Leitura à distância
Por Gabriel Perissé Em: 12/04/2007, às 11H58
Existem vários tipos de tédio, como explica o norueguês Lars Svendsen em seu livro Filosofia do tédio (Jorge Zahar, 2006). Há o tédio de quem está saciado, de quem está cansado do muito que conseguiu em dado momento (excesso de comida, diversão além da conta etc.). Há o tédio existencial, de quem não vê sentido na vida. Há o tédio situacional, quando ficamos presos no engarrafamento, ou quando aquele filme que prometia tanto se revela uma soma de enfadonhos clichês...
E existe, do ponto de vista educacional, um tédio bem específico, o tédio no âmbito escolar, o tédio da sala de aula.
“A maioria dos estudantes do ensino médio dos Estados Unidos fica aborrecida na sala de aula todos os dias [...]; dois terços dos estudantes do ensino médio reclamam do aborrecimento, geralmente por causa do assunto da disciplina ser irrelevante, ou porque seus professores não demonstram se importar com eles” (Agência Estado, 28/02/07).
Assim na terra como no céu. A mesma Agência Estado (22/02/07) divulgou matéria sobre repetência recorde no ensino médio brasileiro, assinada por Marici Capitelli. A secretária da Educação de São Paulo, Maria Lúcia Vasconcelos, diante dos números (51% dos reprovados o foram por ultrapassarem as 50 faltas permitidas ao ano), conclui que “esse aluno se motivou, inscreveu-se na escola, mas ela não conseguiu ser interessante para ele, não cumpriu o seu papel. [...] A escola está muito distante da realidade dos alunos e em especial dos que estudam à noite e trabalham”.
As aulas são “maçantes”, admite a própria secretária. Os professores faltam em excesso (também estão morrendo de tédio). É entediante ler, todos os dias, notícias sobre os fracassos da escola pública brasileira.
Não sei como os norte-americanos vão resolver o tédio deles, mas o que fazer com o nosso?
Pedagogia do tédio: a burocrática lista de chamada, didática instrucionista, carência de recursos mínimos (faltou giz... está quente demais... roubaram o computador...), exames que avaliam mal, diálogo difícil ou impossível com classes cansadas ou rebeldes.
O tédio na sala de aula não é meramente situacional. Um ou outro bocejo todos compreendemos. O grave nesse tédio é o seu caráter crônico. A repetência, por notas baixas ou por faltas, é sintoma de repetidos equívocos. Por que a escola está distante da realidade dos alunos? Ninguém estudou Paulo Freire? Ninguém entendeu os Parâmetros Curriculares Nacionais?
Gabriel Perissé é doutor em educação pela USP e escritor.
Web Site: www.perisse.com.br