximo à Polícia Rodoviária. Um guarda que estava por perto, solicitado a prestar socorro ao atual proprietário, antes de fazer qualquer coisa riscou um fósforo para melhor visibilidade. Não deu outra: meu ex-fusquinha-64 explodiu. Só assim livrei-me dele pra sempre. No Detran, os registros dele certamente constam em meu nome. Ao longo da vida tive outros fuscas. Cada qual com uma história diferente.