É provável que, de fato, sejam. Duas, nascidas em plagas teresinenses, envolvem condutores; a terceira, estrangeira, tem como personagem principal um motorista e cidadão dos mais valorosos.
     Contam que, certo dia, em meados do século passado, em uma movimentada rua do centro da cidade, um abastado cidadão mafrensino trafegava em seu Ford quando este resolveu pifar bem ali, no meio da via pública. Apesar de não serem muitos, haja vista, naquele tempo, piauiense com automóvel ser fato incomum, atrás do “carrão” da figura vinham outros que, em razão da pouca largura do logradouro, não poderiam passar enquanto o dito cujo estivesse interditando o local. Urgia, pois, que o “prego” fosse consertado. Como o reparo estava demorando muito – mecânico não era encontrado em toda ponta de rua, naquela época -, logo, logo um buzinaço começaria, acompanhado de desaforos e impropérios dos mais inomináveis, lançados pelos prejudicados. Reza a lenda que o dono do carro causador da fuzarca tinha somente dois defeitos: a extremada falta de paciência e não levar desaforo para casa. Não aguentando mais a confusão generalizada e o barulho nas oiças, saiu do veículo quebrado, fechou-lhe as portas, deu bananas a todo mundo e se mandou, talvez, atrás de socorro; deixando para os que ficaram a missão de se virarem, ou organizando uma retirada civilizada, ou esperando que o Ford fosse consertado.
     A outra lenda, também sobre condutor – sim, porque motorista de verdade não faz, no trânsito, o escarcéu que fez o cara do Ford -, teve por cenário a atual Avenida Frei Serafim, nas imediações do encontro dela com a Rua Coelho de Resende. Seu protagonista residia na primeira avenida a poucos metros daquele cruzamento, do lado direito de quem vinha da zona leste para a oeste; trajeto este, naquele tempo, mais calmo do que as correntezas do rio Parnaíba.
     Falam que ele chegava em casa no seu jipão de aço da melhor têmpera, mas não conseguia entrar na garagem que estava bloqueada por um automóvel de alguém que, àquela altura, certamente, tomava uma cervejinha perto dali. Buzinou algumas vezes, na tentativa de avisar ao proprietário da lata velha sobre seu intento. Não deu certo. Desceu do carro e perguntou aos biriteiros que encontrou quem era o dono da travanca que fechava sua garagem. Reiterou a pergunta até que um lhe mandou que esperasse enquanto ele terminava de tomar sua gelada. Ainda arguiu que tinha pressa de entrar em casa porque estava cansado da viagem que fizera. Respondeu-lhe o engraçadinho que, nesse caso, ele que passasse por cima do carro trapalhão. Assunto resolvido. O homem encostou o jipe no fundo do carrinho e o arrastou até bem perto de onde estava o falastrão, que quase não cria no que aquele “louco” acabara de fazer. Desobstruída a porta, o condutor do “Hércules”, calmamente, manobrou o possante e entrou na garagem. Tudo indica que o proprietário prejudicado continuou tomando sua cervejinha, já que, garantem alguns, o dono do jipe, não só era madeira de dar em doido, como osso duro de roer.
     Esta, segundo pude saber, teria nascido na Suécia e envolve um motorista, este, sim, cidadão dos bons. Naquele dia, ele ficara incumbido de levar o novo companheiro, brasileiro, para seu primeiro dia de trabalho juntos em uma fábrica. Saiu bem cedo de casa e ao chegar à empresa percebeu que o pátio de estacionamento estava praticamente vazio. Resolveu deixar o carro bem distante do seu local de trabalho e irem caminhando até lá, fato este não compreendido pelo novato, que lhe teria perguntado por que, com tantas vagas próximas, ele preferira ter estacionado tão longe. Reza a lenda que o elegante senhor teria dito: ora, amigo, como nós chegamos cedo, temos tempo de sobra para chegarmos até nosso local de trabalho, o que, certamente, não aconteceria aos retardatários que, chegando em cima da hora, ainda tivessem que estacionar tão distante.
Motoristas como esse, de fato, só em lendas. De condutores broncos, como os citados, nosso trânsito está repleto.
Antônio Francisco Sousa – Auditor-Fiscal ([email protected])