[Galeno Amorim]
 
Boas histórias de leitores há por toda parte. E ainda bem que tem sido cada vez mais assim! É um que descobriu nos livros experiências fascinantes que o ajudariam a ampliar os sentidos e o próprio universo pessoal, agora mais rico em possibilidades. Ou outro que, graças à leitura, tornou-se mais imaginativo e viu, de repente, aflorar uma nova e extraordinária capacidade de criar, fazer e transformar coisas.

Seja lá como for, ninguém é o mesmo depois de ler um livro. Há sempre uma boa história de transformações pra se contar. Essas mudanças podem ser aparentemente insignificantes. Não importa.

É o caso, por exemplo, daquele neoleitor que aprendeu num livro palavras novas e desconhecidas, e só por isso já se sentiu mais importante, diante de seu universo vocabular. Ou aquele outro que, de tanto ler, tornou-se mais confiante, passou a interagir mais no seu meio social e até conseguiu uma namorada, casou, teve filhos. Um que se descobriu cidadão cheio de direitos - uma novidade! E até conseguiu um emprego novo e melhorou de vida.

O caso é que, vira e mexe, mais e mais nos deparamos com boas histórias de gente que lê e, a partir daí, muda a própria vida e, invariavelmente, o mundo em seu redor.

Mas o que quase não se vê por aí são as histórias das mães desses leitores. De como um punhado de gente até então sem grandes perspectivas pavimentaria para si, graças aos livros e, naturalmente, a elas, novas trajetórias para suas vidas.

Isso quase não se diz, mas o caso é que as mães vêm sendo as grandes responsáveis por desenvolver na meninada o gosto de ler - mais até do que os professores, com quem nossas crianças passam a ter, desde que ingressam na idade escolar, uma relação intensa e diária.

Em certas regiões do País, esse número chega a ser impressionante. Em áreas do Norte e Nordeste, por exemplo, nada menos do que três em cada quatro crianças dizem que gostam de ler por causa de suas mães. Desde bem pequenos, se lembram delas contando histórias, lendo na hora de dormir ou, ainda, presenteando-os com livros.

Em um mundo tão competitivo quanto desafiador, em que o acesso ao conhecimento faz toda a diferença, isso, definitivamente, não é pouca coisa.

A história de Joana Jacinto, que vive no interiorzão do Goiás, é uma dessas. Ela sempre deu duro, de sol a sol, para sustentar a filharada. Ainda hoje passa boas horas do seu dia numa condução que a leva até o trabalho no Plano Piloto em Brasília. Ora para trabalhar como copeira, ora para como empregada em alguma empresa que presta serviços para o governo.

Luxo, ela diz, isso não tinha para oferecer aos filhos. Só que ela oferecia... livros. Sempre que podia, levava as crianças a uma livraria. E tampouco se avexava de pedir que arrumassem livros para que eles pudessem ler mais.

Não deu outra: João Felipe cresceu e tornou-se um leitor. De livros. Aprendeu a ler aos cinco anos, com a irmã mais velha. Nunca mais parou. Com ela e com a mãe, tomou gosto pela coisa. Vivia pedindo que a mãe comprasse algum livro. Depois de ler, fazia questão de emprestar a algum amigo - por sinal, é assim que metade dos brasileiros chega, hoje em dia, aos livros.

Graças a eles, e ao apoio decidido da mãe, Felipe arrumou bolsa e acabou indo parar na universidade. Ele já está no quinto semestre do curso de Relações Internacionais da Universidade Católica, em Taguatinga.

Recentemente conseguiu uma vaga de estagiário na Esplanada dos Ministérios e sonha com o dia em que ingressará num bom curso de línguas para aprimorar o inglês da escola pública. Bem informado, anda sempre em busca de alguma nova oportunidade para galgar mais um degrau na vida. Ultimamente, bateu de porta em porta pelos corredores da Câmara dos Deputados atrás de um trabalho em que possa ganhar mais.

De degrau em degrau, o rapaz vai dando passos certeiros. Nas mãos, há sempre um livro a desbravar seu caminho. Ele sabe que está ali a chave de acesso ao admirável mundo novo que tanto persegue.

Com os livros, e uma mãe que aprendeu a mostrar a ele o real valor da leitura, parece que fica tudo mais fácil.