Leonardo Castello Branco
Em: 16/01/2010, às 19H56
Luiz Filho de Oliveira
Contudo, quanto à sua educação, o que se-sabe é que ela não foi formal, ou seja, não estudou ele em colégios de padres jesuítas, osquais eram àquela época a única opção “oficial” que a metrópole oferecia (quem tem grana pra estudar em Coimbra?), já que na Terra Brasilis visava Portugal à economia de exploração, sobretudo. Diferentemente das Américas espanhola e anglo-saxã, onde as universidades foram implantadas muito antes do que as do Brasil. E ficou pior ainda depois que Pombal sentou a lenha na Companhia de Jesus pra eles não atrapalharem o lucro da Coroa. Imaginem, então, como seria a cena num Piauhy do final do setecentos, que antes já havia sido “terra, casa, de piagas”, gravada Piaguí, Piaguhy, Piagoy e Piaguhi, e que passava dos currais (“terra de gado”!) às vilas de uma capitania, às cidades, à cidadania.
Por conta desse isolamento de sua província, em que o analfabetismo grassava, Leonardinho, mesmo sendo apatacado, foi alfabetizado pelo pai Miguel de Carvalho e Silva, que havia estudado em colégio de jesuítas. Assim foi que esse menino, instruído de Português, Latim, Geografia, Física e Matemática, tornou-se o pai de um Herói nacional, de um Poeta pré-romântico e de um Filósofo-Cientista religiosamente concebido. Do Herói e do Filósofo-Cientista, mesmo que haja registro deles (cadê o termo de proclamação da independência, redigido e assinado por Leonardo de Carvalho Castelo Branco (ainda não era da Senhora das Dores) em 24 de janeiro de 1823, em Piracuruca, oqual foi usado como prova contra ele, em seu julgamento, na Ponta da Areia, em São Luís, em março desse mesmo ano, e a Astronomia e a Mecânica Leonardinas?); dessas duas personalidades, gostaria de realçar apenas que são esses compromissos de Leonardo (com a pátria e com o conhecimento humano), juntamente com os seus haveres, que possibilitaram as cinco publicações como Poeta, em Lisboa, de duas obras: uma, intitulada Poema Filosófico O ÍMPIO CONFUNDIDO OU REFUTAÇÃO A PIGAULT LE BRUN, em 1835, 1836 e 1837; outra, O Santíssimo Milagre, em 1839, aqual, segundo Luiz Romero Lima (Literatura Piauiense. Teresina: Fundação Quixote, 2007.), foi publicada em duas versões (versinhos?), em versos decassílabos e em versos redondilhos (maiores e menores); além de uma outra obra literária publicada no Rio de Janeiro, em 1856, A Criação Universal.
Quase dois séculos depois, o que temos desse ilustre brasileiro piauiense nas memórias e nas estantes de nosso país ou, mais particularmente, de nosso estado? Nada. Somente o conhecimento vago dessas publicações, asquais o próprio Leonardo levou a cabo, e algumas confusas informações sobre o ano de nascimento, o seu nome e a interpretação de sua obra poética, escritas por críticos, não raro, relapsos e desinteressados. Aliás, nada, vírgula! Ao menos, ainda há os exemplares originais dessas obras: de A Criação Universal na Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro, e de O Ímpio Confundido e O Santíssimo Milagre, na Biblioteca Nacional de Portugal, em Lisboa. Em Teresina, pelo que já li e percebi, há, sim, quem tenha um exemplar de cada uma das três obras que compõem a tríade poética de Leonardo da Senhora das Dores Castelo Branco.
Para a comprovação (bem ao gosto de Leonardo) de fato tão óbvio & ululante, basta que não esqueçamos que o exemplar de A Criação Universal que foi furtado do Arquivo Público, em Teresina (na década de 1980?), ainda deve estar na cidade, na casa do facínora egoísta, desse barato ladrão de livro caro, queridíssimo. Por que não tirou-lhe uma cópia e o-devolveu, seo cretino? Você nunca poderá publicá-lo? Vamos, invente um jeito, diga que foi ao Rio de Janeiro e conseguiu uma cópia lá, na Biblioteca Nacional, seo zé-mané; porque eu ainda não li nem ouvi falar (e eu muito espero que seja um lapso meu, nesse caso!) de publicação nenhuma do Departamento de Letras da Universidade Federal do Piauí (UFPI), pelo projeto “Reviver”, conforme nos-informam Valdemir Miranda de Castro e Francisco Miguel de Moura no artigo A Trajetória de Leonardo das Dores Castelo Branco, acessado em janeiro de 2010, no sítio eletrônico http:/www.piracuruca.com/. É, se Alberto da Costa e Silva, quando embaixador do Brasil em Portugal conseguiu uma cópia do original e doou-a a UFPI para posterior publicação, por que o Departamento de Letras e a editora da universidade não no-fizeram ainda? Que ignorância é essa, minha gente? Pelo amor de Dadá (um Deus do Primavera, meu bairro). Queremos ler Leonardo!
Quanto a tríade épica de Leonardo da Senhora das Dores Castelo Branco, quem escreve sobre a existência de um exemplar de cada um desses livros em Teresina é Luiz Romero Lima, no já citado Literatura Piauiense. Leiam: “Aqui faço o meu agradecimento, de público, a várias pessoas comprometidas e interessadas da Geração Pós-69, que me possibilitaram acesso às cópias dos originais das primeiras publicações da tríade épica (...) de Leonardo da Senhora das Dores Castello Branco”. Não sei em que sentido essas “várias pessoas” são mesmo “comprometidas e interessadas” em publicar Leonardo, se a primeira edição do livro de Romero é de 2003 (sete anos!) e, talvez, eles já tivessem essas cópias muito antes desse ano, talvez há mais de 10 anos! Que compromisso, que interesse... Nossa, estou comovido.
Não a obra poética de Leonardo interessa divulgar; não, o seu nome honrado de Herói, de Filósofo-Cientista e de Poeta dessa pátria que o-pariu! Compromisso com o olvido. Interesses egoístas. Na contramão do book crossing (se você ainda não conhece essa atitude contemporânea descompromissada (mas comprometida com as causas solidárias), vai até o sítio eletrônico www.bookcrossing.com). Mas eles não perdem por esperar, Leonardo. Haverá ainda quem se-arrependa e desenterre teus ossos, vivos em cada verso de teus cantos. Ou quem os-ache ao cavar tuas memórias.
Enquanto, não, leiamos quem leu e elogiou nosso vate conterrâneo. O soneto, que foi publicado na edição de 1837, é singelo e um tanto revelador de alguns temas e argumentos de O Ímpio Confundido. Vamos à composição:
Devido elogio ao Sr. Leonardo da Senhora das Dores Castello-Branco, no seguinte
SONETO.
Pródiga dos teus dons, ó Natureza,
Fertilizaste hum gênio, raro em tudo!
Da sã Religião no largo estudo
Confunde o ímpio Athèo com grão firmeza.
De Le Brun a sofística destreza
Immovel o não deixa, em pasmo, ou mudo!
Sábio Castello-Branco, eu não me illudo:
Vejo abranger teu estro a redondeza.
Peixes, Aves, Quadrupedes, as Plantas...
Philósofo analysas, contemplando
A Mão, que solta maravilhas tantas!
Glória do Novo-Mundo! Admirando
A Europa te vai! E as Musas quantas
O Pindo habitam, lá t’estão cantando!
Lisboa, 20 de outubro de 1836.
Margarida J. C. de M. P.