REPUBLICADO À PEDIDO DE MINHA MEIA-IRMÃ ARIETE SAMUEL
Meu avô
Rogel Samuel
Maurice Samuel nasceu em Strasburg e faleceu em 1942, em Manaus, onde se estabeleceu como exportador de borracha. Mesmo sem tê-lo conhecido, é meu ídolo.
Possuía um navio, o "Adamastor", e o historiador T. Loureiro, em "A grande crise", coloca-o entre os maiores de sua época. Seu escritório ficava na rua Marcílio Dias, onde depois se construiu o Hotel Amazonas.
Casou-se com D. Antonia Cellis, peruana, que meu pai dizia ser filha bastarda do Duque de Cellis (família real espanhola, que se radica na Roma antiga) com uma índia quéchua.
O certo é que minha avó índia D. Antonia tinha um porte real, e era natural de Remate de Males, ou Letícia, e teve dois filhos: Albert Samuel, meu pai; e Marcela Baird, casada com Jorge Baird.
Segundo relato de meu pai, Maurice Samuel trabalhava na companhia de navegação "The Amazon River", quando veio a Manaus e viu que aqui havia oportunidade de grandes negócios.
Por isso largou o emprego e se estabeleceu como negociante exportador de borracha, graças aos seus conhecimentos de várias línguas (inclusive o hebraico, conheci sua Bíblia em hebraico) e também à sua experiência na companhia de navegação.
Maurice Samuel prosperou nos negócios.
Adquiriu um navio com o qual passou a morar e viajar na compra de borracha, navio esse que fotografei na praia de São Raimundo e cujas fotos estão publicadas no meu romance "O amante das amazonas".
Em Manaus, ele morou em algumas das melhores mansões da época, como a que existia ao lado do "castelinho" da Vila Municipal, à direita de quem entra: uma grande casa com arco frontal que examinei por fora.
Mas preferia viver no navio Adamastor, onde nasceu meu pai, que foi transbordado no meio do Rio Juruá para outro navio, um inglês, junto com a mãe, em direção a Strasburg, a fim de fugir da malária que vitimava todas as crianças por ali.
Antonia e seu filho viveram um tempo em Strasburg, e depois voltou sozinha, deixando o filho aos cuidados dos tios, da família Levy, com que foi criado meu pai, só conhecendo o seu próprio pai aos quinze anos, quando veio a Manaus para depois concluir sua educação em Paris, onde estudou engenharia naval, sem concluir, e depois foi servir em San Tropet, porque era militar antes da Segunda Guerra Mundial, época de seu retorno à casa paterna, a pedido do pai doente e com os negócios em franca decadência.
A sua volta ao Brasil salvou a sua vida, pois meu pai perdeu todos na guerra, companheiros e parentes, toda a família Samuel e Levy foi exterminada, por ser judia, seja na guerra, seja nas garras do nazismo.
Meu pai sempre se recusava a falar no assunto, e desenvolveu um verdadeiro horror à Europa, mesmo muitos anos depois.
O que para nós a Europa significa de civilização e cultura, nós que odiamos o Brasil e sonhamos com as maravilhas européias, para ele, para meu pai, que sofreu a Primeira Guerra quando menino, que atravessou a Guerra Civil Espanhola quando retornava ao Brasil, e que teve seus primos e tios assassinados brutalmente pelo nazismo, a Europa para ele sempre significou o pior pesadelo, o horror do inferno, o mais perigoso lugar de todos os lugares da terra.
Ele não falava, mas odiava a Europa.
Eu só compreendi isso depois de assistir ao filme “A dama dourada”, de Simon Curtis, que recomendo a todos os meus amigos judeus.
Quando estive pela primeira vez em Strasburg, e lá estive diversas vezes, ele se recusou a dizer onde morava, mas creio que era na praça Kleber, e a casa sempre existiu.
Nunca voltou.
D. Antonia, minha avó, era mulher independente e muito moderna para a época.
Saía sozinha, viajou várias vezes sozinha para São Paulo e talvez para a Europa e andava a cavalo. Tinha uma bela coleção de jóias e objetos de valor, como uns brincos de brilhante que pendiam das orelhas e dela herdei algumas colheres de um faqueiro de prata que estão até hoje comigo; também vi em sua casa um revólver de prata lavrada, ricamente trabalhado, que pertencera a meu avô, e vinha numa caixa de madeira forrada de veludo escuro.
Meu pai dizia que, se meu avô recuperasse tudo que o se lhe devia, certamente ficaria rico outra vez.
Mas ele era um homem bondoso e ajudou a muita gente.
Entretanto Maurice Samuel era um “bon-vivant”, curtia a vida, e sabia viver.
Como para todos os milionários da época, em Manaus tudo era possível, tudo era permitido, todos os gostos e sabores estavam à mão, não havia pecado nem proibições.
Quando meu pai, com quinze anos de idade, o conheceu, meu avô lhe ofereceu um cigarro.
Diante da inibição e indecisão de meu pai, ele disse:
- Fume, ora pois! – e rebentou numa grande gargalhada...
Curiosamente, meu pai nunca fumou nem bebeu.
Possuía um navio, o "Adamastor", e o historiador T. Loureiro, em "A grande crise", coloca-o entre os maiores de sua época. Seu escritório ficava na rua Marcílio Dias, onde depois se construiu o Hotel Amazonas.
Casou-se com D. Antonia Cellis, peruana, que meu pai dizia ser filha bastarda do Duque de Cellis (família real espanhola, que se radica na Roma antiga) com uma índia quéchua.
O certo é que minha avó índia D. Antonia tinha um porte real, e era natural de Remate de Males, ou Letícia, e teve dois filhos: Albert Samuel, meu pai; e Marcela Baird, casada com Jorge Baird.
Segundo relato de meu pai, Maurice Samuel trabalhava na companhia de navegação "The Amazon River", quando veio a Manaus e viu que aqui havia oportunidade de grandes negócios.
Por isso largou o emprego e se estabeleceu como negociante exportador de borracha, graças aos seus conhecimentos de várias línguas (inclusive o hebraico, conheci sua Bíblia em hebraico) e também à sua experiência na companhia de navegação.
Maurice Samuel prosperou nos negócios.
Adquiriu um navio com o qual passou a morar e viajar na compra de borracha, navio esse que fotografei na praia de São Raimundo e cujas fotos estão publicadas no meu romance "O amante das amazonas".
Em Manaus, ele morou em algumas das melhores mansões da época, como a que existia ao lado do "castelinho" da Vila Municipal, à direita de quem entra: uma grande casa com arco frontal que examinei por fora.
Mas preferia viver no navio Adamastor, onde nasceu meu pai, que foi transbordado no meio do Rio Juruá para outro navio, um inglês, junto com a mãe, em direção a Strasburg, a fim de fugir da malária que vitimava todas as crianças por ali.
Antonia e seu filho viveram um tempo em Strasburg, e depois voltou sozinha, deixando o filho aos cuidados dos tios, da família Levy, com que foi criado meu pai, só conhecendo o seu próprio pai aos quinze anos, quando veio a Manaus para depois concluir sua educação em Paris, onde estudou engenharia naval, sem concluir, e depois foi servir em San Tropet, porque era militar antes da Segunda Guerra Mundial, época de seu retorno à casa paterna, a pedido do pai doente e com os negócios em franca decadência.
A sua volta ao Brasil salvou a sua vida, pois meu pai perdeu todos na guerra, companheiros e parentes, toda a família Samuel e Levy foi exterminada, por ser judia, seja na guerra, seja nas garras do nazismo.
Meu pai sempre se recusava a falar no assunto, e desenvolveu um verdadeiro horror à Europa, mesmo muitos anos depois.
O que para nós a Europa significa de civilização e cultura, nós que odiamos o Brasil e sonhamos com as maravilhas européias, para ele, para meu pai, que sofreu a Primeira Guerra quando menino, que atravessou a Guerra Civil Espanhola quando retornava ao Brasil, e que teve seus primos e tios assassinados brutalmente pelo nazismo, a Europa para ele sempre significou o pior pesadelo, o horror do inferno, o mais perigoso lugar de todos os lugares da terra.
Ele não falava, mas odiava a Europa.
Eu só compreendi isso depois de assistir ao filme “A dama dourada”, de Simon Curtis, que recomendo a todos os meus amigos judeus.
Quando estive pela primeira vez em Strasburg, e lá estive diversas vezes, ele se recusou a dizer onde morava, mas creio que era na praça Kleber, e a casa sempre existiu.
Nunca voltou.
D. Antonia, minha avó, era mulher independente e muito moderna para a época.
Saía sozinha, viajou várias vezes sozinha para São Paulo e talvez para a Europa e andava a cavalo. Tinha uma bela coleção de jóias e objetos de valor, como uns brincos de brilhante que pendiam das orelhas e dela herdei algumas colheres de um faqueiro de prata que estão até hoje comigo; também vi em sua casa um revólver de prata lavrada, ricamente trabalhado, que pertencera a meu avô, e vinha numa caixa de madeira forrada de veludo escuro.
Meu pai dizia que, se meu avô recuperasse tudo que o se lhe devia, certamente ficaria rico outra vez.
Mas ele era um homem bondoso e ajudou a muita gente.
Entretanto Maurice Samuel era um “bon-vivant”, curtia a vida, e sabia viver.
Como para todos os milionários da época, em Manaus tudo era possível, tudo era permitido, todos os gostos e sabores estavam à mão, não havia pecado nem proibições.
Quando meu pai, com quinze anos de idade, o conheceu, meu avô lhe ofereceu um cigarro.
Diante da inibição e indecisão de meu pai, ele disse:
- Fume, ora pois! – e rebentou numa grande gargalhada...
Curiosamente, meu pai nunca fumou nem bebeu.