Meu pai

 
Rogel Samuel

Um homem corta a grama
Do outro lado da rua.
Meu pai se foi há muitos anos,
Mas a lembrança dele me desperta.
Vem de certa cena antiga
Onde aparece com seu sorrir
E o mesmo jogo de andar
Lançando os braços para trás.
Um homem corta a grama no seu quintal.
E muito tempo se passou
E não sei por que subitamente
Sinto sua morte.
Meu pai, talvez o diga,
tocava piano e tinha
uma boa discoteca:
discos de vinil, 
álbuns, e além
de sua coleção de orquídeas,
talvez o diga, a sua 
biblioteca consistia
de livros sobre Amazônia etc.
Tocava piano e violino.
Tudo está em seu lugar
E por que me vejo triste?
Meu pai já não existe
Ele se decompôs no ar.
Um velho corta a grande grama
Da outra margem desta rua.

(Walden, New York, julho 2003)

[Ananda, lancha de meu pai]